O jogo de futebol: percepções erradas = análises de jogo equivocadas

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Hoje escreverei um pouco sobre um tema propício ao momento, proposto pelo leitor R. B. (iniciais do nome) de Belo Horizonte, a partir de e-mail enviado a mim.

No e-mail, ele questionou as análises que são feitas e encontradas na mídia em geral para explicar vitórias e derrotas em jogos de futebol – e apontou particularmente o jogo entre Atlético-MG e Raja Casablanca.

Pois bem, sem falar especificamente sobre o jogo vou tentar abordar o tema.

Em pesquisas e análises realizadas por esse que vos escreve, referentes a Copa do Mundo Fifa de futebol 2006 e a jogos do Campeonato Brasileiro de futebol 2012, uma das situações observadas dizia respeito ao confronto circunstancial de princípios operacionais de ataque e de defesa entre equipes nessas competições.

Em linhas gerais e em outras palavras, o que queria era observar o que acontecia com as equipes na sua organização de ataque, quando submetidas circunstancialmente ao confronto de determinada organização de defesa (e vice-versa) – tendo os princípios operacionais de defesa e ataque como viés da análise.

Sem entrar em detalhes a respeito da pesquisa quero trazer à tona uma das coisas que foi observada.

Na grande maioria das sequências ofensivas das equipes, quando suas adversárias propunham como princípio operacional, uma organização coletiva para “impedir a progressão da bola”, elas (as equipes que atacavam) tendiam a aumentar muito o volume de passes para o lado nessas sequências.

Aumentar o número de passes para o lado, levava muitas vezes a um aumento da participação com bola de zagueiros e volantes, a uma “lentidão” na transmissão da posse da bola entre os jogadores, a uma sensação (é exatamente essa a palavra) de falta de dinamismo por parte dos atletas e por fim a lançamentos errados forçando jogadas em ligação direta aos atacantes.

Então quase como em um roteiro bem programado e desenhado, quando as equipes em fase de ataque eram submetidas ao comportamento defensivo descrito, as respostas observadas eram quase sempre as mesmas.

Em outras palavras, os ataques (sistemas de ataque) eram induzidos pelas defesas (sistemas de defesa) a responderem como elas, as defesas, queriam.

Assim, olhando para os jogos dentro da imprevisibilidade circunstancial que os caracteriza, era como se as regras de ação com bola se tornassem variáveis determinadas em um grande pacote de “possíveis previsíveis”, induzidos e condicionados pela organização defensiva adversária.

Pois bem.

Agora guardemos um pouco essas informações e vamos à frente.

Contando com 2013, nos últimos quatro anos tivemos equipes brasileiras vencedoras da Copa Libertadores da América – e portanto representando o Brasil no Mundial de Clubes da Fifa.

Em 2010, Internacional de Porto Alegre (Sport Club Internacional), em 2011 o Santos FC, em 2012 o Corinthians e em 2013 o Atlético Mineiro (em 2007, 2008 e 2009 não tivemos equipes brasileiras disputando a competição – Mundial de Clubes).

Na conquista do Corinthians, muito se falou a partir das mídias em geral, sobre os méritos da equipe, especialmente no jogo final contra o Chelsea.

Nas derrotas de Internacional e Atlético Mineiro, muito se falou sobre “subestimar” o adversário, sobre “baixo rendimento técnico” de alguns jogadores e até de nervosismo (mostrado também, pelo Corinthians nos documentários pós conquista – mas, teoricamente, superado nesse caso).

Na derrota do Santos FC o que mais se viu pelos meios de comunicação pós-jogo foi o discurso de uma tal “aula de futebol” e uma tal falta de “competitividade” do time brasileiro.

De certa forma em todos os casos havia uma grande expectativa a respeito dos possíveis confrontos das equipes do Brasil com as representantes europeias – e exceto no caso do Corinthians que conquistou o título –, nas outras situações a grande sensação de frustração acabou por tomar conta de torcedores, imprensa e especialistas.

No caso dos times brasileiros mencionados que perderam, mesmo na situação do Santos FC, onde de certa forma houve na mídia a “navegação de informações” reconhecendo o bom desempenho da equipe do FC Barcelona, nunca deixou de se construir a ideia de que houve baixo rendimento técnico dos atletas e de que faltou para os times brasileiros “competitividade”, e no caso de Inter e Atlético ainda, menosprezo em relação aos adversários.

