Futebol: a Uefa Champions League, as verdades absolutas, a posse de bola de Guardiola e os filósofos de Mourinho

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A semana dos jogos de volta, da Uefa Champions League 13/14, foi muito interessante, especialmente pelas discussões geradas pelas derrotas e eliminações de Bayern de Munique e Chelsea FC.

Como é típico no futebol, a fronteira entre bons e maus, mestres e leigos, mitos e esquecidos, desapareceu quase que completamente em muitos dos debates construídos em função dos jogos Bayern vs Real Madrid, e Chelsea vs Atlético de Madrid.

Verdades sucumbem à novas verdades… “novas verdadeiras verdades” – por vezes nem tão novas, nem tão verdadeiras…

Pois bem.

Para escrever hoje sobre os jogos e alguns de seus personagens, e desenvolver a ideia central da redação que inicio aqui, vou recorrer a ajuda do trecho de um texto do professor Alcides Scaglia, publicado em 2007 na Universidade do Futebol (o título do texto é: “Quem diz a verdade no futebol?” – disponível em: https://universidadedofutebol.com.br/Coluna/7253/buscar ).

O trecho em questão, trata justamente da “VERDADE”.

Vejamos:

“Assim, imbuído sempre da atenção com o banal, a verdade (que é sempre banalizada no meio futebolístico), é algo que sempre me incomodou. Logo, só poderia mesmo me inquietar ao deparar-me com os três caminhos etmológicos da verdade.

O que se conhece por verdade possui três origens distintas: a grega, a latina e a hebraica.

ALETHEIA é verdade em grego, e diz respeito ao que não é oculto. Logo, ela é conhecida à medida que é desvelada. A verdade está posta, "determinada" por um padrão organizacional dependente da interação de suas estruturas internas. Cabe ao homem descobri-la, e entendê-la como ela é no mundo.

Em latim, verdade é VERITAS e significa o rigor do relato sobre alguma coisa. Desse modo, a verdade pode vir a ser conhecida por meio da rigorosidade do relato verdadeiro de um fato, ou seja, a verdade será corroborada após o fato.

Já, em hebraico, verdade é EMUNAH e diz respeito à confiança que uma pessoa tem em relação a fala de outra. Então a verdade é dependente de quem fala, e assim acredita-se que o fato relatado será verdadeiro, pois quem a professa é inquestionável.

Cada uma dessas três palavras traz um significado diferente, o que acaba "distorcendo" a verdade, evidenciando que a verdade verdadeira não existe, e que ela é sempre parcial”.

Pois bem.

Me pautando na ideia central do trecho do texto que separei, “a verdade verdadeira não existe”, “ela é sempre parcial”, e está enviesada por uma série de aspectos que nascem dos ambientes que vivemos, da cultura em que estamos imersos.

Então, é possível e provável, na observação de mesmos fenômenos pseudoparametrizados e de mesmos fenômenos não parametrizados, que diferentes observadores tenham diferentes percepções, conclusões e verdades.

O jogo de futebol é um fenômeno que apesar dos estudos, da disseminação de conceitos que o envolve, e também dos seus parâmetros (construídos lentamente), permite e incentiva culturalmente o empirismo, o sem número de percepções, conclusões e verdades.

E eu como não sou dono dela, mas podendo justificar possíveis erros em minhas conclusões por sua parcialidade (parcialidade da verdade) e pelo fato de que ela, a verdade, não existe, vou então me arriscar com algumas opiniões sobre os jogos de volta das semifinais da UEFA Champions League 13/14.

O Bayern foi no placar, “atropelado” pelo Real Madrid.
Bayern de Guardiola e de muitos talentosos jogadores, contra o Real Madrid de Carlo Ancelotti e outros tantos “craques”.

Do lado do time espanhol, mudanças na organização defensiva e ofensiva da equipe, com relação a maneira de jogar do ex-Real de Mourinho. Mais maleável sob o ponto de vista estrutural e com referências zonais diferentes, o Real Madrid de Ancelotti sofreu pouco contra o time alemão. Teve pouco a bola sob sua posse efetiva ou transitória, mas quando a teve cuidou bem dela.

Até aí, tudo muito óbvio.

O não óbvio foi a derrota tão avassaladora e a dificuldade de criar jogadas de perigo por parte do Bayer de Munique.

