O futebol brasileiro evoluiu ou ainda somos escravos do sistema?

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Nos últimos anos muito mais que derrotas simbólicas e devastadoras tanto em competições de clubes continentais, intercontinentais e de seleções, por incrível que pareça, a maior derrota que tivemos foi perder para nós mesmos cada vez mais. Atualmente, parece que resgatamos um pouco esse lastro negativo, especialmente com a evolução de jogo da seleção nacional, a evolução de alguns treinadores de clubes com boas ideias e o crescimento e valorização das categorias de base com uma grande safra de formadores. Nosso país está respirando seu futebol novamente? Esse panorama nos faz enxergar um fio de luz no final do túnel para um futebol melhor? Mas esse futebol melhor existe realmente? O que é realmente perder?

Nosso futebol vem perdendo desde que confundiu conceitos. Infelizmente viramos escravos do sistema, de suas tribos e seus caciques. Perdemos a alegria do toque e do drible pela ofuscada necessidade da vitória a qualquer custo, quando começamos a valorizar mais os “voluntariosos operários”, os “atletas do atletismo” do que os criativos e talentosos que também aprendem a trabalhar intensamente e coletivamente. Perdemos quando confundimos organização com rigidez e talento apenas com um jogador resolvendo o jogo com ações individuais de “Freestyle”. Também perdemos quando os treinadores querem protagonismo em excesso e esquecem que o futebol é dos jogadores.

Entendemos pelo avesso a evolução do futebol achando que a sobrevalorização da dimensão física, os treinos mecânicos, o jogo ultradefensivo, a estratégia do Napoleão, a vitória a qualquer custo, devam fazer parte do novo cardápio do novo futebol brasileiro. Fomos tirando toda a criatividade e o poder de improvisação que sempre foi o diferencial nos nossos jogadores. Sem perceber criamos um habitat de “outro planeta”, matando uma realidade, uma cultura que poderia ser melhorada, evoluída com os novos preceitos de organização de treino e de jogo.

Bem, especialmente nos últimos 20 anos, algumas vitórias e alguns títulos esconderam muita coisa. É aquela velha constatação: quando ganhamos uma competição, somos eternos durante 1 ano, 2 anos ou 4 anos e vivemos em constante festa, lembrança e irmandade. Será que apenas vitórias e títulos são suficientes ou escondem muitas coisas erradas? E esse novo momento de reconstrução que estamos vivendo pode ser um salto para percebermos que o processo é algo construído e demanda tempo, estrutura e convicção? Mas se não ganharmos a próxima Libertadores ou a próxima Copa do Mundo tudo se desmoronará e desmontará?

São várias perguntas interessantes levantas, analisadas na teoria, mas que só saberemos quando soar o apito final das competições disputadas. E se após esse apito final a vitória não chegar?

A claridade que subitamente é escura do cenário nacional tem demonstrado que o futebol brasileiro virou epicentro de um sistema resultadista, interesseiro, capitalista, corrompido, que pouco se preocupa com processos contínuos e muito menos em propiciar prazer, emoção, brilho e um futebol de essência a todos. Um ninho de masoquismos e oportunismo.

Mas como somos carentes, essa luz no final do túnel dos últimos meses, essa melhora, vem fazendo com que a ferida da autoestima nacional venha cicatrizando. Mas passamos anos assustados sem assustar ninguém. Muito por que nesses últimos 20 anos, reduzimos nosso jogo para uma execução burocrática, medrosa, medíocre, fortuita, mal jogada, física e simplificada. Apenas um reflexo social. Tal cenário atinge especialmente o futebol de base. Todos obcecados pela vitória, pelo dinheiro e pela fama. Ninguém está mais preocupado com a qualidade do jogo e em vencer jogando bem e com o prazer de jogar bem.

Bem, muitos dizem que nem todos têm talento para jogar bem. Será? O que é jogar bem? É fazer firulas e jogar ultra ofensivamente de forma anárquica o tempo todo ou jogar organizado e deixar os jogadores expressarem suas qualidades e seus diversos perfis de talento? E nosso talento natural está se esgotando cada vez mais? Sorte que ainda temos muitas cidades interioranas, favelas e alguns treinadores formativos. Não sabemos até quando esses poucos sobreviverão. O reservatório está esgotando. Nessa lacuna terá que entrar o processo, sua lógica e seu caráter.

Abreviando, o futebol brasileiro precisa menos dos caminhões blindados que transportam dinheiro para as ocas dos caciques, e mais profissionais competentes com sensibilidade, que estudam e fabricam conhecimento, que não tenham medo e sejam escolhidos por seus méritos e não por confrarias, trocas de favores e cargos políticos. Simplesmente precisamos desenvolver a singularidade do talento com entendimento coletivo, organização e paixão. As outras coisas, muito menos importantes, serão consequentemente arrastadas.

Enfim, não podemos nos conformar em ser uma terra forasteira sem identidade que transformou seu futebol num “vírus” que está se alastrando e não tem remédio, não tem tratamento, pois “quase todos” estão contagiados e poucos querem se tratar. E por incrível que pareça, esse tratamento é simples, fitoterápico e vem da natureza: o talento singular do jogador e a arte do jogo.

Abraços e até a próxima quarta!

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