Podem chorar

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Já estava pensando em escrever este texto antes mesmo do shuffle do meu celular me presentear com “Wish You Were Here” do Pink Floyd. Daquelas canções em que eu choro há quase 40 anos só de lembrar que ela existe. Só de lembrar de quem tanto eu gostaria de falar desta baita Copa ao telefone e a morte não me deixa mais. Só de lembrar de tantas amadas pessoas que o skype, o whatsapp e o celular diminuem a distância nesta vida.

Mas não minimizam o mimimi. Não o chororô. Não as lágrimas que rolam como a bola por este país que percorro já não sabendo qual hotel, qual cidade, que dia é hoje.

Respiro fundo, evito que o teclado molhe, e canto para acordar Porto Alegre a letra de uma canção pungente de saudade. De amizade. De parceria. De amor. De perda. De vitórias. De heróis. De fantasmas.

Da vida que passa pelos nossos olhos que às vezes pesam e não deixam cair justamente o primeiro verbo que conjugamos e executamos deste lado – chorar.

Começamos nossos dias assim. Talvez acabemos nossas noites chorando. E, muitas vezes, não nos permitimos chorar por uma canção. Por uma imagem. Por um cheiro que faz chorar a ausência da pizza da avó. Por uma piada. Por um pio. Fio. Tio. O que for. Quem for.

Atire a primeira pedra de cristal japonês que faz chorar ator canastrão quem não chorou por nada. Atire-se quem não chora por vitória no futebol. Por derrota no futebol.

Isso é torcer. Isso é ser. Isso é direito inalienável do ser humano.

Por que então não pode chorar no Hino à capela no templo do futebol?

Por que não pode se debulhar durante os pênaltis?

Por que não pode desabafar depois de quatro anos de exageradas cornetadas?

Chora, Seleção do Brasil.

Chorem Júlio, Thiago, Neymar, quem mais?

Chorem. E nos façam chorar junto.

Ganhando. Perdendo.

Empatando.

Como é a nossa vida. Mais empates que derrotas e vitórias.

Como é a vida de E.T.s como Pelé, que do baixo dos 17 anos dele, chorou na conquista de 1958 no ombro de Gilmar.

Basicamente por ele não saber se os pais dele estavam sabendo em Bauru que naquele dia o Brasil havia conquistado o primeiro dos cinco mundiais – três com Ele em campo.

Esse era, segundo Pelé, o motivo do choro na final do Rasunda de 1958. Ele não sabia se os pais já sabiam que ele era campeão mundial.

E Ele é E.T.

Imagine, então, mortais como os atuais selecionados por Felipão. Jovens ainda. E pressionados como mandantes da Copa, não necessariamente da festa.

Chorem!

E deixem o coro dos que são contra ser, simplesmente, do contra. Gente que cobra quando o time não vibra por não ter fibra. Gente que exige quando os profissionais são gente antes de tudo.

Ninguém no time que não está bem chora só por cobrar um arremesso lateral. Chora quando acha que precisa. E ninguém pode ser cobrado por extravasar. Nem mesmo o contrário. É reação de cada um. É sentimento único. Pode chorar. Pode ficar na sua. É isso. É sua. Se sua nos olhos, se vira gelo, é sua emoção. Toda sua.

Mas os azedos e amargos de praxe e de picho não estão apelando para a razão. Abusam de um manual de procedimento sem cabimento.

Estão apenas apelando. E contra a emoção do jogo e da vida.

Chorem, meninos. Chorem, marmanjos.

Faz bem. E vocês farão ainda melhor.

Como bem definiu São Marcos:

– Nunca tive equilíbrio emocional na minha carreira.

É por aí.

Percam algumas vezes as estribeiras. Chorem mesmo. Se errarem, como Cerezo depois do gol dado a Rossi, em 1982, tentem se recuperar. Como ele mesmo fez em campo. Joguem. Se joguem. Vivam. Chorem.

Vai ter gente cobrando.

Deixem eles chorar.

Chorem por nós.
 

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet.

 

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