A construção de programas multidisciplinares na formação – O papel da preparação física

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Crédito imagem: FC Bayern Campus

Introdução

Em 2016 e 2017 participei como preparador físico de uma equipe Sub-17, com atletas de muita qualidade técnica, com grande conhecimento tático e com muitas qualidades físicas. Os atletas de geração 1999, 2000 e 2001 tiveram contato com o treino específico da modalidade com qualidade e baseados em um sistema da instituição, criado por uma equipe de profissionais envolvendo nutricionistas, médicos, fisioterapeutas, preparadores físicos, treinadores, gestores e analistas de desempenho. Curiosamente, essa geração e as mais jovens que tiveram um contato mais prolongado com a metodologia de trabalho desenvolvida até então deram frutos financeiros e desportivos para o clube.

Não menos importante, gostaria de abordar a necessidade do desenvolvimento das qualidades de força ao longo dos anos de formação e começo da transição para a profissionalização do atleta de futebol. As categorias mais jovens que contemplam até a idade dos 17 anos se caracterizam por uma grande heterogeneidade a nível maturacional, idade de treinamento e competência de movimento, características essas que reforçam a importância dos clubes contarem com comissões técnicas compostas por profissionais qualificados que saibam aproveitar as supostas janelas de treinamento e introduzir um maior contexto de “treinamento de performance atlética” para além da pedagogia e treinamento do e através do jogo.

O treinamento físico como suporte a modalidade e desenvolvimento do atleta de futebol
Em um extensa revisão recente de Clemente et al (2021), o treino através de jogos reduzidos se mostra importante para muitas valências táticas, técnicas e psicológicas, no entanto, não consegue desenvolver todas as competências necessárias para um atleta de futebol, sobretudo naquelas que estão mais relacionadas as capacidades físicas: altura de salto, velocidade linear e mudança de direção. Isso nos indica que para além de pensarmos no desenvolvimento do jogador de futebol, é preciso pensar no atleta, com treino individualizado de qualidades de força, resistência e competência de movimento.

O infográfico abaixo mostra três momentos de avaliação ao longo de uma época competitiva, com atletas de Sub-17 em métricas relacionadas a composição corporal: Massa Gorda, Massa Magra, área muscular do braço e da coxa. Apesar dessas medidas não se relacionarem diretamente as suas capacidades físicas (i.e. uma maior área muscular da coxa não necessariamente implica uma maior capacidade de salto ou maiores níveis de força) (Meyers et al 2015), esses valores demonstram a necessidade de se desenvolver os atletas em idades sensíveis, com especial atenção aos estímulos de força e orientações nutricionais para suportar o aumento das cargas de treino, das exigências competitivas e as alterações funcionais que se conseguem ao longo do processo maturacional e que irão impulsionar o atleta para a carreira profissional de alto nível.

Figura 1 Gráficos de evolução da Composição Corporal ao longo da temporada em 3 momentos de avaliação. (Idade média nos momentos > A1 [fevereiro]: 16,5 anos A2 [junho]: 16,5 anos A3 [novembro]: 16,4 anos)

Quando recorremos a literatura científica, muitos estudos corroboram a relevância do processo de treino no estímulo dos atletas, unindo o útil (estímulos ideais para melhor aproveitar o processo maturacional) ao agradável (ganhos de performance e bases físicas e fisiológicas bem estabelecidas) (Lloyd et al, 2016).

“De forma geral, jogadores jovens de futebol apresentam valores acima da média para altura, peso e massa muscular, assim como tendem a apresentar um estado mais avançado no status maturacional com o aumento da idade e envolvimento em programas de desenvolvimento de elite (Malina, 2003, 2011). Valores mais baixos a nível antropométrico e de performance funcional tendem a ser geralmente observados em jogadores de futebol que foram dispensados, abandonaram ou não foram selecionados para jogarem no próximo nível de programas de performance de elite. Comparados com aqueles que tiveram a oportunidade de serem promovidos a um nível mais alto.  (Figueiredo et al., 2009; Gil, Ruiz, Irazusta, Gil, & Irazusta, 2007). Resultados similares foram encontrados em jogadores de formação de elite que superaram a idade de formação e não tiveram contratos profissionais assinados (Le Gall, Carling, Williams,& Reilly, 2010).” (Carling et al. 2012)

Um programa de formação integral do atleta, deverá incluir aspectos que se encaixam na última fase do plano de desenvolvimento atlético de longo prazo, ou seja, educar o atleta para competir e para ser um atleta com longevidade, ou um atleta para a vida. Os nossos atletas, para além do treino específico da modalidade, recebiam 2-3 estímulos de treino de força (variando entre qualidades de força máxima, resistência de força e potência) de acordo com a caracterização do microciclo, sempre com respeito a progressão da competência de movimento, identificação de necessidades individualizadas, gestão da carga de treino (nomeadamente através do volume total) e principalmente as necessidades específicas da modalidade e as constrições do calendário competitivo. Veja na figura 2 um exemplo de construção de planificação semanal, nomeadamente no desenvolvimento das qualidades físicas.

Figura 2 Exemplo para a organização semanal (1 Jogo) dos conteúdos físicos de treinamento para atletas em formação (>U15-U20). *Sessões programas em períodos opostos ao treino de campo quando possível.

Em resumo quando consideramos programas de formação de atletas, busca-se que essa formação seja integral, não negando ao atleta a participação em treinos com diferentes orientações e diferentes direções de treinamento, não apenas com treinos específicos, mas também treinos mais generalistas integrados ao programa de treinamento de futebol, onde a preocupação passa por desenvolver e potencializar o atleta, não apenas o jogador de futebol.

Referências

Carling C, Le Gall F, Malina RM. Body size, skeletal maturity, and functional characteristics of elite academy soccer players on entry between 1992 and 2003. J Sports Sci. 2012;30(15):1683-93. doi: 10.1080/02640414.2011.637950. Epub 2012 Jan 31. PMID: 22292471.

Clemente FM, Afonso J, Sarmento H (2021) Small-sided games: An umbrella review of systematic reviews and meta-analyses. PLoS ONE 16(2): e0247067. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0247067

Meyers RW, Oliver JL, Hughes MG, Lloyd RS, Cronin JB. Influence of Age, Maturity, and Body Size on the Spatiotemporal Determinants of Maximal Sprint Speed in Boys. J Strength Cond Res. 2017 Apr;31(4):1009-1016. doi: 10.1519/JSC.0000000000001310. PMID: 26694506.

Lloyd RS, Radnor JM, De Ste Croix MB, Cronin JB, Oliver JL. Changes in Sprint and Jump Performances After Traditional, Plyometric, and Combined Resistance Training in Male Youth Pre- and Post-Peak Height Velocity. J Strength Cond Res. 2016 May;30(5):1239-47. doi: 10.1519/JSC.0000000000001216. PMID: 26422612.

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