A comunicação na crise

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Não há processo de gestão que possa ser desprendido de comunicação. Contudo, em poucos momentos a importância desse trabalho é tão perceptível quanto na crise. De ações internas a contato com consumidores, concorrentes e potenciais interessados, uma boa estratégia pode ser responsável por grande parte do caminho de um trabalho de controle. Em contrapartida, também pode ser gasolina em uma fogueira acesa.

O futebol brasileiro tem exemplos recentes disso. É o que acontece no São Paulo, time que lidera seu grupo no Campeonato Paulista e ainda está na briga por vaga na próxima fase da Copa Libertadores. A equipe joga mal, o técnico Muricy Ramalho não encontra um padrão tático, jogadores fundamentais têm rendido abaixo do esperado, a diretoria está dividida, os ingressos foram majorados e a presença de público nas arquibancadas diminuiu consideravelmente. São muitos os fatores responsáveis por um ambiente que está longe de ser tranquilo. Nenhuma delas, porém, é mais importante do que os erros em estratégias de comunicação.

Do time para dentro, por exemplo: Muricy Ramalho dá sinais de esgotamento; em coletivas, já chegou a dizer que tem pedido coisas e não tem sido atendido pelos atletas. As declarações do treinador mostram alguns pontos:

– Ele não sente total respaldo do grupo de jogadores;

– Ele não tem vergonha ou não vê problema ao expor isso e atribuir grande parte da culpa aos atletas.

A crise também é de relacionamento. Muricy nunca foi um treinador conhecido pela amizade com jogadores ou por montar grupos extremamente fechados. Ao contrário, é alguém que cobra e discute em tom muito profissional. Não existe um problema nessas características, mas elas cobram um preço em momentos ruins: por não ser próximo dos atletas, o técnico tem poucos que “correm por ele”.

Por fim, existe um problema de gestão. A cúpula do São Paulo está rachada e tem tomado decisões extremamente questionáveis. O futebol ainda segue blindado, mas lida com problemas decorrentes do desarranjo político, como atrasos em pagamentos e a criação de um ambiente instável. Mesmo que as notícias ruins não respinguem no CT, é natural que os jogadores pensem que essa proteção é questão de tempo.

Do clube para fora, a crise tem sido igualmente mal contornada. Até quando manteve Muricy Ramalho, que chegou a entregar o cargo, a diretoria errou no processo de comunicação. Não houve nada que mostrasse ao torcedor de forma contundente o quanto essa decisão era benéfica para a equipe.

Diretoria e torcida têm como principal foco de divergência o preço dos ingressos, mas outros pontos são nevrálgicos para entender um afastamento. Declarações de dirigentes no início do ano, por exemplo, enalteceram o time montado para 2015. Eles estabeleceram um parâmetro, e agora têm sido cobrados por isso.

A comunicação do São Paulo foi desastrosa em processos como a inflação dos ingressos e até as relações institucionais. Ações do presidente Carlos Miguel Aidar transformaram uma pequena rusga com o Palmeiras em combustível para a equipe alviverde em clássico recente.

O São Paulo não vive bom momento, mas já reagiu em fases assim. O próprio Muricy Ramalho conduziu mudanças de ambiente para chegar ao título brasileiro de 2006 ou para evitar o rebaixamento em 2013. O diapasão atual podia ser bem diferente se a comunicação fosse voltada a isso.

Essa também é a sensação que passam Fluminense e Grêmio. São dois times que estão em reformulação e que vivem oscilações naturais de um processo tão complicado – principalmente porque ambos decidiram apostar fortemente em atletas menos experientes. As torcidas podiam comprar essa ideia e jogar junto. Em vez disso, por não terem sido devidamente trabalhadas, criou-se um distanciamento que virou cobrança.

O Grêmio tem como principal motivador disso o técnico Luiz Felipe Scolari. A despeito de ser ídolo do clube, ele tem contribuído de forma inexplicável para tornar o ambiente mais conturbado. Da cobrança por reforços à auto-expulsão em um jogo, o treinador não conseguiu aproveitar seu carisma para fazer a torcida acompanhar o time.

No Fluminense, Cristovão Borges tentou contemporizar. Quase todas as entrevistas dele em 2015 abordaram a profunda reformulação feita pela equipe, que perdeu seu principal mecenas após o término de um contrato longevo com a Unimed. A estratégia dele pode ter funcionado com parte dos adeptos, mas não com a diretoria, que preferiu trocá-lo.

Nas últimas temporadas, criar crises tem sido a principal razão de ser dos torneios regionais do Brasil. Esvaziados, confusos e mal trabalhados, os campeonatos servem apenas para mostrar quem não está trabalhando direito.

Entretanto, esse trabalho mal feito pode ser potencializado se for acompanhado por processos deficientes de comunicação. O futebol brasileiro está cheio de exemplos. 

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