Ganhar jogando à zona: conflitos da auto-organização coletiva

Entre para nossa lista e receba conteúdos exclusivos e com prioridade
Entre para nossa lista e receba conteúdos exclusivos e com prioridade
A todo tempo no nosso dia-a-dia, com maiores ou menores responsabilidades, com maior ou menor frequência, é inevitável e inerente à nossa condição humana: temos que tomar decisões.

Existe um tipo de decisão que nasce em uma dimensão que, tentando se aproximar das melhores respostas, acaba por se afastar da essência dos problemas.
 
Isso ocorre em ambientes diversos, da ciência à prática, da universidade ao “boteco” da esquina, dos escritórios mais ricos de Nova York até o gramado do futebol da periferia no final de semana.
 
Hoje tomarei no meu texto a decisão de assumir minha preferência pelo “jogar à zona”.
 
Em um passado bem recente, assisti um jogo em que uma das equipes se defendia marcando em zona – ou melhor, tentava – (e claro, marcar não representa o todo do jogar!). Ela foi derrotada e os especialistas de plantão logo apontaram com simplicidade, a culpada pela derrota: a marcação por zona.
 
Marcar individualmente, por zona, ou seja de que forma for pode ser mais eficiente em uma situação do que em outra, de maneira que apontar que uma forma de marcar é melhor do que outra incorre a grandes riscos de erro. Mas como mencionei anteriormente, hoje incorrerei ao grande risco.
 
Quando uma equipe faz uso da marcação individual, sua principal referência de ocupação do espaço é o adversário a ser marcado. Isso quer dizer que cada um dos dez jogadores de linha no jogo tem, cada um deles, uma referência distinta do seu companheiro para estruturar seu posicionamento no campo de jogo.
 
Então quando, estando marcando de forma individual, a equipe recupera a posse da bola, estará distribuída no campo em função do adversário e não das suas necessidades ofensivas. Isso quer dizer, em outras palavras, que ao invés de uma ocupação inteligente dos espaços, a equipe que marca individualmente acaba por configurar uma geometria anárquica no campo, e aí para ter êxito ofensivo precisará antes de mais nada redesenhar sua distribuição no terreno de jogo.
 
Certa vez um jornalista espanhol escreveu que é difícil distinguir em alguns jogos entre equipes brasileiras qual o esquema tático utilizado por elas.
 
Claro! Se as equipes brasileiras, em sua grande maioria, têm como referência principal de marcação o jogador adversário, cada ultrapassagem, entrada em diagonal ou troca de posição representa não uma dinâmica harmoniosa e inteligente de ocupação dos espaços, mas sim uma necessidade emergencial de auto-ajustes que proporcionem o mínimo de equilíbrio posicional a equipe.
 
E se isso é verdade para quando a equipe recupera a bola, também é para quando ela a perde.
 
Obviamente que marcar em zona pode ser tão ineficiente quanto marcar de forma individual (mesmo que jogadores e equipe entendam e cumpram bem suas funções) ou até pior se outras referências para a auto-organização coletiva ao invés de apresentarem caráter complementar umas as outras e caminharem na mesma direção, acabarem se chocando e não contribuindo para dinâmicas harmoniosas de jogo – mas que fique claro, o problema aí não é do “marcar em zona”…
 
Sob a perspectiva da auto-organização coletiva da equipe, o marcar em zona, o transicionar em zona, o atacar em zona; enfim, o “jogar à zona” permite uma referência mais contextualizada à dinâmica do jogo, podendo garantir sim superioridade no jogar, em circunstâncias diversas do jogo.
 
Sinto muitas vezes que as críticas que o “jogar à zona” sofre se dão mais pela incapacidade de entendimento do que isso significa (por parte de quem comenta ou critica), do que pela inconsistência dessa forma de jogar. Sinto também que muitas vezes, pelo que vejo, acredita-se com alardes, que essa ou aquela equipe joga (ou jogou) à zona; mas isso não deve ser tido como verdadeiro pelo simples fato de acreditarem que isso é verdadeiro – ou seja, acham que estão jogando à zona sem sequer cumprir com a essência dos construtos que o jogar à zona carrega.
 
Por isso, convido à todos a ler mais sobre o assunto e lhes garanto: as equipes de maior sucesso (financeiro e esportivo) no cenário europeu estão cada vez mais cumprindo melhor a essência do jogar à zona.
 
Sugestão de leitura inicial a respeito do tema: Amieiro; N. “Defesa à Zona no Futebol: um pretexto para reflectir sobre o JOGAR bem, ganhando!“. Portugal: Maiadouro, 2005.

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

Compartilhe

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on email
Share on pinterest

Deixe o seu comentário

Deixe uma resposta

Mais conteúdo valioso