Crédito imagens: Arquivo João Paulo Medina
No último trimestre de 2021, a Universidade do Futebol teve a oportunidade de visitar na Espanha o F.C. Villanueva del Pardillo, município pertencente a comunidade autônoma de Madri. Nesta ocasião, João Paulo S. Medina, fundador da Universidade do Futebol, visitou o clube e pode conhecer suas instalações e funcionamento de sua Escola de Futebol. Foi recebido por seu Diretor Técnico, Miguel Garcia Zárate que apresentou alguns aspectos relevantes de seu projeto pedagógico, sintetizados na entrevista que se segue.
Observações: I. O conteúdo da entrevista conta com uma tradução livre do espanhol para o português. II. Existe uma versão desta matéria para os leitores e leitoras de língua espanhola. (Clique aqui para acessar).
Entrevista
1. Conte-nos um pouco sobre a história do FC Villanueva del Pardillo e sua importância para o desenvolvimento do futebol para as crianças e jovens desta região da comunidade de Madri.
Nesta temporada (2021) o clube F.C. Villanueva del Pardillo celebra 30 anos de existência. Sem sombra de dúvida, trata-se de um clube de referência na prática do futebol para a população desta cidade, atendendo a uma grande demanda de meninos e meninas que cada vez mais querem jogar em nosso clube. Sobre a sua história tenho que destacar o nome de Juan Manuel Angelina, um aficionado que faleceu recentemente e que deixou um vazio enorme. Em sua homenagem mudamos o nome do estádio este ano.
2. Quantos alunos tem a Escola de Futebol e quantas categorias existem hoje?
Atualmente contamos com mais de 300 alunos/jogadores inscritos, tendo a possibilidade de possuir mais de uma equipe em cada categoria. Temos desde a geração de 2015-2014 (pré-infantil) até 2005-2003 (juvenis) somando um total de 16 equipes da Escola propriamente dita e mais 4 equipes de aficionados, entre elas uma equipe feminina, a primeira da história do clube.
3. Qual é a estrutura da Escola de Futebol? Quantos funcionários tem?
No momento nos encontramos dentro de um processo de crescimento no qual estamos tentando profissionalizar mais os departamentos já existentes. Na Diretoria do clube temos como Presidenta a senhora Yolanda González e na Direção Esportiva dividimos o trabalho entre as equipes Seniors ou Aficionados e as equipes da Escola, como citado anteriormente.
A Diretoria Esportiva está formada por um diretor esportivo, Antonio Carcaño e um diretor da Escola, Miguel Garcia Zárate, com Pablo del Pino, como auxiliar da coordenação. Nosso principal objetivo é oferecer aos treinadores as melhores condições possíveis para poder fazer seu trabalho formativo com os alunos/jogadores. Além disso, contamos com um Departamento de Fisioterapia e Reabilitação, um Departamento de Captação e um Departamento de Goleiros.
4. E os professores? Quantos são? Que tipo de capacitação necessitam para trabalhar com os meninos e as meninas?
Em nossas equipes da Escola temos um total de 25 treinadores, contando com os treinadores auxiliares, que ajudam os jogadores a melhorarem seu desempenho e a disfrutarem o dia a dia dos treinamentos e jogos.
Na Espanha a titulação mínima exigida para poder treinar a qualquer equipe é o Nível 1 de Técnico Superior Esportivo (Título Acadêmico), sendo o Nível 3 o máximo ou indistintamente a UEFA C (Título Federativo) que equivale ao Nível 1, sendo a UEFA PRO o nível máximo.
5. Que tipo de metodologia vocês utilizam para o desenvolvimento das aulas ou treinamentos? Existe um caderno de princípios?
Pelo contexto que se encontra o clube hoje em dia, é muito difícil seguir-se uma metodologia de trabalho unificada, ou seja, uma mesma linha de trabalho para todos os níveis, uma vez que em nossa realidade temos equipes que exigem um grau maior de complexidade em seus treinamentos diários e equipes competindo em um nível de maior competitividade que envolve uma complexidade mais alta e equipes de iniciantes em que essa complexidade tem que evoluir em progressão e adaptado ao grau de maturidade dos jovens jogadores. Por isso, seguir uma metodologia de trabalho comum é muito complicado. Assim sendo, preferimos que nossos treinadores sejam encarregados de transmitirem um modelo de jogo adaptado às suas necessidades. Mas ao mesmo tempo damos muita importância a que os treinadores não centrem seu trabalho nos resultados. Muito pelo contrário, entendemos que quanto maior é a formação individual e coletiva, além de um bom processo de ensino-aprendizagem calcado no ensino de valores, o resultado é algo que virá acompanhado no futuro.
Por outro lado, temos um Caderno de Princípios e fichas de Treinamento que utilizamos, sobretudo, nas categorias de iniciação, onde os jovens têm que aprender o futebol desde zero e, por isso, nos apoiamos em um caderno de trabalho com princípios de jogo mais básicos para que a progressão seja a melhor possível, sempre apoiando-nos nos jogos e no prazer de todos os alunos/jogadores.
