Como desestruturar um sistema defensivo

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Tem gente que bebe café pra esquentar o corpo em “um dia frio num bom lugar pra ler um livro“. Tem gente que bebe café pra “dar uma acordada”. Sem a intenção de discutir verdades e mitos sobre o café ou sobre a cafeína e menos ainda com o propósito de fazer uma discussão bioquímica e fisiológica a respeito do assunto, diria que faz muito tempo, que “tomar um café” deixou simplesmente de remeter a idéia de beber um cafezinho. Passou a ser um ritual, em que muitas vezes come-se uma “bolachinha” e nem se passa perto do tal.
 
Eu que pouco bebo café, respiro em um Café muitas idéias para discutir futebol. Em um dos mais recentes encontros para tais discussões no “Café dos Notáveis” (onde se discute futebol sob a luz da Ciência), algumas inquietações. Trago uma para debatermos.
 
É de conhecimento dos “preparadores físicos”, fisiologistas e bioquímicos do desporto que para o organismo do atleta melhorar sua performance integral, é necessário que haja um estímulo estressor que cause desarranjo, desequilíbrio, incômodo as estruturas estáveis do organismo. Este estímulo tira-o (o organismo) do estado de equilíbrio e exige dele respostas adaptativas que proporcionem uma reorganização em um nível mais estruturado. Tal reorganização ocorre para que ele (o organismo) seja capaz de manter o equilíbrio se um estímulo estressor de mesma magnitude resolver “atacá-lo”.
 
Se o estímulo estressor não tiver magnitude suficiente não provocará resposta adaptativa (porque não é capaz de tirar o organismo do estado de equilíbrio). Se a magnitude for superior aos limites do organismo, o desequilíbrio causado pode ser tão grande que ele (o organismo) não seja capaz de se reorganizar, se reestruturar; ter uma resposta adaptativa positiva (que represente ganhos).
 
Temos aí alguns conceitos importantes:
a-    se o estímulo estressor for maior do que a capacidade do organismo de reagir a ele à intenso desequilíbrio,
b-    se o estímulo estressor for menor do que a necessidade do organismo para reagir a ele à não há desequilíbrio,
c-    se o estímulo estressor for adequado à respostas adaptativas satisfatórias, ou seja, o organismo equilibrado se desequilibra, reage e torna se equilibrar.
 
Em jogos de futebol esses conceitos podem ser aplicados também em questões táticas das dinâmicas que envolvem o jogo. Se uma equipe está atacando, tenta, a partir do seu equilíbrio ofensivo “desequilibrar o equilíbrio” defensivo da outra equipe. Se suas estratégias causarem desequilíbrios muito intensos no adversário, levarão com maior contundência a chances de finalizações e gols. Se as movimentações ofensivas tiverem pequenas magnitudes, não conseguirão desequilibrar a defesa adversária, o que em termos ofensivos vai resultar em “nada”. Se o estímulo for “adequado” causará certos desarranjos a defesa adversária, seguidos de respostas organizadas, que exigirão novas e mais intensas dinâmicas ofensivas para tentar desequilibrar o sistema defensivo.
 
Em outras palavras, o ataque de uma equipe busca desequilibrar intensamente a defesa adversária. Se suas dinâmicas e estratégias não forem intensas o suficiente a defesa levará vantagem. Se for, o ataque levará vantagem, com facilidade. Grandes jogos (e outros nem tão “grandes” assim) apresentam equilíbrios e desequilíbrios constantes, com estratégias de ataque para desequilibrar a defesa, e estratégias de defesa para se manter equilibrada e desequilibrar o ataque, onde repostas e estímulos vão se alternando o tempo todo.
 
Temos aí outros conceitos interessantes. Se por um lado o ataque de uma equipe tenta desequilibrar o sistema defensivo de outra, o sistema defensivo de uma equipe poderá adotar três estratégias alternativas para responder aos ataques adversários. A primeira estratégia remete a tentativa da equipe de manter seu sistema defensivo equilibrado.
 
