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Faz alguns anos – mais precisamente em 2001 – publiquei um capítulo na obra “Fútbol: cuadernos tácticos”, chamado “Fútbol: un juego de transiciones”. Nele, abordei e discuti as diversas expressões das fases de transição do jogo de futebol.

Como diz um escritor norte-americano, que agora me escapa da memória, precisamos criar o hábito de sempre resgatar e ler as coisas que escrevemos. Pois bem, esse capítulo que escrevi (sobre as transições), ficou escondido na minha memória, até que recentemente foi resgatado, graças a um dos ouvintes (que havia lido meu texto), presente em uma palestra que ministrei sobre questões táticas do jogo de futebol.

Resolvi hoje, então, escrever um pouco sobre as transições, resgatando algumas ideias que foram apresentadas em 2001, compartilhando-as com os leitores deste texto.

Estamos acostumados com a ideia de que as transições acontecem entre as fases de ataque e defesa, ou defesa e ataque no jogo de futebol. Isto está certo, e não é novidade. Gostaria de chamar a atenção então, sobre outras expressões da transição, presentes ainda dentro da mesma fase de jogo (de ataque ou de defesa), antes da comumente turbulenta migração do estar a atacar para o estar a defender, ou vice-versa.

Em outras palavras, vou tratar das transições presentes dentro de uma mesma fase de jogo de uma equipe (e não das transições entre as fases do jogo). Tratarei daquelas transições, as quais chamei, em 2001, (e creio, ainda ser um nome adequado) transições de referências.

Basicamente, ao atacar ou defender, com base em Claude Bayer, uma equipe pode manifestar ao menos um dos seguintes princípios operacionais: a) estando a atacar – manutenção da posse da bola, progressão ao campo de ataque e ao alvo, finalização da jogada; e b) estando a defender – impedimento da progressão adversária, recuperação da posse da bola e proteção do alvo.

Esses princípios servem como referências coletivas para a ação da equipe. Essas referências podem mudar de acordo com as circunstâncias, e essas (as circunstâncias) podem estar associadas, por exemplo, a região do campo de jogo, comportamento do adversário, localização da bola ou ação de determinado jogador (dentre outros).

Da mesma forma que esses princípios servem como referências, existem também, outras tantas, que podem representar nortes estratégicos e/ou de ocupação do espaço de jogo para jogadores e equipes.

A ação coletiva e individual, de equipe e jogadores no jogo a cada circunstância, é definida pela condensação (e coordenação) de referências operacionais, de ocupação do espaço e estratégicas; e ainda que sejam, por questões puramente didáticas, separadas, na prática, se manifestam integralmente, de maneira associada.

A alteração circunstancial, de predomínio de uma referência, para outra, é um momento de transição, que, normalmente é negligenciado na construção de treinos.

Para elucidar o que quero dizer, vou usar um exemplo bem pontual.

Imaginemos uma equipe (equipe “A”), que tenha como grande referência do seu sistema defensivo, a recuperação da posse da bola, na linha “1” (ou seja, bem próximo a sua meta de ataque), com pressing zonal em profundidade. Se em um jogo, por algum motivo, seu adversário conseguir avançar até a linha 3 (linha do meio-campo) sem perder a posse da bola, é necessário que ela (a equipe “A”) altere elementos da sua grande referência, que pode por exemplo, continuar sendo de recuperação da posse da bola, mas, agora, na linha “3”, com pressing zonal, porém, em largura.

Notemos que o fato da posição da bola sair das proximidades da linha “1”, em direção a linha “3”, faz com que a equipe “A” defina alterar a maneira com que realiza o pressing (que antes era em profundidade, e passa ser agora, em largura).

A dinâmica que liga essa alteração de referência, em função do posicionamento da bola, consiste em uma transição interna a fase de defesa da equipe. Isso quer dizer que, não basta que ela seja treinada para as circunstâncias em função do posicionamento da bola na linha “1”, e depois em função do posicionamento na linha “3”, porque há um elo que liga, cria interdependência e inter-relação entre tais circunstâncias (a transição de referências), e isso não pode ser desprezado.

Da mesma forma, se uma equipe “B” tiver as mesmas referências da equipe “A” quando a bola estiver nas proximidades da linha “1”, mas nas proximidades da linha “3”, ao invés de agir para a recuperação da posse da bola, agir para impedir a progressão do adversário e da bola ao campo de ataque (mesmo mantendo o pressing zonal semelhante ao da equipe “A”), terá dinâmicas de transição bem diferentes, criando interdependências e inter-relações também distintas.

Essas transições de referências são tão, ou mais “esquecidas” nos treinamentos, quanto as transições ataque-defesa e defesa-ataque.

Existem muitas coisas que podemos explorar sobre essas transições. Em breve trarei “expedições” mais aprofundadas sobre o tema. Por enquanto, espero ter estimulado a reflexão e discussão sobre ele, para que à frente possamos debater questões peculiares as transições de referências, de acordo com seu nível de complexidade geral, operacional, estrutural e/ou estratégico.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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