O modelo brasileiro de formação, o Footecon e o que podem ser boas notícias para o nosso futebol

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Caros leitores,

no último dia 6 de dezembro, tive o privilégio de, pela primeira vez, participar do Footecon. Este fórum, idealizado há oito anos e organizado pelo ex-técnico da seleção brasileira de futebol, Carlos Alberto Parreira, mais do que networking, possibilita a observação do que é tema de discussão entre os grandes nomes e clubes do futebol brasileiro.

Como havia palestras simultâneas e tinha a disponibilidade de permanecer somente por um dia, seguramente perdi discussões de alto nível, porém, das que pude participar, destaco duas que precisam ser amplamente divulgadas e que serão sintetizadas nas próximas linhas.

Precisam ser amplamente divulgadas porque todas as atitudes que favoreçam o potencial de desenvolvimento do futebol brasileiro devem ser ouvidas e analisadas pelo maior número de stakeholders possíveis para que, de acordo com as adaptações necessárias em cada realidade, sejam colocadas em prática.

A discussão sobre a importância da formação de atletas tem ganhado cada vez mais espaço nos diversos ambientes em que se discute futebol. Quando esta conversa surge nas salas universitárias, os comentários tendenciosos dizem que é um tema muito acadêmico para o mundo do futebol. Se é feita pelos dirigentes dos clubes formadores emergentes, o contraponto é feito afirmando que o custo x benefício desse investimento não é vantajoso; e, se é feito por jovens e ainda inexperientes treinadores, as opiniões os classificam como sonhadores num aparente imutável cenário brasileiro no tocante à formação.

E se num destes ambientes em que se discute futebol as pessoas que estão sentadas à mesa não são jovens, não são dirigentes de clubes emergentes, nem são acadêmicos, e sim figuras representativas no mercado, como: o treinador da seleção brasileira principal, Mano Menezes, o (ex) diretor executivo de futebol do Vasco da Gama-RJ, Rodrigo Caetano, o coordenador das categorias de base do Internacional-RS, Jorge Macedo e o gerente de futebol do Fluminense-RJ, Marcelo Teixeira. Será que o tema ganha relevância? Não tenho dúvidas!

Durante cerca de uma hora, com transmissão em canal fechado num horário não tão acessível para os profissionais do esporte, estes quatro profissionais do futebol deram uma aula (com um valor simbólico infinitamente superior àquelas minhas colunas que valorizam a formação dos atletas brasileiros) sobre quais devem ser os caminhos escolhidos pelos gestores do futebol brasileiro para que a supremacia estabelecida no passado seja mantida no futuro.

Para Mano Menezes, a infraestrutura dos grandes clubes do país é muito boa, no entanto, a filosofia vigente é extremamente prejudicial, pois valoriza o vencer em detrimento do formar.

Quando questionado sobre como modificar a filosofia, Mano disse que não é responsabilidade do treinador da equipe profissional alterá-la ou estabelecê-la. É função da empresa, que deve transmiti-la ao seu corpo técnico, da base ao profissional, mantendo somente os profissionais que se adequam, que são competentes, e não os que são “boa gente”.

O treinador da seleção disse ainda que as diferentes categorias do clube (inclusive a profissional) precisam ampliar as ligações para não criar abismos nas transições e perdas de jogadores em potencial, que gostaria de ver os jogadores brasileiros com maior identidade aos clubes formadores (e não somente ao dinheiro, pressão dos agentes e da família), que o potencial de melhora é imenso e que junto à CBF ele (que já conseguiu mudanças significativas na base canarinho em 2010) lutará por um projeto que defina diretrizes para o futebol brasileiro de formação.

Rodrigo Caetano, em suas primeiras palavras, foi enfático ao mencionar a desvalorização dos profissionais da base e a ausência de um plano de carreira para os mesmos. Outra opinião foi a de que numa equipe profissional deveria haver um número mínimo de atletas oriundo das categorias de base do clube. Corroborando com Mano, o (ex) diretor vascaíno disse que aplicar e cobrar a flosofia, são funções de quem coordena o depto. de futebol e finalizou, afirmando que um possível legado da melhoria no modelo de formação brasileiro seria uma maior permanência de grandes atletas nos clubes formadores, como Dedé e Neymar, e por consequência um maior espetáculo.

Jorge Macedo apontou que a continuidade, ou melhor, a falta dela é um grande mal no futebol brasileiro que, pela necessidade do mercado de se antecipar a formação para 17 e 18 anos e pela dificuldade dos gestores brasileiros em administrar a pressa, perde muitos jogadores que não recebem o tempo de maturação adequado para comporem o elenco profissional. Uma saída do Inter-RS para este mal foi a criação da equipe B, sub-23.

Outro ponto interessante comentado pelo profissional da equipe gaúcha foi em relação ao excessivo assédio a atletas até 16 anos de idade (que não podem ter contrato profissional), a necessidade da blindagem desses atletas, a inevitável exposição, mas o receio em perdê-los.

Já Marcelo Teixeira iniciou mencionando que no Manchester United os salários para os treinadores das categorias de base são os mesmos independentemente da categoria com a qual trabalhe. Segundo Marcelo, uma das ferramentas necessárias para a evolução da formação brasileira é a criação de uma área de inteligência e detecção do talento que, na maioria das vezes, é feita por profissionais que buscam jogadores de acordo com o seu próprio “olhar” e não a partir de procedimentos estabelecidos pelo clube no qual o scouter é contratado/presta serviços.

De acordo com dados coletados por Marcelo, os atletas que foram negociados desde a criação do centro de formação do clube em Xerém, no fim da década de 90, deram maior retorno do que o custo operacional para manutenção do CT. Finalizando suas opiniões, Marcelo criticou a mais nova profissão, conhecida como “pai de atleta”, criticou também o assédio aos jogadores não profissionais (no último sul-americano sub-15, o Fluminense teve um jogador assediado para trocar de clube por R$ 200.000,00) e a importância dos campeonatos sub-23.

No fim da mesa, Mano pediu discussões mais profundas sobre o tema. Podemos esquecer o pedido, aceitar que o futebol brasileiro é assim mesmo, lamentar a saída do Rodrigo Caetano após divergências com os dirigentes do clube carioca e arquivar este assunto. Ou então, podemos encarar o problema (e que problema!), assumirmos que estamos distantes dos modelos de formação dos clubes europeus, “mostrarmos a cara” a dirigentes avessos à mudança para que daqui alguns anos (muitos ou poucos), possamos chegar à final do Mundial de Clubes da Fifa e, com convicção, afirmarmos: somos favoritos! Só de material humano, poderíamos ter um Barça por estado brasileiro.

Semana que vem, o “jogo jogado” com a cabeça e o case Figueirense.

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br
 

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