Entre o céu e o inferno

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O técnico Luiz Felipe Scolari já disse em várias ocasiões que o título é o único caminho possível para a seleção brasileira na Copa do Mundo de 2014. Para José Maria Marin, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), a campanha da equipe nacional será o diferencial entre “céu” e “inferno”. No entanto, jogos realizados nos últimos dias contrariaram radicalmente essas teses deterministas.

No último domingo, por exemplo, o futebol brasileiro conheceu nove campeões estaduais. Um deles foi o Ituano, que venceu o Campeonato Paulista após bater o Santos nos pênaltis por 7 a 6.

O Ituano acabou o Campeonato Paulista com a defesa menos vazada e com uma perspectiva nada positiva: o elenco, cuja folha salarial gira em torno de R$ 350 mil mensais, deve ser inteiramente desfeito. A campanha no torneio regional rendeu uma vaga na Série D do Brasileiro.

Além da quarta divisão, o Ituano jogará a Copa Paulista em 2014. O título estadual representa muito para a história do clube, mas pouco para o momento. A maior surpresa do ano no futebol de São Paulo é um exemplo do quanto o atual formato do futebol brasileiro distorce rapidamente conceitos como céu e inferno.

“Ah, mas o Estadual não vale mais nada”, alguém pode argumentar. Veja então as consequências dessas competições no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul – Flamengo e Internacional, respectivamente, foram os campeões desses Estados.

O Flamengo precisava de um empate com o Vasco, mas perdia por 1 a 0 até os 46min do segundo tempo. O volante Márcio Araújo, impedido, anotou o gol do título rubro-negro.

A taça manteve um tabu de 26 anos e seis decisões. O Flamengo não perde um título para o Vasco desde 1988. A derrota ainda serviu para uma série de provocações: o zagueiro Chicão debochou de funcionários do rival, e o goleiro Felipe chegou a dizer que “roubado é mais gostoso”.

A decisão do Rio Grande do Sul também teve muito significado. O Internacional, que já havia batido o Grêmio fora de casa no primeiro jogo, fez 4 a 1 na segunda partida e ficou com a taça.

Certamente, jogos assim ainda vão reverberar. No fim, vitórias e derrotas são lados indissociáveis do jogo. O que marca é a jornada.

O torcedor do Grêmio não ficará triste apenas por ter perdido o título, mas pela superioridade do Internacional. O vascaíno não lamenta apenas a derrota, mas o histórico de frustrações contra o Flamengo.

E o santista? O time da Vila Belmiro não venceu o Campeonato Paulista, a despeito de ter enfrentado na decisão um rival com potencial econômico infinitamente menor. Ainda assim, foi a equipe que mais encantou em vários momentos da competição.

A campanha do Santos incluiu goleadas, bons jogos e a afirmação de garotos como Gabriel e Geuvânio no time profissional. No fim, é o caso de o torcedor olhar para a derrota como “apenas uma derrota”. Nem céu, nem inferno.

Uma das seleções brasileiras mais lembradas na história das Copas é a de 1982, que não venceu. Em compensação, o Brasil foi campeão com times pragmáticos e deterministas (em 1994 e 2002). Foram títulos que marcaram pelos feitos, não pelas campanhas.

O futebol, no fim, é um instrumento para criar momentos emocionantes. O torcedor guarda os instantes em que perdeu o ar: um gol decisivo ou uma vitória encantadora, por exemplo.

É essa crise de identidade que o Barcelona tem vivido. O time catalão não deixou de tocar a bola ou de pressionar a saída do adversário. Contudo, deixou de encantar.

Na última quarta-feira, o Barcelona foi eliminado da Liga dos Campeões da Uefa pelo Atlético de Madri. O time catalão teve mais de 60% de posse de bola, mas finalizou pouco.

Em outro jogo das quartas de final do torneio, o Bayern de Munique passou pelo Manchester United. O time alemão é comandado por PepGuardiola, ex-técnico do Barcelona, e também teve mais de 60% de posse de bola. Mas foram quase 20 conclusões.

A diferença entre Barcelona e Bayern não é apenas a quantidade de chutes a gol. O time espanhol enfrenta problemas de postura e de posicionamento, e isso o transformou numa versão estéril de um futebol que já chamou atenção do planeta. No sábado, os catalães perderam por 1 a 0 para o Granada.

O que Granada e Atlético de Madri fizeram para bater o Barcelona não foi muito diferente do que outros times adotaram como prática nos últimos anos: um jogo truncado, com muitas faltas no campo de ataque, forte marcação e rápida transição.

O Atlético de Madri, aliás, é um caso especial. Há um encaixe entre time, técnico e torcida. Há um clima favorável em uma equipe que reconhece suas limitações, pratica um futebol simples e prioriza a intensidade.

Na reta final da temporada, o Atlético de Madri ainda pode vencer o Campeoanto Espanhol e a Liga dos Campeões da Uefa. Se nenhuma dessas coisas acontecer, porém, o orgulho do torcedor não será abalado. Pelo estilo de jogo e pela dedicação, já é possível ter certeza de que o time da capital espanhola “cairá de pé”.

Vitórias e derrotas determinam o rumo de livros de história. No futebol, porém, há muita emoção que independe do resultado de um jogo ou de um campeonato. Entre o céu e o inferno, o que vale é o caminho.

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