A segunda, remete para a tentativa de equipe provocar desequilíbrio no sistema ofensivo adversário. A terceira estratégia é a alternância circunstancial das estratégias anteriores.
 
No primeiro caso, buscar manter-se em equilíbrio significa desenvolver uma estratégia “passiva” para roubada de bola, buscando uma estruturação posicional vantajosa (característica principalmente de marcações por zona), induzindo o adversário ao erro.
 
No segundo caso, causar desequilíbrio significa desenvolver estratégias “ativas” de busca incessante para recuperar a posse da bola (característica, principalmente, de marcações individuais, “por camisa”).
 
No terceiro caso, o mais elaborado e complexo, causar desequilíbrio significa alternar as estratégias, de tal maneira que se busque uma estruturação posicional vantajosa para se partir para a busca intensa pela recuperação da posse da bola.
 
UM MOMENTO DE DESEQUILÍBRIO:
 
Um dos Notáveis do Café contou que há alguns anos, em um jogo presenciou a seguinte situação:
 
Primeiro escanteio ofensivo do jogo, para a equipe “A”. Dos dez jogadores de linha, sete foram para a grande área e proximidades dela. Até aí, nada aparentemente anormal. A equipe “B” deveria por comodismo (como quase todas as equipes por aí) deixar dois atacantes para puxar o contra-ataque e trazer os demais oito jogadores para participar da defesa. Então, situação habitual, comum: três defensores da equipe “A” marcando dois atacantes da equipe “B”, que por sua vez teria oito jogadores marcando sete (6+1 que cobra o escanteio). Mas eis que surge o inesperado; um momento de intenso desequilíbrio – a equipe “B” resolve manter não dois,
mas cinco atacantes para puxar o contra-ataque (deixando apenas cinco jogadores dentro da área para defenderem o escanteio).

 
A equipe “B” tentou se manter em equilíbrio, ou tentou desequilibrar o ataque adversário? O que você faria se fosse treinador da equipe “A”?
 
Bom, a equipe “A” manteve três jogadores para se defender; ou seja, no seu escanteio ofensivo posicionou sete jogadores atacando (6+1) contra cinco defensores.
 
Escanteio cobrado, nas mãos do goleiro da equipe “B”. Sem pestanejar, contra-ataque armado. Aproveitando o intenso desequilíbrio causado no sistema defensivo da equipe “A” (5×3), gol para a equipe “B”.
 
Senhores, a equipe “B” causou grande desequilíbrio na equipe “A” ao manter cinco jogadores na linha de meio-campo para puxar o contra-ataque. A equipe “A” não respondeu de forma inteligente em tempo hábil. Aí sofreu o gol.
 
Se analisarmos atentamente a situação, notaremos que antes da cobrança do escanteio a equipe “A” tinha seis jogadores mais um contra cinco defensores mais um (o goleiro).
 
Como aumentar essa vantagem numérica sem recorrer a remanejamentos de jogadores, possibilitando maiores chances de criar uma situação de gol?
 
Se ao invés de cruzar a bola diretamente na área, a equipe “A” tivesse realizado uma cobrança curta – saísse jogando – como ficaria a situação numérica? Simples, o 6+1 se transformaria em sete. O 6+1 contra 5+1 se transformaria em sete contra 5+1.
 
Levando em conta que os jogadores que ficaram para puxar o contra-ataque tentariam voltar para auxiliar a defesa, a equipe “A” teria ainda cerca de cinco segundos para buscar o desfecho da jogada com vantagem numérica. Na pior das hipóteses para a equipe “A”, a equipe “B” conseguiria se reequilibrar defensivamente a tempo, mas perderia a vantagem numérica ofensiva em um eventual contra-ataque.
 
Aí, quem teria desequilibrado quem? (“Tostines vende mais porque é fresquinho, ou é fresquinho porque vende mais? – se não quiser se arriscar é melhor ir pegando o “bolachinha” da prateleira; e se não gosta de bolachas…, bom, aí é melhor vir tomar um “Café”.)

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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