Dimensão tática do jogo de futebol

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“Vencer, perder, empatar… O que pesa mais ao trabalho de um técnico de qualquer esporte; a derrota determinada em um detalhe, ou a vitória representada numa seqüência de erros não aproveitados pelo adversário (e ao acaso; que talvez não exista; mas que resultou em um gol, cesta, ponto, enfim no êxito)? Certamente, muitos de nós pensamos apenas na importância do resultado final de um trabalho (vencer ou perder), ou pelo menos nos preocupamos demais com isso, sem nos atentarmos que a qualidade, a estrutura do que formamos para nossos atletas e equipes é a essência do êxito. O ideal então estaria em agrupar as duas coisas; construir um grande trabalho (o que já é parte da vitória), e a partir disso, buscar vencer. Para tal, poder cuidar de detalhes e ter acesso a variáveis que refletem o rendimento de uma equipe é algo muito valioso. No futebol profissional, vencer é mais do que um objetivo é uma necessidade para sobreviver”. (LEITÃO, 2004).

No mundo em que vivemos, seja nas grandes indústrias multinacionais, na sorveteria da esquina ou no esporte de alto rendimento, é cada vez mais importante a capacidade das pessoas e organizações de reconhecer, captar, decodificar informações.

Elas (as informações), têm “peso de ouro”. Ter a informação antes dos outros, ou saber melhor o que fazer com ela é essencial para o sucesso.

Não é por acaso que o Google, criado em 1998, transformou-se, segundo Vise e Malseed (2007), de uma ferramenta online de buscas, no maior império da internet, tornando-se em menos de uma década, imprescindível às pessoas e empresas ávidas por informação.

No futebol, é quase “praxe” que muitas vezes se peque pelo excessivo empirismo, onde eventos, fatos e acontecimentos sejam explicados por “achismos” descontextualizados e desvinculados das bases do conhecimento científico. Não é incomum também que quando não se deslize pelo empirismo, erre-se pelo cientificismo quantitativo, que transforma toda complexidade dos fatos em simplismos que também não explicam ou condizem com os fenômenos observados.

Há porém de se destacar que, talvez esteja na falta do conhecimento científico aplicado, a grande lacuna profissional do futebol, que permite, segundo Garganta (1997), que a “experiência funcione com argumento de autoridade“.

Então, buscar a informação, construída sobre as bases da Ciência, possibilitaria estruturar sólido “esqueleto” de conhecimentos.

“Em grande parte das modalidades desportivas a obtenção de diferentes tipos e níveis de informação pode ser o limiar entre uma preparação que leve ao êxito e outra que leve ao fracasso. No desporto de alto rendimento, em especial nos desportos coletivos, tem sido bastante empregados recursos que detalhem a técnicos e preparadores físicos características ligadas às qualidades físicas de atletas e equipes (as suas e as adversárias); o que não ocorre necessariamente com os aspectos táticos”. (LEITÃO, 2004)

 É claro que no universo desportivo alcançar o êxito é algo que depende de um grande número de dimensões que se integram e se relacionam. Isso significa dizer que são muitas as “faces do conhecimento” que precisam ser estudadas e compreendidas. Há porém de se destacar que a dimensão tática representa área importante dessa face, com grande expressão no resultado final de uma partida.

O fato é que talvez seja no futebol o ambiente onde a dimensão tática é mais intensamente negligenciada. Isso fica visível quando treinadores, especialistas e torcedores resolvem palpitar ou explanar sobre eventos táticos dentro de uma partida. Raras vezes ocorrem consensos, mesmo entre “profissionais gabaritados do mundo da bola” que acabam tendo explicações distintas para uma mesma ocorrência no jogo.

Como a dimensão tática não é encarada como uma possibilidade da ciência, com conhecimentos singulares a ela (o futebol como um todo tem dificuldade de aceitar a ciência), qualquer coisa que ocorra dentro desta dimensão é submetida ao crivo dos “achismos” baseados em verdades construídas a partir da reprodução mecânica e automática de treinos ou partes do jogo.

E recorrendo mais uma vez a Europa, é fato que lá as grandes equipes (Milan, Real Madrid, Barcelona, Internazionale de Milão, Liverpool, Chelsea, Manchester, etc) dispõem de serviços de captação de dados (que são transformados em informação) de jogos de suas equipes e adversários. Tudo é mapeado, discutido e levado para o campo nos treinamentos. Nessas equipes os treinadores têm obrigação de saber interagir com as informações (e profissionais que as coletam) e aproveitá-las no seu trabalho.

É, mas no Brasil ainda estamos engatinhando. Ousaria dizer que vivemos em um analfabetismo tático, onde quem sabe o “A-E-I-O-U” já sai na frente.

Enquanto acreditarmos que ciência é perfumaria e não faz gol, vamos ter que continuar sem entender porque o Brasil perdeu para a seleção da França em 1998 e 2006 (na Copa do Mundo de Futebol); ou melhor vamos continuar aceitando a idéia de que em 1998 o problema foi o Ronaldo e o seu mal súbito, e que em 2006 o problema foi o Parreira que não deu bronca na beira do gramado e o Roberto Carlos que abaixou a meia na hora errada.

É meus amigos… Mas apesar de ser futebol, no fundo tudo não passa de um problema simples: ou acreditamos que o “Elvis não morreu” e que Papai Noel vai chegar voando com suas renas na noite de Natal; ou que um dia crescemos e amadurecemos para compreender que a vida não era tão simples quanto parecia quando nossa maior responsabilidade era ir bem na escola.

Bibliografia

GARGANTA, J. M. Modelação tática do jogo de Futebol: estudo da organização da fase ofensiva em equipes de alto rendimento. 1997. 150 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física, Universidade do Porto, Porto.

LEITÃO, R. A. “Futebol: Análises qualitativas e quantitativas para verificação e modulação de padrões e sistemas complexos de jogo”. 2004. Dissertação de Mestrado (Ciência do Desporto): Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas.

VISE, D.A., MALSEED, M. Google: a história do negócio de mídia e tecnologia de maior sucesso dos nossos tempos. Rio de Janeiro: Rocco, 2007.

Para interagir com o
autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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