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O que já se sabe é que estamos vivendo um ano atípico, onde todo o mundo se volta para a sobrevivência, o comprometimento momentâneo, e aos detalhes que por diversas vezes passaram por ali despercebidos, passamos a valorizar ainda mais outro. E, após oito meses, tivemos que nos reinventar e readequar nossos costumes e hábitos.

Assim também acontece no meio do futebol. Os clubes brasileiros, em sua grande maioria, dependem de programas como o sócio-torcedor e da receita das bilheterias dos jogos como pilares sólidos de suas finanças. Em um estudo realizado pela empresa de consultoria Ernst & Young no ano de 2019, concluiu-se que 16% de toda receita que circula no futebol tem como origem uma dessas duas fontes.

Especificamente no ano de 2019, os clubes auferiram cerca de 20% de receita com bilheteria e programas exclusivos de sócio maiores que o ano de 2018, configurando uma crescente considerável ao ano anterior.

E assim, trilhava o cenário positivo e ascendente para o ano de 2020, até que o mundo virou de pernas para o ar. O futebol foi suspenso por um período considerável, e os clubes passaram por perdas financeiras significativas, praticamente desconsiderando as receitas com bilheteria. O cenário de evolução da pandemia promete jogos sem públicos ou com capacidade reduzida pelo menos até o final da temporada, e a consequência direta é a tendência de inadimplência ou cancelamento dos programas de sócios torcedores, afetando também os cofres das agremiações.

Existem, porém, algumas maneiras de se atenuar o impacto e a queda das receitas dos programas de sócio-torcedor com ações que deveriam ser implementadas antes mesmo da crise, mas que ainda estão em tempo de serem retomadas.

Primeira etapa, os clubes precisam entender o impacto que a diminuição das receitas com programas de sócio e bilheteria irá gerar em seus caixas – lembrando que os clubes praticamente não terão receitas com bilheteria pelo menos durante o ano de 2020. A segunda etapa consiste em conhecer os mecanismos e as vantagens que cada plano oferece ao seu torcedor para que ele continue adimplente, visto que a crise também afetou financeiramente os torcedores e, além disso, entender o que o plano poderá oferecer àqueles que ainda não são afiliados e contratem o plano em meio a pandemia.

Em outras palavras, os planos de sócios-torcedores que quiserem ter sucesso e cumprirem suas funções de manter um fluxo de caixa precisam tratar o jogo em si como mais um “detalhe”.

Hoje no Brasil, alguns clubes oferecem planos com vantagens exclusivas e até chance de se candidatar à presidência do clube. Porém, em sua grande maioria, os clubes oferecem apenas o acesso às partidas, o que provavelmente não ocorrerá em um futuro próximo, uma vez que no atual cenário não se sabe ao certo quando os portões estarão inteiramente abertos para o espetáculo.

Para a fidelização do torcedor deve ser oferecido muito mais do que se tem visto em sua grande maioria dos clubes, podemos citar alguns exemplos, como programas exclusivos de vantagens, acumulo de pontos, conteúdo exclusivo para sócios, experiencias e viagens futuras, descontos e anistias, dentre outros.

O programa “Avanti” do Palmeiras concede aos seus torcedores até 20% de desconto em redes de grandes drogarias e em mensalidades de Universidades. Já o programa de sócio do Internacional focou em descontos em serviços bastante conhecidos de streaming de músicas, filmes e séries, mas esses são exemplos de um primeiro passo a ser dado. Um segundo passo, mais ousado, costuma ser bem mais efetivo: permitir ao sócio-torcedor o direito de participar da vida política do clube, concedendo o direito ao voto e até mesmo de ser votado nas eleições para o conselho deliberativo e/ou presidência. Estudos afirmam que os planos que permitem a participação gerencial do clube tendem a ter quedas menos acentuadas.

Este é o exemplo seguido pelo Bahia: no primeiro ano de adesão ao programa de sócio você adquire o direito de voto como associado e no segundo ano poderá se candidatar ao conselho ou até mesmo a presidência do clube. Com essa e outras ações, o clube do nordeste vem se mantendo com uma média de 30 mil sócios adimplentes por mês, a despeito da pandemia.

Por outro lado, os sulistas, que têm um dos planos mais antigos e robustos do mercado, veem inclusive um certo crescimento na sua base, que gira em torno de 120 mil associados, mesmo na pandemia. É evidente que não é apenas o direito de participar da vida do clube que vem garantindo a consistência dos dois programas. Nos dois casos, há inúmeros ações fazendo a sustentação. Mas, certamente, perder a chance de ter “voz” na administração pesa na hora de se abandonar o pagamento do “carnê” no final do mês.

Avaliando os discursos e mecanismos dos clubes, torna-se cada vez mais claro que manter os benefícios do programa limitados apenas a entrada nos jogos dá pouca consistência a algo que se mostra cada vez mais vital na sobrevivência das agremiações.

Mas também é fácil concluir que são os jogos que fazem com que o torcedor decida desembolsar uma quantia que muitas vezes lhe faz falta para se associar. Por mais que vantagens, experiências, voto e voz tenham apelo, se a bola não rolar, não haverá estratégia milagrosa para assegurar a manutenção dos caixas por muito tempo.

O que não quer dizer que a “lição de casa” não precise ser feita, e que as medidas de segurança não devam ser observadas.

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