A falta que uma liga faz

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Dos males que assolam o futebol profissional brasileiro – e você bem sabe que são muitos – talvez nenhum possua tanta influência direta no composto total das coisas como a falta de uma liga propriamente estabelecida. Antes de eu começar a me prolongar por aqui, porém, é preciso que você, e tantos outros, entenda o que de fato é uma liga.
 
Lembra-se daquelas ligas regionais criadas há quase dez anos, que prometiam revolucionar o futebol brasileiro? Pois então. Esqueça delas. Apague da sua memória. Comecemos do zero.
 
Um clube sozinho, sem adversários, não faz nada. Joga paredão. Malha, talvez. Com um time só não existe futebol. É W.O. Para que uma partida de futebol possa existir é preciso um adversário. O futebol, portanto, não é um clube em si, mas sim o jogo resultante da disputa entre dois clubes.
 
Pois bem. Com dois times só, também, a coisa fica meio chata. Jogar contra o mesmo adversário repetidamente eventualmente acaba com o interesse na partida. Que diga o He-Man. Com um adversário apenas, o futebol até existe, mas fica bastante limitado.
 
Eis que um clube pode, portanto, procurar outros adversários para competir, despertando assim um interesse maior entre seus torcedores e seus próprios atletas. De forma desordenada, porém, as partidas acabam ficando sem propósito, cada uma acabando em si mesma. Dessa forma, cria-se um calendário para que determinadas equipes possam se enfrentar entre si de forma a conhecer qual é a melhor entre todas as concorrentes. Caracteriza-se, assim, uma liga, ou um campeonato.
 
No futebol moderno, a essência do interesse do torcedor e de todos os outros agregados no esporte se faz a partir da liga, e não do clube em si, tampouco em um seleto jogo. O Manchester United, em si, não representa nada. Ele possui o valor que tem por causa dos seus adversários. Se o Man Utd entrasse em campo no Old Trafford sem adversário, ninguém daria a menor bola. Bom, talvez alguns coreanos e chineses que eu conheço dessem, mas esses não batem muito bem.
 
O fato de o Manchester United poder jogar com times como Liverpool, Chelsea e Arsenal todo o ano oferece um valor agregado à marca que ela dificilmente encontraria em algum outro lugar. O mesmo acontece quando o clube se classifica para a Champions League e abre o leque de adversários para clubes como Barcelona, Real Madrid, Juventus, Milan, Bayern, Lyon, Benfica. Caso o Manchester passasse a jogar regularmente contra adversários do nível do Tranmere Rovers, por exemplo, é óbvio que o seu valor diminuiria consideravelmente. E que a família Glazer sentiria na pele a força daqueles que possuem cerveja em vez de sangue nas veias.
 
É possível afirmar, portanto, que todos os produtos do futebol são derivantes da própria liga em si. Quanto melhor a liga, melhor tende a ser a percepção dos produtos. Quanto pior, pior. Não à toa que as principais equipes dos principais esportes do mundo possuem por trás uma liga forte que a sustente. É o caso do futebol, mas principalmente dos esportes americanos, com a NFL, MLB, NBA, entre outras.
 
No futebol, as ligas não são novidades. A primeira de todas, a Football League inglesa, começou em 1888. Desde então, outras ligas foram surgindo ao redor do mundo com o intuito de organizar e comercializar a competição nacional.
 
Liga e Federação são coisas bastante diferentes. Uma federação nacional de futebol deve prezar pelo desenvolvimento do futebol em um determinado país, em seus mais diversos níveis, do amador ao profissional, da criança ao adulto, do homem e da mulher. Uma liga, porém, preocupa-se em organizar, promover e comercializar um determinado campeonato. São coisas diferentes, que precisam ser organizadas por instituições também diferentes. A idéia é outra, a filosofia é outra e os interesses são outros.
 
No Brasil nunca existiu uma liga propriamente dita. A CBF não é uma liga, é uma federação, e como tal preocupa-se com as coisas do parágrafo anterior. No começo, era ela a principal responsável pela organização do Campeonato Brasileiro, muito por causa da pressão do Estado na realização desse campeonato. De uns tempos pra cá, porém, a CBF tem passado a responsabilidade do campeonato para o Clube dos 13. O C13, porém, também não é um liga. O C13 ainda é uma organização fechada que reúne e preza pelo interesse de alguns determinados clubes, não do campeonato em si. Uma liga, na sua forma natural, é composta por membros temporários, que assumem ou deixam os postos de acordo com a performance esportiva. A liga preocupa-se com ela, e não com os clubes que a compõe.
 
Uma liga, no Brasil, poderia gerenciar melhor diversos elementos cujas responsabilidades hoje são atribuídas ou à federação ou ao governo. Uma liga poderia, por exemplo, exigir que determinados pré-requisitos fiscais fossem seguidos para que o clube fosse autorizado a participar do campeonato. Poderia, também, estipular regras claras sobre a presença e influência de empresários e grupos de investidores nos clubes. Poderia, enfim, dar pelo menos um passo inicial no controle e na solução das diversas mazelas que aos poucos vão acabando com o futebol nacional.
 
O Campeonato Brasileiro de futebol profissional não é da federação. Muito menos do Estado. O Campeonato Brasileiro de futebol profissional é daqueles que de fato fazem parte da tabela. Eles que se organizem para conseguir fazer o melhor possível para atrair interesse e dinheiro dos torcedores. O problema é da liga. O problema é dos clubes. Se não conseguirem se entender, que joguem paredão. Ou malha.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br 

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