O caso Fred e o tamanho dos nossos ídolos

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O Fluminense venceu o Volta Redonda por 2 a 0 no último domingo (10), em jogo válido pela fase de classificação do Estadual do Rio de Janeiro. Principal referência ofensiva e capitão da equipe tricolor, o centroavante Fred, 32, não estava em campo. Um dia antes, em reunião com seus representantes e a diretoria do clube, o camisa 9 reclamou do tratamento que tem recebido do técnico Levir Culpi e disse que não atuará mais sob o comando dele. E esse racha tem muito a ver com o atual momento do futebol brasileiro.
Fred tem contrato com o Fluminense até 2018 e recebe R$ 800 mil mensais. Após ter rejeitado proposta do futebol chinês no início do ano, cobrou da diretoria um aumento de 25% nos vencimentos. Além disso, reclamou de questões táticas de Levir e por ter sido substituído em quatro dos cinco jogos que fez com o técnico.
Questionado pela “TV Globo” sobre o episódio antes do jogo contra o Volta Redonda, Levir tentou aplacar a crise. O treinador enalteceu Fred, disse que ainda não havia conversado com o atacante e ponderou que o diálogo é o melhor caminho para um desfecho menos traumático em situações assim. O fato de o chamado para um debate ter sido feito na câmera da principal emissora de televisão do país, contudo, só mostra o quanto a lógica dessa situação toda foi atropelada.
Contratado pelo Fluminense em 2009, Fred foi protagonista dos momentos mais marcantes da equipe tricolor na década. É um centroavante letal, com poder de definição raro no futebol brasileiro, e hoje também representa uma das principais referências entre os elencos nacionais. Talvez só Victor (Atlético-MG), Fabio (Cruzeiro) e Jefferson (Botafogo) tenham com seus clubes um grau de identificação tão grande.
O bom desempenho técnico e a identificação com o clube colocaram Fred em um ambiente confortável demais. O centroavante foi valorizado financeiramente e ganhou poder. Sobretudo porque os últimos técnicos contratados pelo Fluminense foram nomes menos badalados do que ele, que representou a seleção brasileira em duas edições da Copa do Mundo (2006 e 2010). O racha que ocorreu com Levir Culpi poderia ter sido antes se ele tivesse comandantes com mais estofo do que Ricardo Drubscky, Enderson Moreira ou Eduardo Baptista.
O que acontece agora, portanto, é um reflexo de como o Fluminense lidou com a idolatria que Fred construiu. O jogador teve privilégios e participação na vida política do clube a ponto de se sentir maior do que a hierarquia.
Também é um reflexo de como os jogadores são tratados atualmente. Fred tem um exército de aduladores em volta, como qualquer grande atleta do mundo nos dias de hoje, e também é mimado pelas pessoas que o cercam.
Certa vez conversei com o responsável pela gestão financeira de um dos principais jogadores brasileiros do planeta. Ele disse que o atleta tinha um cartão de crédito sem limite e que usava apenas para abastecer o tanque do carro. O tal ídolo não sabia sequer quanto recebia por mês.
Não sei se Fred tem esse nível de desprendimento da realidade. Não sei se ele tem noção de quanto ganha ou de como controla o dinheiro. No caso dele, porém, esse ambiente de pouca responsabilidade se traduziu em sensação de domínio do ambiente.
Fred é apenas um exemplo do quanto alguns dos nossos ídolos têm problemas com responsabilidade. É uma das principais marcas da geração dele no futebol brasileiro – Adriano e Ronaldinho Gaúcho são outros exemplos. E isso não é uma comparação entre os casos, bem entendido, mas uma constatação de que nenhum deles tem um posicionamento adequado ao macro.
Qual grande jogador brasileiro tem noção de contexto e se posiciona sobre temas que lhe são caros? Qual atleta nacional é referência de comportamento crítico ou consegue lidar com assuntos além dos próprios contratos?
O caso de Fred é apenas mais um exemplo de como formamos atletas que são cada vez menos preparados para entender o contexto. Quando rachou com o treinador e criticou Levir apenas por questões pessoais, o centroavante mostrou uma postura que foi imediatamente rechaçada pela maioria da torcida. Não por acaso, o público que estava na arquibancada da partida contra o Volta Redonda gritou o nome do treinador e xingou o atacante.
Mais do que discutir quem está certo, o que aconteceu no Fluminense é uma oportunidade para pensarmos em como estamos formando nossos ídolos e quais são as mensagens que os jogadores do futebol brasileiro podem transmitir. Afinal, que tipo de entendimento esses atletas têm sobre comunicação e relação com o público que os acompanha?
A pergunta é sobre Fred, mas poderia ser sobre qualquer um. A deterioração da relação entre torcedores e jogadores do Brasil (também) tem relação direta com a falência do modelo de ídolo.

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