Limiar de lactato aplicado ao futebol: aspectos metodológicos

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Após escrever os aspectos históricos e conceituais sobre a aplicação do limiar de lactato, finalmente chegou o momento de destacar os aspetos metodológicos. Para fins didáticos, cada ponto que julgamos importante será abordado em tópico separado. Espero que você goste. Boa leitura!

Idade dos atletas: é importante lembrar que do ponto de vista biológico, não faz sentido obter o limiar de lactato em atletas jovens e imaturos. Isso porque o metabolismo anaeróbico lático – o qual é o responsável pela produção de lactato – depende da ação de algumas enzimas que até a puberdade ainda não ativaram sua capacidade máxima de trabalho.

Época da temporada: sabendo que a avaliação pode ser diagnóstica, formativa e/ou somativa, recomendamos que o limiar de lactato seja obtido, no mínimo, quatro vezes ao longo do calendário esportivo. A primeira avaliação deverá ocorrer na chamada pré-temporada com o objetivo de diagnosticar como cada atleta se encontra em relação ao grupo. A segunda deve ser feita ao final da pré-temporada para saber o quanto cada atleta progrediu para o início do campeonato. A terceira deverá ocorrer no meio do campeonato para determinar qual(is) atleta(s) ainda precisa(m) melhorar ou apenas manter a capacidade anaeróbia lática e a quarta e última deverá ocorrer no final da temporada para poder dar uma ideia na avaliação do próximo ciclo o percentual de decréscimo que cada jogador apresentou em relação à temporada passada.

Ergômetro: a palavra ergômetro significa “medidor de trabalho”. Ele é utilizado para avaliar a eficiência de determinada tarefa, sendo a caminhada, a corrida, a natação, a remada e a pedalada, as atividades mais comumente mensuradas. Considerando que a corrida intensa e intermitente é determinante de desempenho par ao futebol, em suma, não faz muito sentido avaliar jogadores de futebol em uma bicicleta ergométrica ou em uma esteira com corridas contínuas onde não há variação de direção, aceleração e velocidade.

Protocolo: esse é um item fundamental, pois dependendo do protocolo aplicado, as medidas de lactato poderão se tornar inúteis. Isso porque o lactato produzido pelo músculo demora certo tempo para aparecer na corrente sanguínea o que faz com que protocolos com estágios de curta duração (< que 3min) não reflitam a concentração daquela carga. Se isso ocorrer, haverá erro de interpretação o que fará a medida se tornar um fracasso.

Critério: em geral, existem três critérios para determinação do limiar de lactato. O primeiro é a utilização de concentrações fixas de lactato, independente do jeito da curva (cinética). O segundo é a identificação do aumento exponencial da cinética de lactato em cada indivíduo. O terceiro é pela aplicação de ajustes matemáticos nas curvas individuais. Dos três métodos utilizados se faz importante também não somente determinar o ponto onde o limiar de lactato ocorre, mas também o grau de inclinação da curva, pois com o treinamento físico, os atletas poderão apresentar três tipos de respostas: i) modificar o ponto de ocorrência do limiar sem, no entanto, mudar a curva; ii) mudar a curva sem mudar o ponto de ocorrência do limiar; iii) mudar tanto o ponto de ocorrência do limiar quanto a inclinação da curva. Com isso, para cada situação existirá um tipo de ajuste diferente no treino, o que deve ser visto com bastante atenção.

Local da coleta: ao contrário do que possa parecer, ao invés do espaço físico onde o teste será realizado, este tópico refere-se ao local do corpo de onde o sangue será retirado. A coleta de sangue poderá ser feita na veia ou na artéria, mas como a colocação de cateteres e de agulhas aumentam o desconforto e o risco de contaminação, por questões práticas, geralmente se faz coleta de sangue arterializado na ponta dos dedos de uma das mãos ou do lóbulo de uma das orelhas.

Quantidade de sangue: a determinação da quantidade de sangue a ser retirada irá depender do tipo de aparelho onde o sangue será analisado. Para alguns aparelhos basta a coleta de microamostras de 10 µL (microlitros) enquanto outros necessitam de 25 µL ou 50µL.

Armazenamento: caso o sangue não seja analisado na hora, o mesmo deverá ser congelado ou pelo menos deverá permanecer resfriado antes de ser armazenado. Para isso se faz necessário preparar recipientes onde o sangue possa não somente ser guardado sem perder suas características biológicas, mas também ser transportado com segurança. Além disso, como a maioria dos analisadores de lactato não fazem a leitura com sangue coagulado, no caso de armazenamento do sangue é importante diluir o sangue em alguma substância anti-coagulante (heparina ou fluoreto de sódio, por exemplo) e que evite hemólise.

Tipos de análise e de aparelhos: os aparelhos utilizados para análise de lactato normalmente baseiam-se em métodos de espectofotometria ou de análises enzimáticas. São divididos em fixos ou portáteis e embora ambos sejam bastante precisos, recomenda-se utilizar sempre o mesmo tipo, marca e modelo de equipamento para se fazer comparações entre as análises. No caso de se utilizar equipamentos de diferentes tipos, marcas e modelos, nunca saberemos se as divergências ocorreram pela alteração na capacidade do atleta ou se foi pelo erro de medida entre os diversos aparelhos.

Estado nutricional e hídrico: é importante antes do teste que os atletas tenham se alimentado e estejam hidratados, pois a dieta pode alterar não só o desempenho do teste, mas também mudar a resposta do lactato. Além disso, a desidratação pode dificultar a retirada de sangue, aumentar a hemólise (quebra das hemácias) e impedir retiradas sucessivas de sangue às quais são necessárias em protocolos longos.

Cuidados: lembrando que esta medida exige a aplicação de uma técnica invasiva, vale pontuar que devemos ter todo o cuidado possível para evitar contaminação do avaliado e do avaliador. Utilização de óculos de proteção, luvas descartáveis a cada coleta, cuidado no manuseio dos objetos cortantes e perfurantes, bem como cuidados com o descarte do material biológico são imprescindíveis.

Isso posto, espero ter dado minha contribuição. Agora mãos à obra! Agradeço a todos os leitores que nos contataram via e-mail, Facebook, Twitter e até pessoalmente. Nossas conversas geraram debates, dúvidas, sugeriram temas e nos colocam no caminho certo para o crescimento. O estudo no futebol só irá evoluir dessa forma! A todos vocês o meu muitíssimo obrigado!

Para saber mais

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Para interagir com o autor: cavinato@universidadedofutebol.com.br
 

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