A comunicação e o combate à violência no esporte

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A despeito de ter sido feita de forma empírica ou de ter sido alicerçada em casos isolados durante muitos anos, existe no marketing uma área destinada a estudar a experiência do consumidor. Esse desenho é parte fundamental em qualquer plano de comunicação e inclui toda a relação que as pessoas têm com a marca, da percepção ao consumo. Esse é mais um conceito que o esporte precisa aprender. Urgentemente.

A experiência do consumo começa com a relação que as pessoas têm com marcas e eventos. O esporte sai na frente nesse caso – times precisam fazer nada ou quase nada para criar nos torcedores uma relação que oscila entre a empatia e o amor. E aí as perguntas servem para qualquer um no Brasil: o que seu time faz para ter uma relação ainda mais próxima com você? O que os outros times fazem para tentar conquistar você?

Parte desse descaso afeta a própria imagem das instituições. O desenho de qualquer experiência depende fundamentalmente do que as pessoas pensam sobre a marca. A Disney, exemplo mais bem acabado e mais antigo desse tipo de estratégia, não é um sucesso comercial apenas por ter boas atrações ou bons personagens. O planejamento da empresa inclui a criação de um conceito que transforme os parques e produtos em objetos de desejo.

Independentemente da modalidade, times brasileiros não se esforçam para construir marcas que sejam objetos de desejo. Não há planos de comunicação que sejam focados no que os torcedores querem consumir (e consumir aqui é um conceito infinitamente maior do que “comprar produtos oficiais”).

O desleixo com eventos esportivos é apenas parte desse problema. Como não se preocupam com a imagem que vendem, times não pensam em quais consumidores eles querem atingir, em quais momentos e com quais mensagens. Tampouco ponderam quais são as pessoas a serem atraídas em jogos e como levá-las às arenas.

No início de 2015, essa falta de conceito sobre eventos esportivos afetou diretamente dois dos principais Estaduais de futebol do Brasil. A venda de ingressos tornou-se motivo de discussão no Rio de Janeiro e em São Paulo.

No Rio, Flamengo e Fluminense insurgiram-se contra a política de ingressos imposta pela Federação Estadual do Rio de Janeiro (Ferj). Eduardo Bandeira de Mello, presidente da equipe rubro-negra, chegou a ameaçar retirar os titulares do Estadual para evitar prejuízos pelo controle de preços.

Após pressão, a Ferj admitiu que Flamengo e Fluminense estabelecessem preços superiores ao limite que a entidade havia estabelecido. Os dois clubes alegam que precisavam de valores mais altos para custear a operação das partidas e obter lucro. E em nenhum momento o perfil de público foi tema de debate.

Aqui cabe uma comparação com as principais ligas esportivas dos Estados Unidos. O tíquete médio cobrado em jogos de beisebol é muito menor do que o valor de um ingresso para o futebol americano. A lógica incutida nisso é que são atrações para diferentes tipos de público – e diferentes tipos de público carregam diferentes demandas.

Em São Paulo, a polêmica teve a segurança como plano de fundo. Palmeiras e Corinthians disputaram clássico no último domingo (08), no Allianz Parque. Por influência do Ministério Público de São Paulo e da diretoria alviverde, a Federação Paulista de Futebol (FPF) chegou a anunciar que a partida teria torcida única. Após ameaça do presidente corintiano, a entidade mudou de ideia.

FPF e Ministério Público usaram a segurança como justificativa para defender torcida única no clássico; O Palmeiras também citou aspectos comerciais (a separação de público exigiria uma série de adaptações e inutilizaria uma série de cadeiras do estádio). E ninguém pensou na experiência do torcedor.

O Corinthians também entra nessa discussão. Quando teve acesso a uma carga de ingressos, o time alvinegro destinou essas entradas a torcedores organizados. Talvez tenha pesado o apoio que esses grupos oferecem ao time, mas será que houve ao menos uma discussão sobre o melhor perfil de público para destinar um número pequeno de bilhetes?

A relação é de oferta e procura. Se eu tenho um universo de milhões de torcedores e acesso a pouco mais de mil entradas, qual é o critério para escolher a quem destiná-las? A partir da definição do critério, em que a experiência do jogo é modificada para atender a apenas esse contingente?

A ideia que um torcedor oganizado tem de um jogo ideal é radicalmente diferente da ideia de alguém menos fanático ou assíduo, por exemplo. São pessoas com necessidades e vontades distintas, e entender isso é parte de um plano de comunicação adequado para um evento.

O esporte é um segmento plural, que permeia diferentes classes sociais e atrai pessoas com perfis muito diferentes. Além disso, é um segmento democrático, que coloca todos esses grupos em um mesmo ambiente. O problema é confundir democracia com tratamento homogêneo.

Entender isso é ponto fundamental para determinar questões como preço e serviço. O ingresso de um jogo de futebol é caro? A resposta é: não sei. Barato e caro são conceitos muito subjetivos, que não têm relação apenas com a quantidade de zeros da conta bancária do consumidor. Você já deve ter achado que pagou muito por um produto barato, mas que foi inútil. Da mesma forma, deve ter achado uma pechincha quando teve uma experiência inesquecível, mesmo após ter desembolsado um bom dinheiro.

A discussão sobre aspectos como preços e cargas destinadas a torcedores em eventos esportivos deve ser abrangente, levando em conta fatores como segurança, custo da operação e comportamento do público. Mas também deve passar necessariamente por um desenho da experiência, e isso tem de ser feito a partir de um plano de comunicação. Afinal, que tipo de torcedor o esporte quer atrair para um evento? E que tipo de experiência o esporte quer proporcionar? 

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