Os anos pré-Copa e agora, no pós-Copa, abriu-se um espectro de debates em torno dos negócios relacionados ao futebol. São infindáveis os comentários sobre precificação de ingressos, organização do futebol brasileiro ante o cenário político da própria modalidade ou o endividamento dos clubes.
Mais das vezes, os comentários são, naturalmente, rasos, sem qualquer profundidade ou aplicabilidade efetiva. Vai-se pelo caminho mais fácil, o do senso comum, ou melhor, o do discurso fácil. Como não se eleva o nível do debate, é natural que as estruturas de poder se perpetuem, até porque, aos olhos de todos, não se tem a solução efetiva.
Na sequência, vou ilustrar tais premissas em exemplos recentes do meio do futebol. Mas antes, vou citar um outro, de uma outra área e, certamente, bem mais complexa do que a nossa por envolver uma série de variáveis sociais de difícil solução no curto prazo.
Em 2011, me mudei para o Rio de Janeiro, um pouco depois do início do processo de pacificação das favelas na cidade. Desde então acompanho, ainda que pelos noticiários, todos os movimentos em torno do desafio que é a ruptura de um modelo complicadíssimo de poder paralelo desenvolvido historicamente em áreas de elevado risco social. Mas sem entrar no mérito dos infindáveis problemas que ocorreram ao longo do processo (naturais, diga-se de passagem), o que fica sempre muito claro, sempre, é o plano.
Toda a vez que o Secretário de Segurança Pública vai para a frente das câmeras para explicar alguma ruptura no processo, fala com propriedade, enredado sempre por um projeto maior, dentro de algo que envolve não só a Segurança, mas também apoiado em uma visão transdisciplinar. E que os obstáculos e falhas do caminho sempre estiveram planejados e estão sendo contornados (e não são poucas as falhas, obviamente, diante de um cenário extremamente complexo, como já falei anteriormente). Daqui, poderíamos citar várias passagens e frases marcantes que corroboram com a premissa – para quem quiser saber um pouco mais, assistam a entrevista em https://www.youtube.com/watch?v=dlVwjS1DaH0 (do final de 2011). Mas não vou mais me alongar neste exemplo para voltar ao contexto do futebol.
Pois bem, no ambiente do futebol brasileiro, o nível do debate é quase que invariavelmente raso. O assunto mais latente ultimamente é a ocupação das novas arenas, o preço dos ingressos e o valor “abusivo” cobrado pelas gestoras das arenas para os clubes jogar. A fala fácil de que o Brasil é um país pobre e, portanto, tem que cobrar preços de ingressos mais baratos ou que os ricos não são tão fanáticos quanto os pobres para poder lotar as arenas é um absurdo.
E o mais espantoso: nem clubes nem gestores de arenas explicitam suas estratégias – talvez por não tê-las. Ou, mais grave, por não estar alinhado o negócio um do outro. O movimento natural é o de ruptura e a perda de uma oportunidade única de falarmos verdadeiramente sobre entrega de entretenimento.
No caso da tentativa de reorganização do futebol em relação a suas estruturas políticas, a lógica é a mesma. Muito se quer, mas não se tem um plano efetivo de médio-longo prazo. A Lei de Responsabilidade Fiscal está aí, foi uma conquista. Mas e agora? O que vem depois? É assustador ouvir aqueles que demandaram mudanças sem apresentar uma resposta coerente para o futuro dos projetos e das ações estratégicas.
Talvez o leitor agora esteja se perguntando: “OK, mas o que tem a ver a pacificação de comunidades do Rio de Janeiro com o preço do ingresso no futebol ou a sua organização política?”. É que no caso da segurança do Rio, ninguém consegue desmoralizar o discurso pois ele é fruto de um infindável debate e de um planejamento – para debater este assunto com tais lideranças, precisa estudar muito! No nosso mundo do futebol, não dialogamos efetivamente com todos os stakeholders para se encontrar um denominador comum e, portanto, qualquer discurso fácil serve e é aceito.
Na realidade, o caminho mais fácil nem sempre é o melhor. O Bahia deixar a Arena Fonte Nova, por exemplo, é um caminho absurdamente fácil, no afã da luta de classes entre uma “gestora de arena opressora e capitalista” diante de “clubes sem recursos”, em um processo de “coitadismo coletivo”. Lembrando que a operação das novas arenas existe há menos de 2 anos quando, no mundo, as arenas demoraram mais de 5 anos para começar a trabalhar com uma pequena margem de lucro.
Fazer errado dá o mesmo trabalho que fazer o que é certo. A grande diferença está no resultado. Enquanto não planejarmos e entendermos o que queremos com o negócio do futebol, vamos continuar a andar em círculos.