Existe no futebol, uma pergunta típica, mais comum na fala dos dirigentes (também presente em outros escalões) e que representa um dos nortes de decisão para muitas coisas dentro do futebol profissional.
É só o departamento de fisiologia apresentar algum novo projeto, o de nutrição um cardápio mais apropriado ou a comissão técnica um treinamento diferente, que lá vem a pergunta: “isso marca gol?”.
Parece piada, mas por incrível que pareça, tanto a comunidade científica especializada quanto os profissionais diretamente ligados ao futebol com propostas inovadoras ou diferenciadas de trabalho, têm esbarrado em grande parte das vezes, com suas pesquisas ou projetos, na essência dessa questão.
Então, vamos polemizar o assunto.
As equipes de futebol profissional têm, ou pelo menos deveriam ter como objetivo máximo, vencer jogos: a vitória nos jogos leva a equipe à melhores colocações nos campeonatos que disputa à que direciona de certo modo os olhares da mídia em geral, para ela à que leva ao aumento do prestígio dos seus jogadores à e que por vários motivos pode levar à conquistas profissionais e à maiores ganhos financeiros.
Se isso tudo é verdade (ou um fractal dela), como não admitir que estariam certas as pessoas do alto escalão do futebol quando ao aprovar ou desaprovar determinada conduta, procedimento ou ação, estejam levando em conta a pergunta máxima: “isso marca gol?”.
Em outras palavras, quero dizer que em sua profunda ignorância (em muitas e muitas vezes), os dirigentes (ou similares) têm total razão!
Claro, a maior parte deles não deve entender nada sobre a vasta complexidade das dimensões constituintes do jogo de futebol (física-tática-técnica-mental-etc. e tal) e muito menos a importância da compreensão do “todo” para saber porque equipes ganham e porque equipes perdem. Ou seja, não têm a menor idéia do porque das coisas, mas intimamente sabem que algo só é bom, se dentro das regras do jogo e da boa conduta puder “marcar gol”.
Da mesma forma, e por outro lado, profissionais especializados e cientistas em geral buscando melhorar (ou acreditando estarem buscando) o “todo” e potencializar chances de vitória, acabam se distanciando cada vez mais dos problemas que estão realmente interferindo na prática de jogadores, comissões técnicas, treinos e jogos – e portanto apresentam propostas que realmente não vão marcar gols!
A ciência só faz sentido se puder contribuir para a prática real. E se é o futebol “a coisa mais importante dentre as coisas não importantes” do mundo real, por que não levar a ele elementos que possam realmente promover benefícios que potencializem sua evolução?
Na perspectiva das “teorias da complexidade”, fazer gols e vencer jogos representa resolver problemas em todas as dimensões do jogo, ao mesmo tempo e o tempo todo, considerando a totalidade do jogo e dos seus elementos constituintes; integralmente.
Então, se por um lado a comunidade científica especializada tem razão e direito em reclamar das dificuldades que lhe são impostas para abrir as portas do mundo do futebol (e alguns outros esportes também!), por outro em seu “profundo conhecimento” acaba muitas vezes por dar respostas a problemas que não são reais, terminando por investigar um futebol que não existe.
Assim elementos que poderiam se complementar acabam por criar uma guerra entre àqueles que mandam e não promovem melhoras por falta de conhecimento e àqueles que querem melhorar mas não promovem melhoras por não saberem realmente qual é o problema. Entre as armas dessa guerra, vence aquela única que faz todo o sentido: “isso marca gol?”.
Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br