A Exportação, o Zico, o Pelé, o Bosman e o Maradona

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Não é segredo para ninguém que o Brasil é um mercado exportador de matéria prima. Isso eu aprendi quando estava no primário, quase 20 anos atrás. De lá pra cá, o mercado se abriu, os processos de globalização avançaram, o país se desenvolveu economicamente, mas é bem verdade que pouco desse conceito mudou.
 
O Brasil exporta café, laranja, álcool, soja e jogadores de futebol. Aliás, exporta muitos jogadores de futebol, o que – imagino – também não seja segredo pra ninguém. Na média, são cerca de 800 jogadores por ano, analisando o período da Copa de 2002 até hoje.
 
Muitos acreditam que esse é um problema da falta de organização do futebol brasileiro. De fato, o caos que impera contribui bastante, mas não deve ser visto como uma razão preponderante. Mas nem de longe é a única razão para tal fenômeno.
 
Dirigentes em geral gostam de culpar a atual legislação, que supostamente acabou com o poder neo-escravocrata dos clubes sobre os jogadores. Dizem que foi a partir daí, da Lei Pelé, que a porteira se abriu. Mentira. Em parte, pelo menos.
 
Em algumas análises que fiz recentemente, e que talvez publique em breve, é possível perceber que de fato há uma grande diferença entre o número de transferências pré e pós Lei Pelé. Entretanto, essa diferença está diretamente atrelada à evolução cronológica do mercado. De 1989 até o início da Lei Zico, transferiam-se em média uns 190 jogadores por ano. Durante a Lei Zico, essa média pulou para 385, um acréscimo de mais de 100%. Do início da Lei Pelé até hoje, a média pulou para uns 750 jogadores por ano, ou seja, cresceu cerca de 95%. Portanto, olhando assim superficialmente, é possível concluir que qualquer crítica feita à Lei Pelé é falha e carece de base estatística confiável, uma vez que o mercado aumentou mais durante a época da Lei Zico.
 
Esse erro de análise dá uma medida do nível de desinformação e de estudo do futebol profissional brasileiro. Tudo bem que essa análise é bastante rasa, mas ela pelo menos oferece subsídios para se quebrar o argumento de que a grande responsável pela evasão de jogadores do futebol brasileiro é a Lei Pelé.
 
Como toda história tem que ter um culpado, é possível apontar outro fenômeno como a principal causa da transferência de jogadores, a Lei Bosman, uma lei que permite o livre trânsito de jogadores dentro da Comunidade Européia. Essa lei não é exatamente uma pioneira na libertação contratual de jogadores, coisa que já era regra na Inglaterra lá pelo meio do século XX, acho, mas ela foi a grande responsável pelo aumento do trânsito internacional de jogadores de futebol dentro e para o mercado europeu.
 
No Brasil não podia ser diferente. De 1989 até 1995, que foi quando teve início a Lei Bosman, transferiam-se aproximadamente 200 jogadores por ano para o exterior. Do início da Lei Bosman até hoje, a média saltou para aproximadamente 675 jogadores por ano, um acréscimo de cerca de 240%. Muito mais do que Zico, muito mais do que Pelé. Muito mais do que Zico e Pelé juntos.
 
É óbvio que isso não explica sozinho o fenômeno do grande número de transferências, mas indica algumas variáveis que precisam ser analisadas. O fenômeno do movimento internacional de jogadores não é restrito apenas às leis, tampouco ao mercado brasileiro e europeu. Muito mais fatores influenciam esse panorama, mas pelo fato de a UEFA ser o destino de 56% das transferências e pelo fato do Brasil ser o grande exportador mundial de jogadores, essas questões precisam ser analisadas com bastante seriedade.
 
E é justamente essa seriedade que falta para que se consiga perceber e disseminar o panorama do fenômeno completo, de modo que possam se achar as soluções para contornar o suposto problema, se é que ele é de fato um problema. Uma seriedade que falta quando se deposita toda a culpa da falta de estrutura do futebol brasileiro unicamente em uma pretensa falha legislativa.
 
Não é possível chegar a conclusões apenas por esses limitados dados apresentados, mas ao que parece, na situação aqui exposta, Bosman é muito mais importante do que Pelé e Zico. Juntos.
Coisa que qualquer brasileiro demora a digerir.
Imagine se fosse na Argentina.
Imagine se fosse o Maradona.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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