Ora, por que quase sempre nossos olhares são direcionados somente as esquipes brasileiras? Por que quase nunca, direcionamos nossos olhares ao jogo?

Deveríamos tentar entender e olhar para o jogo!

Afinal, para exceto aqueles que no momento da partida efetivamente estão jogando e que têm, portanto, o aparente controle das decisões que vão escrever as histórias dos confrontos (e que detêm todo o conhecimento que envolve o momento que os levaram até ali), o melhor que podemos fazer para tentarmos ser justos com as nossas percepções, é olhar para o JOGO!

Não deveríamos, olhando por de fora das coisas, falar sobre coisas que só podem ser realmente percebidas e sentidas por de dentro delas.

E aí, voltando as informações iniciais do texto, e olhando para o recente jogo entre o Clube Atlético Mineiro e o Raja Casablanca, e sem me aprofundar em nenhuma análise eu me questionaria:

Não seria aceitável, possível e mesmo provável, a ideia de que aquilo que observamos como produto final – a partida entre as duas equipes – seja sintoma de coisas que foram gerando e induzindo comportamentos em jogadores e equipes, e que em resultado final trouxeram problemas organizacionais (individuais e coletivos) reais de jogo para os dois times?

Não seria aceitável, possível e mesmo provável que os jogadores do Raja Casablanca se “adaptaram” melhor as exigências emergentes no jogo, e que talvez os jogadores do Atlético não?

Não seria aceitável, possível e mesmo provável que as sensações geradas em nós, observadores externos ao assistirmos o jogo, fossem e sejam sintomas também de uma percepção inconsciente de algo que incomoda nossos olhos – gerada e condicionada pelo jogo e jogadores –, mas que não somos capazes de identificar e de trazer ao nível consciente – e então passamos acreditar somente em “baixos rendimentos técnicos” e “menosprezos aparentes”?

Precisamos refletir muito a partir disso tudo!

O fato, real e marcante é que mesmo com o grande número de matérias falando sobre o suposto “vexame” do time do Atlético MG; em uma enquete realizada pelo programa Arena SporTV, do canal a cabo SporTV, o principal motivo apontado pelos internautas para a derrota da equipe brasileira, foi a superioridade do Raja Casablanca!

Não sei quais os motivos para esse resultado aparentemente divergir das grandes manchetes que atingir
am a mídia no pós-jogo – e nem sei se ela necessariamente significa divergência (penso que sim!).

Faz tempo que inúmeros pensadores, especialistas, treinadores e diversos outros profissionais envolvidos diretamente com futebol vêm chamando a atenção para o fato de que “coisas” precisam ser mudadas no futebol brasileiro (a se iniciar pelas análises de jogo)!

Mas poucas pessoas dão ouvidos!

Não são as derrotas do Atlético, do Santos ou do Internacional. Não são as vitórias do Corinthians no Mundial de Clubes da Fifa ou da seleção brasileira na Copa das Confederações 2013 (mérito indiscutível de todos os envolvidos nessas conquistas)!

Não, esses resultados não são os motivos para mudanças ou não mudanças!

Mesmo os vencedores que acabei de mencionar – os envolvidos nas conquistas de Corinthians e Seleção Brasileira – estão a mercê e são vítimas (mesmo que inconscientes) de uma série de variáveis, decisões e processos que estão engatinhando no longo caminho do tempo do nosso futebol!

Estão passando por nós, e nós ainda nem nos demos conta disso!

Acreditamos de verdade que somos os melhores, simplesmente porque sempre fomos, e que portanto sempre seremos!

Para sermos os melhores precisamos ganhar, não apesar do sistema; temos que ganhar contando com ele!

Vitórias “apesar do sistema” são coisas isoladas (assim como derrotas) – e servirão pouco para mudar as coisas.

Se analisarmos mal os problemas a que somos confrontados, tomaremos decisões equivocadas (e continuaremos com problemas)!

Se nem percebermos que temos problemas, bom aí… Aí, só reticências mesmo…

Por hoje, acho que é isso…

Até a próxima coluna!
 

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