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Milton Mendes é um técnico de futebol. E como todo (todo?) técnico de futebol, Milton Mendes entende que observar jogos é parte de seu trabalho. No entanto, ele ofereceu uma aula involuntária de comunicação no último domingo (07), quando decidiu ver in loco o duelo entre Flamengo e Fluminense, que decidiram o Estadual do Rio de Janeiro. Tudo porque o comandante do Vasco escolheu acomodar-se em um setor popular do Maracanã – e no meio da torcida rubro-negra.

Como praticamente tudo num mundo tão polarizado por redes sociais e convicções tão plenas quanto rasas, a presença do treinador vascaíno num setor dominado por flamenguistas dividiu opiniões. Muitos torcedores optaram pela pilhéria – sobretudo os que gravaram vídeos com Milton Mendes, visivelmente constrangido. Outros preferiram usar o fato como provocação – como se isso indicasse alguma subserviência ou preferência do técnico em relação à equipe rubro-negra. No entanto, foi possível dividir em dois outros grupos as opiniões mais frequentes em redes sociais: os que condenaram o treinador pela “exposição desnecessária” e os que defenderam alguém que “só estava ali trabalhando”.

É possível extrair várias lições desse episódio. A começar pelo controle do conteúdo: Milton, aposto, não fazia ideia da proporção que sua decisão tomaria. Ao escolher um setor popular e ao decidir sentar-se em meio a flamenguistas, não considerou todo o contexto e se esqueceu que nem todas as pessoas tiram as mesmas conclusões de uma cena.

O controle da mensagem, teóricos da comunicação ensinam, não está no emissário. Na cabeça de Milton, ver um jogo pode ser apenas parte do trabalho. A presença dele no Maracanã, portanto, seria uma ação natural. As reações de muitos vascaínos mostram, contudo, que essa associação não era assim tão clara. Sem qualquer comparação de conteúdo, mas de lógica: é por isso que um branco não pode determinar o que é racismo ou um homem heterossexual não tem como estabelecer limites de machismo ou preconceito.

Outra questão incutida na ida de Milton Mendes ao Maracanã é a importância do contexto. Ainda que todas as pessoas entendessem que ver jogos é parte do trabalho dele e que o treinador estava ali apenas para observar rivais, houve um erro de avaliação do profissional ao ignorar a rivalidade do Vasco com o Flamengo. Todo o episódio seria mais palatável se ele tivesse considerado isso, pensasse no quanto a separação de torcidas em estádios tem sido uma discussão recorrente no Brasil e optasse por ver a decisão em um camarote ou em uma cabine.

Também há uma discussão pertinente sobre forma: ok, Milton Mendes queria observar rivais; ok, há uma série de benefícios de fazer isso in loco, com toda a perspectiva. No entanto, essa era a única maneira de assistir ao Fla x Flu? O treinador não teria evitado desgaste se mandasse um emissário ou solicitasse uma gravação com diferentes ângulos da partida?

Por fim, aquela cena suscita uma dúvida sobre a influência do meio. Depois da repercussão, Milton Mendes vai acompanhar outros jogos em torcidas rivais? E a diretoria do Vasco, como vai se comportar diante da pressão de alguns torcedores? Aliás, e esses torcedores? Vão avaliar o trabalho de um profissional apenas por uma ação bem-intencionada, mas mal executada?

Pululam exemplos no futebol brasileiro de quanto o entorno influencia em casos assim. De longe, sou capaz de apostar que Milton não repetirá o comportamento. Além disso, angariou uma animosidade com torcedores e se colocou numa posição menos confortável entre seus superiores. Pensando em uma profissão tão instável quanto a de treinador de futebol no Brasil, todos esses elementos contam.

Milton Mendes só queria ver um jogo de futebol e observar rivais. A ideia era clara, justa e adequada às necessidades da profissão. Na comunicação, contudo, o teor da mensagem nem sempre é tudo.

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