Eram 22 há 37 anos. É um Basílio para milhões de Corinthians

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36 minutos, 43 segundos.

Na foto, uns dois segundos a mais que isso.

Ao fundo tem um uns dois jogadores corintianos que dá para ver de relance depois do gol.

Atrás do autor da redenção do gol, tem mais um.

Sozinho, em primeiro plano, levando milhões a outros planos, tem um punho direito erguido como se fosse uma antevisão de Sócrates. Tem uma camisa número dois do Corinthians com um oito às costas. Tem milhões de camisas 12 jogando por todo o time que não sabia o que era ser campeão havia 22 anos.

Não digo que não sabia o que era ser Corinthians que, sabidamente, não é para isso que foi fundado em 1910. O Corinthians nasceu para multiplicar Corinthians pelo mundo. Para ganhar como poucos para os fiéis, para irritar como raros os que não são.

Quando havia o Santos de Pelé e o Palmeiras de Ademir, e, depois, o São Paulo de Pedro Rocha, não havia como ser campeão estadual e do Brasil.

Só foi ser possível três anos depois do Rei sair da Vila e 25 dias depois de o Divino parar.

Mas isso é menos quando se fala da alegria de milhões.

Quando vimos tantos não conseguindo gritar esse gol que só um Osmar Santos, um José Silvério e um Fiori Gigliotti para narrar.

O mais corintiano dos gols. O gol mais corintiano.

O gol de Basílio.

Esse pé de anjo da foto.

Esse que corre sozinho por milhões. Esse que celebra sozinho a mais coletiva celebração da história do futebol brasileiro por um título.

Era muito grande e muito difícil em 1977 ser campeão estadual. Era mais time a Ponte Preta que o Corinthians. Era uma decisão equilibradíssima. Foi desequilibrado o campineiro Rui Rei quando pediu para ser expulso pelo Dulcídio que leva a fama que não corresponde aos fatos. Ninguém o comprou, embora alguém pudesse tê-lo vendido.

Na bola, o Corinthians foi melhor no terceiro jogo depois da expulsão do centroavante rival e mereceu o título que os corintianos não mereciam ter sofrido tanto para vencer.

No período de 1954 a 1977 teve um Rio-São Paulo como conquista, mas dividida com outros três finalistas. Não teve título no Brasileiro, embora tenha sido vice, em 1976. Não teve título no Robertão, embora quase tenha vencido na última partida do quadrangular final de 1969. Não teve Taça Brasil por não ter participado do torneio justamente por não ser campeão estadual entre 1959 e 1968 – e pouco antes disso, e mais um tanto tempo depois.

Por não ser o que o chute de Basílio acabou ali.

E recomeçou no Morumbi a saga campeã.

Voltaria o Corinthians a ser o maior dos vencedores de títulos paulistas no bi da Democracia Corinthiana, em 1983. Ganharia o primeiro Brasileiro, em 1990. A primeira Copa do Brasil, em 1995. O primeiro Mundial, em 2000. A primeira Libertadores, em 2012. O bi da Fifa, em 2012.

Grandes vitórias de Neto, de Marcelinho Carioca, de Rincón, de Sheik, de Guerrero, de loucos de todos os bandos.

Nenhuma conquista com o sabor de 13 de outubro.

Nenhuma.

Isso não é só Corinthians. É futebol.

Só quem é entende – e eu, que não sou, mas senti um 12 de junho, sei o que é acabar com a fila.

Basílio é pai de todos.

É o nome do Basa, filho do meu amigo Vitão.

É de anjo o pé que foi com fé naquela bola que insistia em não ser Corinthians.

Foi no cruzamento de Zé Maria para Basílio que ele cabeceou buscando um companheiro na grande área da Macaca. A bola achou Vaguinho que bateu de canhota e acertou a trave do São Paulo. Wladimir pegou o rebote e enfiou a cabeça do tamanho do coração alvinegro e acertou a zaga da Ponte, do Guarani, do Palmeiras, do Santos, do Tricolor, de todas as cores anticorintianas que ainda negavam a vitória do maior rival.

No rebote de tudo contra todos, veio Basílio para acertar o chute que aprendera na base da Portuguesa com Ipojucan.

Um tiro que ele treinara de moleque no Canindé e que, por essas costas do destino e do Corinthians, resolveu cair no pé de quem sabia.

De quem Corinthians.

Basílio pegou como ela veio.

Bola alta, forte, indefensável para Carlos que depois seria Corinthians.

Como, depois daquela bola, tudo voltaria a ser campeão no Corinthians.

O time do povo que sofria sorria como nunca em 22 anos.

E o mais democrático dos paulistas naqueles anos de ferro e chumbo da ditadura soltava o grito de punho erguido e cerrado.

Festa coletiva que nunca mais se viu.

Mas que se vê, na foto, como ela também foi: a alegria de cada um.

Como o Basílio do instante eterno. Como o Corinthians que não tem foto para registrar o que foi aquilo.

A vitória dele era a de todos.

A vitória de todos era a dele.

Isso não é só Corinthians. É futebol.

Mas poucas coisas são mais futebol que o Corinthians.

Pelas tristezas e sofrimentos de 22 anos sem nada.

Ou melhor: com tudo que de fato interessa ao corintiano: o próprio Corinthians.

Se a bola de Basílio não entra, outra hora seria gol. Até se não entrasse naquela noite de quinta-feira (um dia depois de o presidente-general da ditadura militar ter afastado um ministro ainda mais ligado à turma que prendia e arrebentava…), bastaria o empate até o final dos 90 minutos, e mais outro empate em meia hora de prorrogação, para o jejum minguar.

Pelo maior número de vitórias no SP-77, o Corinthians tinha a vantagem do empate contra a Ponte.

Mas não era para ser pelo regulamento. Tinha de ser pelo Timão.

E com um gol chorado e sofrido como o Corinthians.

Vaguinho – trave!

Wladimir – zaga!

Basílio – rede!

1 a 0.

Basílio.

Não precisa de data, ano, local, razão.

Apenas a emoção de Basílio.

Não era craque. Não era titular.

Mas foi ele. O predestinado. O corintiano.

Basílio.

O cara legal que mereceu ser o ungido. O tocado. O libertador.

O campeão.

O corintiano.

Basílio.

Como na foto, não precisa de legenda.

É lenda.

Como na foto, ele é o Corinthians.

Sozinho, venceu um time melhor, e toda a torcida contrária de palmeirenses, são-paulinos, santistas e de muita gente do Brasil.

Mas será que ele realmente estava “sozinho”?

Quando se é Corinthians, dever dizer, a “solidão” é ficção.

É como a foto.

Um cara que joga por todos x todos.

A maior torcida do Brasil era contra o Corinthians.

Mas não houve maior grito de gol em todas as torcidas do Brasil que aquele que ainda hoje ouvimos do Morumbi.

Faz 37 anos.

Eram 22 anos.

Será eterno.

É Corinthians.
 

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet.

 

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