Há algumas semanas, foi proposta, aos profissionais das categorias de base, a iniciativa sobre o desenvolvimento do currículo de formação do atleta de futebol. Este material deve ser elaborado com o devido alinhamento à cultura e objetivos do clube e sua aplicação é pré-requisito para o desenvolvimento de um bom processo de formação diante das tendências do mercado.
Dias após a publicação da coluna, uma entrevista com Thiago Corrêa Duarte foi postada na Universidade do Futebol e, dentre os temas discutidos, estava o D.O.M (Documento Orientador Metodológico). Thiago, coordenador técnico das categorias de base do Grêmio, é o responsável pela elaboração do material que tem como objetivo formar atletas de futebol, a partir da filosofia e cultura do clube, caracterizando o “Jogar ao Grêmio”.
Um grande clube do futebol brasileiro já é um ótimo exemplo por conter profissionais que estão se preparando e agindo diante do novo cenário futebolístico que se desenha. Os concorrentes (outros grandes clubes, times de menor expressão com tradição em categorias de base e clubes formadores emergentes) que não se adequarem a esta nova realidade correm sérios riscos de realizarem investimentos sem retorno e sustentabilidade no médio e longo prazo.
Ciente deste cenário e respeitando as limitações estruturais, financeiras, de recursos humanos, outrora comentados, a diretoria do Paulínia FC selecionou cinco profissionais, no ano de 2009, para o desenvolvimento do material denominado “Metodologia Futebol Arte”. Nele deveriam constar os conteúdos e temas relativos ao processo de formação do sub-11 ao sub-20.
Além de apontar os oito grandes conteúdos que compreendem o processo de formação, o objetivo da coluna desta semana é padronizar algumas linguagens que serão utilizadas em colunas futuras.
Antes de apresentá-los, porém, é necessária a divulgação do nome dos outros quatro profissionais que contribuíram na elaboração do referido material: Anderson Gôngora, Cristian Lizana, Erick Martins e Lucas Leonardo. Este último coordenou a produção, porém, atualmente não trabalha mais com futebol.
O tempo de início e conclusão do currículo foi de seis meses, sendo feitas três a quatro reuniões semanais de duas horas cada, com saudáveis (mas nem sempre amistosas) discussões baseadas em diversos autores que discorrem sobre o ensino dos JDC, complexidade, teoria dos jogos, além das opiniões e experiências dos integrantes do grupo e, eventualmente, dos demais profissionais do clube.
O primeiro conteúdo é a Lógica do Jogo, que norteia todo o processo de formação e que se subdivide nos seguintes temas:
Abordar a Lógica do Jogo Formal;
Aplicar a Lógica do Jogo Formal.
O segundo conteúdo compreende as Competências Essenciais do Jogo. Tais competências se manifestam em quaisquer jogos coletivos e quanto melhor a sua manifestação, melhor será o nível de jogo realizado. Subdivide-se em:
Relação com a bola;
Estruturação do espaço;
Comunicação na ação (Leitura de Jogo).
As Referências do Jogo de Futebol fazem parte do terceiro conteúdo. Dominar as referências, de forma circunscrita ao jogo, contribui para a orientação de novas formas de cumprir a Lógica do Jogo. Este conteúdo contém como temas:
Plataformas de Jogo;
Referências Operacionais;
Referências Espaciais;
Referências Atitudinais.
O quarto conteúdo é composto pelo nível Estratégico-Tático do Jogo. A componente estratégica oferece aplicações pré-definidas pelo modelo de jogo e a componente tática, pelas emergências (problemas) do jogo e apresentam os temas abaixo:
Estratégias ofensivas;
Estratégias defensivas;
Reposições de bola;
Bolas Paradas;
Meios Táticos.
O conteúdo seguinte é relativo às Funções no Jogo e apresenta como temas:
Jogar em uma Posição;
Cumprir outras Regras de Ação;
Jogar em mais de uma Posição.
O sexto conteúdo denomina-se Relação com Companheiros e é desenvolvido em função da capacidade de jogo dos praticantes e tem como subdivisão os seguintes temas:
Jogar em pequenos grupos (até 3 jogadores);
Jogar em médios grupos (de 4 a 7 jogadores);
Jogar em grandes grupos (mais de 8 jogadores).
Fisiologia e Saúde fazem parte do penúltimo conteúdo, que inclui:
Conhecimento dos grupos musculares;
Consciência corporal;
Vivência em academia;
Exercícios profiláticos.
O oitavo conteúdo é denominado Apoio Didático e é composto pelas atividades complementares extra-campo, de caráter técnico, para contribuição no processo de ensino-aprendizagem. Apresenta como temas:
Palestras do Modelo de Jogo;
Palestras de jogos profissionais;
Palestras de jogos da própria equipe;
Palestras de jogos do adversário.
Para todos estes temas (em outras colunas virão os sub-temas), estabeleceram-se “pesos” subjetivos, de 0 a 5, que foram distribuídos, para aplicação no processo de treinamento, entre todas as categorias do clube. Quanto maior o “peso”, maior a importância da aprendizagem do tema. Para alguns temas, a letra “X” substitui a presença do número indicando que determinado conteúdo já foi aprendido pela categoria. O número zero indica que determinado tema não deverá ser abordado.
Ainda sobre a interpretação do currículo, outro ponto é de fundamental importância e se refere às dimensões do aprendizado. Para isto, os termos “conhecer, vivenciar e aprender” correspondem aos primeiros contatos com cada tema e a abordagem do treinador deverá ser constante para assimilação dos objetivos propostos nas atividades. Realizado o contato inicial, a “aplicação” e “aperfeiçoamento” deverão ser observados para excelência e acomodação do aprendizado, inclusive quando determinado tema não for o objetivo específico da atividade. E, por último, “dominar” o tema com a maior competência possível na sua execução.
Para finalizar, é válido salientar que o currículo do Paulínia FC não é um documento fechado, pronto e que não receberá alterações. É apenas um material de desenvolvimento de um processo de formação que, com exceção do sétimo conteúdo, Fisiologia e Saúde, utiliza o “jogo” como método de ensino. Sua aplicabilidade (lembrando que tem somente um ano e meio de existência) está sendo observada para que adequações sejam feitas e possíveis equívocos, sanados. Outra consideração refere-se às limitações de toda a gestão que refletem com maior ou menor magnitude no trabalho de campo.
No entanto, não é possível aguardar o “mundo ideal” para serem dados os primeiros passos de uma longa e trabalhosa caminhada. Caminhada, em que muitas questões, acertos e erros serão discutidos com profissionais do futebol dispostos a compartilhar conhecimento.
Até a próxima semana!
Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br
Leia mais:
O currículo de formação do atleta de futebol – parte I