E por mais que me digam, contrariamente, que até isso foi óbvio, vou me permitir discordar.

Assisti a todos aos jogos do Bayer que foram transmitidos pela TV nessa temporada 13/14. E foram muitos! E talvez sim, nos últimos 8 jogos especialmente, a equipe alemã tenha gastado muito mais energia para construir sequências ofensivas que potencializassem suas chances de marcar um gol, do que no início da temporada – mesmo assim, vinha de certa forma conseguindo.

A posse de bola com fim nela mesma (ainda que eu discorde disso! – ela jamais deve ter fim nela mesma!) apresentava alternativas de risco contra os adversários – tanto que fazer gols, até então, não vinha sendo um grande problema.

Vencer ou perder faz parte do jogo, e sob o ponto de vista estratégico, o próprio Pep Guardiola na coletiva de imprensa pós segunda partida, admitiu ter falhado.

E ter falhado como treinador sob o ponto de vista estratégico não significa, evidentemente, abrir mão daquilo que considera essencial sob o ponto de vista organizacional, para sua equipe jogar: ter a bola.

E nisso teremos, querendo ou não, que concordar: não na essencialidade da posse da bola, não; mas no fato de que o treinador Josep Guardiola, conseguiu de certa forma, operacionalizar o jogar de sua equipe de acordo com aquilo que acredita ser essencial!

Não podemos negar que o Bayer de Munique atual assumiu características do Barcelona de Guardiola.

E por mais que não pareça, isso é fantástico, especialmente porque muitas vezes somos convencidos pela ideia de que grande parte dos aspectos das partidas de futebol são orientados pelo acaso!

O próprio Guardiola, muitas vezes, foi colocado em dúvida quando treinava o FC Barcelona – “qualquer um poderia fazer aquele time jogar daquela maneira” (desmerecendo o trabalho do treinador) – e pudemos acompanhar o que aconteceu…

O que quero dizer, com isso tudo é que podemos questionar as estratégias assumidas pelo Bayern para enfrentar o Real Madrid; podemos questionar o modelo de jogo concebido como ideal por Josep; mas que o “efeito treinador” construiu um novo (e não necessariamente melhor) jogar para a equipe alemã, penso que não podemos questionar.

E qual o mérito nisso?

O de que o trabalho faz diferença!

Parece óbvio? Mas acreditem, no futebol não é!

Isso vale para Carlo Ancelotti e Real Madrid, Diego Simeone e Atlético de Madrid, e José Mourinho e Chelsea FC.

Treinadores bem preparados e com estrutura de pessoal, de clube e de calendário para treinar, farão diferença para seus jogadores e para suas equipes! E talvez isso, n
esse momento é o que está “pesando” contra José Mourinho.

De “herói” da imprensa especializada por montar defesas impenetráveis, à vilão, da mesma imprensa, incapaz de compreender porque um time caro e com bons jogadores, “abdica” do jogo para se aproveitar de contra-ataques.

Também, na essência, não sou capaz de compreender, mas por um motivo fácil de aceitar: não estou no dia-a-dia do Chelsea FC, vivendo seus treinos, seus problemas e suas virtudes.

Porém, em minha lógica de percepção, na minha parcial verdade, não posso esquecer que estamos falando de um treinador muito bem sucedido, em países diferentes, com jogadores de culturas diferentes e em diferentes competições (que deve ter uma excelente percepção daquilo que faz).

Não posso me esquecer que o contra-ataque também é do jogo, e não uma “abdicação” do mesmo.

Então, ainda em minha lógica de percepção, é mais fácil aceitar (minha verdade) que José Mourinho deve estar considerando coisas que não podemos observar – não por incompetência, mas por estarmos “fora do círculo” Chelsea FC.

Não estou eu aqui, a defender José Mourinho e/ou Josep Guardiola; afinal de contas o que vale no futebol é a vitória, e tanto um, quanto o outro perderam.

Estou aqui a defender a ideia de que nossas percepções podem falhar… Não por nossa “culpa”, mas sim por causa das nossas verdades, que por vezes sem nos darmos conta, nem nossas são…

Por isso estou quase certo: é só esperamos a próxima vitória, e tudo, mais uma vez, deverá mudar… 

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