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Crédito imagem: James Thorp/Twitter

Imagine ser um pesquisador na década de 1910 que decide fazer um estudo sobre a cultura de uma civilização isolada numa longínqua ilha no meio do Oceano Pacífico. A ideia inicial era passar algumas semanas por lá, mas acaba estourando a Primeira Guerra Mundial. Como não é nada seguro tentar retornar, você acaba ficando por três anos convivendo entre pessoas com um idioma, hábitos e crenças totalmente desconhecidos. Essa história daria um bom roteiro de filme, não é mesmo? Mas, esse relato é verídico e foi protagonizado pelo antropólogo polonês Bronislaw Malinowski, que, nessa circunstância, acabou desenvolvendo um método de pesquisa inovador e importantíssimo até os dias atuais: a etnografia. Podemos defini-la como uma intensiva coleta de dados em uma pesquisa por meio do contato intersubjetivo entre o pesquisador e seu objeto de pesquisa, que é um determinado grupo social. Nessa perspectiva, uma aldeia indígena, um grupo de punks, economistas portando trajes caros na Faria Lima ou um clube de futebol são exemplos de grupos sociais.

Os clubes de esportes coletivos como o futebol, vôlei e basquete são instituições bastante interessantes para analisarmos cientificamente sob o olhar etnográfico, principalmente em certos momentos que, mais cedo ou mais tarde, irão ocorrer: as crises.

Devido à extrema competividade intrínseca ao esporte, esses grupos tendem a ser bastante conflituosos, pois tanto os atletas quanto os profissionais das comissões técnicas e demais setores costumam ser muito pressionados por resultados. Além disso, a grande diversidade de idades, graus de instrução, interesses pessoais e costumes oriundos das diferentes regiões do Brasil e, até mesmo do exterior, podem tornar a comunicação e a compreensão mútua bastante prejudicada.

Portanto, um clube de esporte coletivo costuma ser um grande caldeirão com muitos ingredientes, no qual é possível que o produto seja um prato incrivelmente delicioso ou algo bastante desastroso ao paladar. Tudo vai depender da qualidade dos ingredientes, da moderação do fogo, da experiência e do “feeling” do cozinheiro. Mas, saindo da metáfora, quem é o profissional equivalente ao cozinheiro no esporte coletivo? Essa é uma pergunta de difícil resposta, porém, imagina-se que seja o técnico. Acontece que o técnico é um profissional sobrecarregado, pois seu foco está no desenvolvimento técnico e tático do seu time e, quase sempre é impossível monitorar as interações humanas que ali se sucedem e que costumam ser invisíveis aos olhos. Outros profissionais das comissões técnicas também possuem focos específicos e, como diz o ditado: “cachorro com mais de um dono morre de fome”.

Mesmo para os psicólogos dos clubes, essa área costuma ser de difícil acesso, pois como afirma o Doutor em Alto Rendimento Esportivo Miguel Ángel Fernández Macias “Equipe é algo diferente de seus jogadores, que deixam de ser partes isoladas para se assumirem numa totalidade com os demais e adquirem uma nova expressão.” Assim sendo, defendemos que a Antropologia se torne um ramo científico presente nos clubes esportivos, pois esses podem oferecer os melhores projetos, condições de trabalho, salários e estrutura física, porém, nada disso será o suficiente se o conflito permear os relacionamentos.

A qualidade das interações humanas costuma explicar a ascensão e a queda de casamentos, amizades, empresas e, até mesmo, civilizações inteiras: portanto, clubes esportivos não fogem a essa regra. Nesse cenário, investimentos financeiros vultuosos em estrutura de trabalho e contratação de atletas e outros profissionais podem ser desperdiçados pelo simples fato de a gestão humana não ser devidamente tratada. Nesse aspecto, a análise etnográfica pode ser um grande diferencial, pois ela não parte de fórmulas prontas e sim de estudos precisos e customizados à realidade do clube. Podemos afirmar até mesmo que a partir da etnografia é possível prever e se adiantar às crises, com o intuito de evitá-las. Como isso é possível? Pergunte a um antropólogo esportivo!

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