A Globo acordou

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Principal parceria do futebol nacional, a TV Globo está preocupada. A emissora carioca agendou reuniões com os maiores times do Brasil para pedir sugestões e discutir por que o esporte não funciona como produto. Nos últimos anos, as transmissões ludopédicas no canal tem perdido média de 10% de espectadores a cada temporada.

É sintomático que a Globo tenha decidido se mexer nessa direção. O futebol não é um problema comercial para a emissora, ainda que a operação tenha alto custo. No entanto, é flagrante a preocupação com a queda de audiência em horários cuja relação custo / benefício poderia ser mais simples com outras apostas.

A Globo paga muito para transmitir o futebol, mas tem menos resultado e mais custo com isso do que com outros produtos. Portanto, empurra a faixa esportiva para mais tarde, numa faixa em que anúncios são mais baratos e há menos concorrência por audiência.

Importante dizer que também há pesquisa nisso: as pessoas que veem futebol pela TV preferem jogos às 22h de quarta-feira. O horário é ruim para quem frequenta os estádios, mas o interesse da TV sempre vai ser sobreposto enquanto o esporte não tiver poder de barganha.

Atualmente, por exemplo, a Globo responde por quase um terço da arrecadação do Corinthians, time que mais fatura no Brasil. Se o time não desenvolve outras fontes de receita e tem grande dependência desse dinheiro, perde influxo. E se o time não tem influxo, qualquer negociação penderá para o lado da TV.

Entender essa relação de causa e efeito é fundamental como preâmbulo para discutir o que significa a ação da Globo. A emissora está preocupada com o produto futebol no Brasil a despeito de o produto ser moldado em muitos aspectos pelos interesses da TV.

Jogos são realizados às 22h de quarta-feira porque esse é o horário preferido pela TV. (Também) por causa disso, estádios ficam vazios. Com estádios vazios, clubes têm menos receita de bilheteria e exploração da arena. Além disso, se aproximam menos dos torcedores / consumidores. No médio e no longo prazo, esse público menos vinculado às equipes é o que vai deixar de acompanhar as partidas na TV. E sem eles, a audiência vai cair e obrigar a televisão a fazer jogos ainda mais tarde. É um ciclo de morte para o futebol brasileiro.

É claro que esse é um raciocínio extremamente simplista, que ignora outros pontos como gestão (de clubes e do “produto” futebol) e fontes diferentes de receita. Mas o modelo de venda de patrocínio no Brasil também é extremamente vinculado à exposição, por exemplo – mais uma vez, portanto, a receita dos clubes depende de eles estarem na TV.

A TV é diretamente responsável pelo atual momento do futebol brasileiro. Clubes e federações também – até por criarem modelos que se apoiam demais na receita oriunda da televisão. Por isso, as reuniões da Globo com as equipes são um marco.

Ao mostrar preocupação com a queda de desempenho do futebol, a emissora joga na cara dos clubes a existência do tal ciclo. Agora, depende de ação conjunta uma mudança nesse cenário.

A primeira reunião foi realizada no dia 12 de agosto, no Rio de Janeiro, com representantes de Atlético-MG, Cruzeiro, Flamengo e Fluminense. Mais do que apresentar dados ou falar sobre números, os executivos da Globo quiseram ouvir.

A primeira resposta de Alexandre Kalil, presidente do Atlético-MG, foi uma crítica à programação da Globo, que não tem transmissões específicas para todas as praças – normalmente, o sinal da emissora é dividido entre São Paulo e rede.

A crítica de Kalil tem a ver com discussão que ganha corpo entre os clubes. As equipes brasileiras estão preocupadas com a falta de exposição em TV aberta, o que dificulta a venda de contratos e aumenta a distância de faturamento estabelecida pelas negociações com a televisão.

Também é sintomático que clubes questionem agora os contratos com a televisão – divisão de cotas e exposição em TV aberta. A Globo tem contrato assinado com 18 dessas equipes até 2018. Muitas já até começaram a receber cotas dos próximos anos.

Agora, com o mercado de patrocínios em baixa e atrasos de contas se avolumando, clubes perceberam que é necessário rever a comercialização de direitos de mídia. A TV é cerne de qualquer discussão sobre o futebol brasileiro, sim. O problema é fazer isso em plena vigência de contratos tão longevos.

Ao avaliar desempenho, fazer cobranças e pedir sugestões, a Globo mostrou preocupação com o futuro do futebol brasileiro. A emissora falou até sobre estrutura de categorias de base e mecanismos para manter jogadores por mais tempo no país – a lógica é que mais ídolos aumentariam o vínculo do público com as equipes e diminuiriam a queda de audiência.

Ao questionar contratos vigentes e tão longos, os clubes mostraram preocupação com o presente. Ninguém está realmente preocupado com os efeitos que esses negócios terão no futuro das equipes. O interesse é apenas pagar as contas do mês.

A Globo pode estar ligada a muitos problemas do futebol brasileiro. Nesse caso, porém, tem postura muito mais lúcida do que a maioria dos clubes. 

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