6. Como vocês administram, de forma geral, o grande interesse competitivo, tanto dos alunos/jogadores, quanto dos seus pais, com a necessidade de que a criançada simplesmente desfrute o prazer de jogar? Este aspecto é tratado de maneira distinta com o passar dos anos? Qual é a filosofia da escola sobre este assunto?
Eu diria que, seguramente, este é um dos temas mais difíceis para se administrar. Temos que aprender a conviver com a derrota; no futebol se perde muito mais vezes do que se ganha e por isso é muito importante ensinar os jovens jogadores a canalizar o interesse competitivo, despertando neles o gosto pelo ato de jogar, por aprender e conhecer mais sobre o esporte que praticam. E isso só se pode conseguir com bons formadores, ou seja, educadores além de treinadores. O treinador de futebol de base tem que ser antes que tudo, um bom formador e despertar nos jovens o prazer de desfrutar o jogo e vontade de aprender antes de ganhar. Assim que quanto mais jovens sejam, mais tentamos desviar o trabalho competitivo e centralizarmos no formativo, fazendo-os perceber que se a equipe tem uma boa base de conceitos e que estão bem trabalhados, sendo uma equipe unida e que desfrutem o dia a dia de convivência, os êxitos chegarão mais cedo e serão mais duradouros que se focarmos nosso trabalho em ganhar a curto prazo. Há que se entender a formação como um processo de longo prazo, onde os únicos vencedores serão os garotos e garotas que praticam o esporte que mais gostam.
7. Como o clube se mantém econômica e financeiramente?
Depois de atravessarmos uma pandemia, bem como uma série de dificuldades econômicas, a principal fonte de receitas do clube é a Escola de Futebol. Por outro lado, seria muito importante a chegada de patrocinadores que pudessem dar um pequeno impulso e desta maneira podermos melhorar as condições gerais para nossos jogadores e alunos.
8. Em sua opinião o que caracteriza uma boa Escola de Futebol?
Para mim – como diretor esportivo – o mais importante e que pode se caracterizar como um fator diferencial em relação a outras escolas, é o alto nível de seus formadores/treinadores. Neste sentido, as equipes são o reflexo de seus treinadores. Se eles têm o foco de trabalho na boa formação isto pode se constituir em um fator que irá fazer com que a Escola de Futebol tenha uma identidade própria e, consequentemente, suas equipes se diferenciam das demais.
9. Considerando os aspectos pedagógicos, qual é a questão mais difícil de se administrar com os alunos e os pais ao mesmo tempo?
O aspecto mais difícil de lidar, sem sombra de dúvidas, é a hora de relacionar a lista dos jogadores escalados. Infelizmente, não se pode escalar 30 crianças para jogar em uma mesma equipe de futebol. O fato de o treinador ter que comunicar aos demais jogadores que eles estão fora da lista é a coisa mais difícil para se fazer no futebol de base. Sempre tomamos essas decisões em função do que acreditamos que é o melhor para cada um, mas nem todos os pais e garotos e garotas aceitam este tipo de decisão.
10. Hoje em dia, o que se espera de um jogador de futebol de alto nível é que seja inteligente, seja capaz de tomar decisões individuais e coletivas, seja criativo, valente, que não tenha medo de correr riscos e que acima de tudo se divirta ou desfrute com suas práticas. O que fazer para garantir um tipo de ambiente que estimule estas complexas competências no treinamento e, sobretudo, nos jogos?
Creio que você não podia resumir melhor aquilo que se espera de um futebolista de alto nível. Sem entrar nos aspectos mais técnicos o que, de verdade, diferencia um jogador de outro é essa criatividade, sua capacidade para tomar decisões, sua valentia e personalidade dentro e fora do campo. Alguns desses aspectos são, as vezes, difíceis de se trabalhar devido ao tempo disponível de treinamento e os recursos que temos no clube, mas com conversas individuais ou coletivas, onde o treinador pode trabalhar alguns aspectos mentais e motivacionais, podem ser um fator importante de potencialização do rendimento e que sem dúvida ajuda os jovens. Por isso, acredito que o bom treinador não é aquele que só os ensina a marcar gols pela equipe, mas também trabalha os aspectos mentais, táticos, técnicos, físicos… Hoje em dia há que ser muito completo para que o jogador tenha um bom processo de formação e que ajude em sua melhora de rendimento.
Respostas em vídeo:
Pergunta 1 – Como é liderar jovens que hoje em dia têm muitos outros interesses além do futebol? Como garantir sua motivação para jogar futebol?
Pergunta 2 – Gostaria de falar sobre o tema da Criatividade. Observa-se que os jogadores espanhóis são muito bons no fundamento do passe e é claro que se pode ser criativo também com os passes, mas como criar um ambiente que se possa desenvolver a criatividade incluindo-se o drible como fundamento importante?
Pergunta 3 – Em sua opinião, quais são as principais virtudes do futebolista espanhol se comparados a outras nacionalidades europeias e mundiais?
Direção do F.C. Villanueva del Pardillo
Como curiosidade, e para encerrar esta matéria, apresentamos a atual composição diretiva do F.C. Villanueva del Pardillo, que tem como Presidente uma mulher, Yolanda González.
Veja a composição estatutária do clube.
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