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Dona dos direitos de personagens como Capitão América, Homem de Ferro e Hulk, a editora Marvel conseguiu um feito neste ano: após o lançamento de “Capitão América: o Soldado Invernal”, a franquia de super-heróis ultrapassou a saga do bruxo Harry Potter e se tornou a série mais rentável da história do cinema. E o que isso tem a ver com esporte? O sucesso dos filmes que forjaram o recorde é baseado num conceito que ainda precisa ser assimilado em searas como o futebol. Até nos principais eventos.

O novo filme do Capitão América é o nono que a Marvel contabiliza como parte de sua franquia cinematográfica – houve outras incursões de heróis da empresa no cinema, mas quase todas tiveram resultados aquém do esperado. Na soma, as obras com chancela da “Casa das Ideias” estão próximas de US$ 2,5 bilhões em faturamento.

O que mais impressiona é exatamente isso: as experiências anteriores dos super-heróis da Marvel na tela grande não haviam obtido resultados relevantes – essa análise exclui personagens como Homem Aranha e X-Men, cujos direitos cinematográficos são explorados por outras empresas. De repente, houve uma virada.

Essa mudança de panorama começou quando a Marvel decidiu construir um universo cinematográfico. Todos os filmes recentes da empresa estão conectados, e até produtos como séries de TV têm repercussão nesse mundo complexo.

As pessoas não precisam ver um filme do Homem de Ferro para entender o que se passa numa obra com o Hulk, mas os eventos de um influenciam diretamente os rumos do outro. Isso aumentou o interesse dos fãs mais assíduos, ávidos por referências cruzadas nos longas da empresa, mas também fez com que o público “comum” tivesse uma noção maior de complexidade dos personagens.

No esporte, um exemplo bem próximo disso foi criado pelo circuito de artes marciais mistas (MMA) UFC. Disposto a se aproximar de um contingente maior de pessoas, o evento tentou humanizar seus lutadores. Para isso, a organização suavizou regras e buscou personagens com perfis diferentes. A grande sacada, no entanto, foi a criação de um reality show para selecionar novos atletas. Com emoções e dramas expostos na TV, as estrelas mostraram ao público que eram mais do que os golpes desferidos no octógono.

Os exemplos da Marvel e do UFC só funcionaram porque as empresas que os criaram tinham em mente um cenário mais amplo. Nem todos os filmes foram produzidos, dirigidos ou escritos pelas mesmas pessoas. Da mesma forma, profissionais com diferentes ideias sobre o MMA comandaram cada uma das áreas em que o circuito decidiu atuar.

Isso nos leva a uma reportagem publicada na edição de 30 de abril da revista “Exame”. O texto de capa da publicação é focado nas cidades brasileiras, com uma análise focada no potencial de negócios. Em um trecho, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, usa uma experiência pessoal para falar sobre a preparação para os Jogos Olímpicos de 2016: “Quando eu fui a Barcelona pela primeira vez, em 1990, tive uma péssima impressão da cidade, que estava com obras por todo lado. Talvez as pessoas pensem o mesmo do Rio durante a Copa do Mundo. Paciência. Minha prioridade é a Olimpíada”.

A declaração de Paes é seguida por uma constatação de Jaime Lerner, urbanista e ex-prefeito que mudou a mobilidade de Curitiba na década de 1970: “Toda cidade precisa ter um sonho. A maioria das cidades brasileiras não tem”.

O que a Marvel (em maior escala) e o UFC nos mostram é que essa não é uma regra válida apenas para as cidades. Todo empreendimento, independentemente da seara, precisa ter um sonho.

O Brasil vai sediar a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016. São os dois maiores eventos esportivos do planeta, com audiências gigantescas e investimentos vultosos. Mas qual é o sonho do país com essas competições?

Se não descobrir a resposta para isso, o Brasil viverá de ações pontuais. A comunicação pode até ser eficiente nos dois eventos, mas perderá grande parte do potencial se não for colocada a serviço de um objetivo maior e mais complexo.

O exemplo do que o futebol brasileiro pode fazer está posto: basta acompanhar o que foi realizado pela Uefa para a decisão da Liga dos Campeões, no último sábado, em Lisboa. Após empate por 1 a 1 no tempo normal, o Real Madrid bateu o Atlético de Madri por 4 a 1 na prorrogação e ficou com o título continental pela décima vez na história.

O jogo não foi tratado como um evento qualquer. Isso pode parecer óbvio, mas uma comparação com uma decisão de Copa do Brasil ou de Copa Libertadores é suficiente para mostrar que a Liga dos Campeões da Uefa vive em outro mundo no futebol atual.

O projeto de comunicação da Uefa para a disputa do título envolveu ações nas ruas e uma série de iniciativas para fazer da decisão um evento para mobilizar Lisboa – a partida final da Liga dos Campeões é sempre disputada em campo neutro. Mas também contou com um enorme esforço de mídia.

A venda de pacotes da Uefa inclui produtos voltados à valorização do campeonato. Quem compra direitos de transmissão da Liga dos Campeões, por exemplo, inclui no contrato uma presença do evento no restante da programação. Isso pode ser feito com gols, melhores momentos, reportagens ou outros tipos de formatos, desde que o evento esteja ali.

A Globo, por exemplo, precisou de uma autorização para falar Liga dos Campeões da Uefa em vez de Uefa Champions League. A ideia de brigar pelo uso da nomenclatura em inglês faz parte de uma estratégia da Uefa para internacionalizar o evento.

A Uefa também vende internacionalmente a Liga dos Campeões como o maior torneio de futebol depois da Copa do Mundo. Quantas vezes você ouviu que “são os mesmos jogadores, mas dispostos em times em vez dos países de origem”?

Com isso, a Uefa acaba valorizando o próprio futebol europeu. Ter uma competição forte é uma forma de vender muito mais do que isso. É uma forma de mostrar ao mundo o potencial que o esporte tem no Velho Continente.

É impossível medir o potencial de negócios contido nessa mensagem. Contudo, basta ver o quanto a Liga dos Campeões fatura. Em graus diferentes, outras competições podem atingir esse sucesso. Para isso, porém, é preciso que elas tenham um sonho. 

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