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A política virou, cada vez mais, futebol. Deixamos de ter ideologias políticas para termos convicções partidárias. Cada vez menos se pensa e mais se torce quando o assunto é o futuro do país nas urnas.

Na última semana, mais uma vez tivemos a mostra de quanto as pessoas estão obcecadas pelo fanatismo politico. O quebra-pau entre defensores de Dilma e Serra, em meio a uma aparição do candidato do PSDB, foi digna de torcedores organizados, que não possuem a mínima noção de coletividade para conviver com aquele que pensa de maneira diferente da sua.

O resultado do conflito entre as pessoas foi algo ainda maior e mais absurdo. Passou-se a debater uma possível agressão a Serra, que foi ao hospital fazer uma tomografia para se certificar de que não teria sequelas por ter tomado em sua cabeça o que parecia ser um rolo de fita crepe.

Aí entra a grande questão que permeia o trabalho jornalístico, que é a apuração de fatos.

No dia seguinte ao episódio, amplamente noticiado em todos os veículos e tipos de mídia, o SBT fez uma reportagem mostrando que Serra teria simulado algo mais grave do que de fato teria acontecido. O repórter cinematográfico da emissora havia filmado Serra atingido por uma bola de papel. De acordo com o relato, 20 minutos depois o candidato recebe uma ligação telefônica e leva as mãos à cabeça.

Pronto!

Bastou termos essa versão da história para a torcida voltar a rugir. Até o presidente Lula caiu de pau em cima do rival político, equiparando-o ao chileno Roberto Rojas, que simulou ter sido atingido por um foguete no Maracanã em meio à disputa das eliminatórias para a Copa de 1990.

Até que, no dia seguinte, a Globo foi mostrar outras imagens, além daquelas exibidas pelo SBT, captadas pelo fotógrafo da “Folha de São Paulo”. Com a junção das duas imagens, é possível construir a história inteira, mostrando que Serra foi atingido por uma bola de papel e pelo que parece ser um rolo de fita crepe.

Deixemos de lado as torcidas. O exercício da profissão de jornalista requer bom senso, especialmente no momento em que se está no campo de trabalho e ainda mais no meio de uma grande confusão (fatos que são recorrentes para quem atua no esporte). Nesse momento, o repórter não é só quem escreve ou aparece no vídeo, mas fundamentalmente aquele que está no local com a função de captar imagens. Cinegrafistas e fotógrafos são grandes aliados nesse trabalho, já que a captação de uma imagem exclusiva pode ser fundamental para que se construa uma grande história.

No episódio da bola de papel, isso foi ainda mais claro. Com apenas um câmera, foi impossível construir um relato preciso daquilo que aconteceu. Estamos acostumados hoje a acompanhar um jogo de futebol com pelo menos cinco câmeras simultâneas realizando a transmissão de imagens.

Isso dificultou, e muito, o trabalho para o trio de arbitragem e também para jogadores desleais que tentam agredir o adversário num momento em que teoricamente “ninguém está vendo”.

A bolinha em Serra é a prova de que não se pode ter apenas uma fonte de informação. Para tentar contar uma história da forma mais completa possível, não se pode ter apenas um ângulo da visão. É preciso tentar ampliar o espectro e enxergar mais longe.

Isso vale também para comentaristas da televisão, que muitas vezes se esquecem de que o árbitro não tem o mesmo campo de visão que ele sentado na cabine ou assistindo a imagem por diferentes ângulos e velocidade.

Ora, bolas! Parece tão mais fácil quando se está do lado de cá. Mas, para isso, é preciso lembrar que para se formar uma história tem de buscar suas mais diferentes miniversões.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br  

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