#tamojuntoNeymar era a inscrição na parte superior das costas de todos os jogadores do Santos no último domingo (04), no Pacaembu, em clássico contra o Corinthians. Quatro anos mais tarde, a despeito da desconstrução anímica que a seleção brasileira vivenciou na Copa do Mundo após a lesão do atacante, sua condição física voltou a movimentar o noticiário e interferir no cotidiano de outros atletas. Ele pode ter evoluído em campo ou fora das quatro linhas, mas o “espetáculo Neymar” segue sendo parcela fundamental do que é o personagem Neymar.
Em 2014, o camisa 10 da seleção brasileira teve um problema nas costas após disputa de bola com um jogador da Colômbia em partida das quartas de final. Perdeu as duas últimas partidas do país na Copa, e sua ausência foi uma das histórias mais relevantes para a derrota dos anfitriões por 7 a 1 para a Alemanha. Os dias que precederam aquele acachapante também foram dias de “espetáculo Neymar”: cobertura ostensiva de tudo que acontecia com o jogador, dos deslocamentos aos procedimentos médicos; discussão frequente sobre os efeitos técnicos e emocionais que sua ausência poderia acarretar; debate intenso sobre os possíveis substitutos e a responsabilidade que esses atletas teriam; criação da hashtag #ForçaNeymar, que chegou a ter mais de uma foto publicada por segundo na rede social Instagram. Durante alguns dias, a condição física do atacante assumiu grau de protagonismo que contribuiu sobremaneira para fomentar o mito em torno dele, mas que também aumentou consideravelmente a pressão sobre o entorno.
Há muitos elementos paralelos entre as duas histórias. Assim como em 2014, Neymar sofreu uma lesão antes de um jogo extremamente decisivo. Após derrota por 3 a 1 no primeiro duelo do mata-mata da Liga dos Campeões da Uefa, o Paris Saint-Germain jogará a temporada contra o Real Madrid no dia 6 de março, em Paris. Contratação mais cara da história do futebol, o camisa 10 também era a grande aposta dos franceses para uma reação no confronto – um ano antes, ele já havia dado sinais de que poderia liderar reações assim ao comandar uma vitória do Barcelona por 6 a 1 sobre o próprio PSG na mesma competição.
Além do impacto técnico e da evidente carga emocional que um protagonista carrega em momentos assim, as duas histórias têm em paralelo a espetacularização do pós-lesão de Neymar. Em 2014, jornalistas, torcedores, curiosos e o séquito mantido pelo atacante participaram de cada momento entre a joelhada que ele levou nas costas e o 7 a 1 que o Brasil levou no Mineirão. A comoção tem muito a ver com a relevância dada ao fato (e vice-versa).
Um exemplo disso é uma entrevista recente do zagueiro Kimpembe, que tem alternado jogos como titular e reserva no PSG. Depois de uma vitória por 3 a 0 sobre o Olympique de Marselha em jogo da Copa da França, o defensor ficou irritado com a enorme quantidade de perguntas sobre Neymar: “Mais uma vez? Neymar aqui, Neymar ali. Já não tenho mais o que falar. Se não pode atuar, não pode. O treinador vai escalar outro”.
Existe um circo em torno da lesão de Neymar, mas é pertinente questionar: a notícia é reflexo do interesse ou o interesse é reflexo da ostensiva aparição do conteúdo? O dilema Tostines desse caso é uma das chaves para entender o mercado de celebridades no mundo atual. Quando tentamos humanizar as mensagens e dar mais atenção aos personagens, criamos uma cultura de consumo de informação que superestima dados pessoais e que muitas vezes ultrapassa limites do que é privado.
A cobertura em torno da lesão de Neymar também alicerça uma parte fundamental da personalidade de Neymar. Esse interesse e a supervalorização de tudo que acontece com o jogador são facetas de um ambiente totalmente descolado da realidade. É até possível que o contexto não contamine o protagonista, mas isso demandaria um esforço e um desgaste que Neymar não parece disposto a oferecer.
Você pode até estar espantado com o fato de a operação de Neymar ter recebido mais atenção do que a Guerra da Síria, que começou há quase uma década e nunca encontrou enorme espaço no noticiário brasileiro. Discutir a pauta de noticiários, porém, é enfrentar apenas parte do problema. Neymar é um exemplo extremamente bem acabado de uma geração mimada, que tem problemas para desenvolver empatia ou pensar no outro.
O problema de Neymar nunca foi o espaço que ele ocupa; o que assusta é como esse espaço é ocupado.