Quando uma equipe emprega, em um jogo de futebol, um sistema individual de marcação, assume com ela algumas premissas típicas dessa proposta de jogo.
Uma delas diz respeito à transição ofensiva da equipe (transição defesa/ataque). Na marcação individual, a movimentação da equipe que está marcando acompanha e é totalmente dependente da movimentação da equipe que está atacando. Em outras palavras, se o jogador “A” está marcando o jogador “B”, deve acompanhá-lo em todas suas ações. Então, quando a equipe do jogador “A” conseguir recuperar a posse de bola, esse jogador estará posicionado em campo de acordo com o jogador “B” e não de acordo com uma estratégia desenhada para uma rápida transição ofensiva.
Vejamos um exemplo para ilustrar essa discussão:
Nas figuras A e B podemos observar uma equipe atacando (azul) e uma equipe defendendo (em seu meio-campo de defesa – equipe vermelha) com uma proposta de marcação individual. Notemos que a movimentação da equipe azul (triângulos) induz a equipe vermelha a um tipo de movimentação. Em outras palavras, a equipe azul se distribui em campo tentando se organizar ofensivamente e conduz a partir da sua disposição em campo a distribuição e posicionamento da equipe vermelha.
Ainda que no exemplo apresentado nas figuras A e B a marcação individual realizada pela equipe vermelha respeite certos princípios (os atacantes estão participando da marcação mais à frente e os zagueiros mais próximos da meta de defesa, por exemplo), é fácil perceber que sua distribuição em campo está totalmente condicionada à movimentação da equipe azul. Isso significa que ao recuperar a posse da bola, a equipe vermelha terá mais dificuldades de se organizar ofensivamente (pois vai levar mais tempo para alcançar uma geometria apropriada em campo).
Esse fato se agrava se levarmos em consideração que todos os jogadores (ou quase todos) da equipe azul já estão próximos dos jogadores da equipe vermelha. Ou seja: se a equipe azul tiver um modelo de jogo para rápida recuperação da posse de bola depois de sua perda, terá o seu trabalho facilitado ao tentar recuperá-la de imediato.
Basicamente, é como se fizesse parte da estratégia da equipe vermelha facilitar a transição defensiva da equipe azul (principalmente se essa atacar a bola imediatamente após sua perda).
Vejamos um exemplo de como se estruturaria a equipe vermelha se estivesse marcando em “zona de cinco faixas” para a mesma movimentação da equipe azul:
Sem que entremos em detalhes sobre a lógica dessa estrutura de marcação em zona (façamos isso em outro momento), notemos logo de início que a distribuição em campo da equipe vermelha ao marcar está mais harmoniosa sob a perspectiva da ocupação dos espaços. Os jogadores se movimentam a partir de uma lógica identificada no seu modelo de jogo e se orientam a partir da bola (a bola não é a única referência para uma marcação em zona, mas é a mais importante). Ao recuperar a bola, a transição ofensiva da equipe vermelha fica facilitada.
Pois bem. Então, sob a perspectiva da transição ofensiva, deveríamos excluir a marcação individual como possibilidade de jogo?
Certamente não.
Ainda que aquele que vos escreve seja um defensor da marcação em zona, a questão aqui não é abandonar marcação individual em função desse ou daquele problema. A questão aqui é como minimizar ou resolver os problemas que podem surgir de um modelo de jogo desse tipo.
Se a dificuldade está em ter uma transição ofensiva eficiente, que permita no mínimo chegar à meta adversária com maior velocidade, analisemos pontualmente a questão:
1 – A marcação individual está condicionada à distribuição geométrica do adversário em campo (o que a leva a uma má distribuição);
2 – Com uma má distribuição em campo, maiores as dificuldades para conseguir construir ações ofensivas eficazes (a partir da recuperação da posse da bola);
3 – Quanto mais demorada for a recuperação da posse da bola, maiores as chances de o adversário se aproximar da meta de defesa (da equipe que marca);
4 – Quanto mais ele (o adversário) se aproximar, mais distante a equipe que marca estará da sua meta de ataque;
5 – Quanto maior a distância, mais dificuldades para se chegar ao gol adversário.
Então, ou melhora-se a distribuição em campo (marcar zona?), ou imprime-se um ritmo de jogo mais veloz (seria possível com má distribuição?), ou recupera-se a bola mais rapidamente (antes que a movimentação do adversário “bagunce” demais a distribuição geométrica da equipe que marca), ou ainda realiza-se essa recuperação em uma região “vantajosa” do campo.
O que fazer?
Certamente, uma opção é buscar recuperar a bola o mais rápido possível no campo de defesa do adversário (o mais próximo possível de sua meta de defesa). Em outras palavras, a equipe deveria atacar a bola com grande intensidade, o tempo todo que estiver sem ela, pressionando o adversário em seu campo de defesa – idéias já defendidas pelos renomados treinadores Arsène Wenger e Rinus Michels em outros contextos e situações-problema.
Mas como fazer isso sem a devida preparação físico-técnico-tática?
Nesse caso, a questão deixa apenas de ser “o que fazer” e passa a ser também o “como fazer”. E aí… Bom, aí é uma outra discussão…
Para interagir com o colunista: rodrigo@universidadedofutebol.com.br