A competição no processo de treinamento: o jogo é treino?

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Caros leitores, esta coluna não vem para discutir o papel pedagógico (ou não…!) da competição ao longo do processo de treino da equipe. Nosso colunista especial Alcides Scaglia traz essa discussão em “As escolas de esportes e a competição“, disponível na própria Universidade do Futebol.

O que vou abordar com vocês nesta semana é o real papel da competição como um estímulo fundamental para o desenvolvimento de jovens atletas e de equipes profissionais.

Ao longo dos últimos textos, afirmei que o treino deve ser jogo. Mas e o jogo formal: será que é treino?

Em minhas experiências ao longo dos anos em competições de base, notei que inúmeras equipes se baseiam em um jogo de bolas longas, para não chamar de chutões, em que os únicos atletas que participam efetivamente do jogo são os zagueiros que “quebram” (não os jogadores adversários, mas a bola…coitada…) e os atacantes que disputam esse “lançamento” e tentam chegar ao gol adversário.

Observando tal fato descrito no parágrafo acima, imaginei por algum tempo como seriam os treinos para chegar a esse “Modelo de Jogo”.

Certo dia, tive a oportunidade de acompanhar um treino de uma equipe que jogava “à base do chutão”. O que notei foi que o treino não condizia com o jogo!

No treino, os jogadores foram submetidos a três jogos. Em ambos o objetivo principal era a manutenção da posse de bola. Fiquei curioso e perguntei se as atividades eram sempre daquela forma ou se aconteceram ocasionalmente. A resposta foi que todos os treinos obedeciam à mesma dinâmica e que a manutenção da posse de bola era um objetivo que perpassava o processo ao longo das categorias.

Perguntei sobre a discrepância entre o “Modelo de Jogo” do treino (manutenção da posse de bola como princípio operacional de ataque predominante) e do observado nas competições (“chutão”). A resposta foi que no jogo o objetivo era ganhar, enquanto no treino o objetivo era formar. E esse é um grande mito e um grande problema no processo de treino.

Uma orquestra ensaia a sinfonia que vai tocar no espetáculo e não as que não vai tocar. Se for tocar a “Sinfonia Nº 9 de Beethoven”, não vai ensaiar a “Sinfonia Nº 40 de Mozart”. Assim deve ocorrer no futebol: se treino a manutenção da posse de bola, espero que no jogo este seja o princípio que norteará minha equipe nos momentos de ataque.

Tanto o espetáculo para a orquestra, como a competição para a equipe são grandes treinamentos específicos em que as demandas física/técnica/tática/mental são exigidas ao máximo.

Em suma, a competição é o treino mais específico que se pode ter!

Além disso, o jogo formal é um grande teste qualitativo para a equipe e traz inúmeras situações problemas que farão com que os jogadores estejam em uma constante busca pela organização em meio a um ambiente caótico. Nele podemos observar se os jogadores estão evoluindo e solucionando melhor os problemas específicos da modalidade.

O treino e o jogo devem caminhar juntos.

Nesse processo, a vitória não pode ser excluída, pois ela faz parte da cultura do futebol. Contudo mudar a forma de jogar para ganhar pode significar que o Modelo de Jogo que vem sendo desenvolvido nos treinos está voltado para o adversário, e não para o jogo propriamente dito. A equipe deve ser preparada para jogar o jogo – segundo Van Gaal, a equipe precisa agir em ação e não em reação ao adversário, modificando sua forma de jogar em função do mesmo. Acrescido a isso, deve haver uma cultura de jogo do clube que não se modifica jogo a jogo.

O Barcelona é o maior exemplo de uma equipe que possui uma cultura de jogo, um Modelo de Jogo, joga em ação e vence suas partidas sem modificar esses aspectos. Joseph Guardiola, logo após vencer um dos clássicos contra o Real Madrid, afirmou que não foi a vitória de uma equipe, mas de uma filosofia de jogo que não se altera independentemente do adversário.

Acredito que é essa filosofia aliado ao fato de que devo jogar o jogo e não contra o adversário que deve unir os treino e jogos! O treino é jogo e o jogo é o treino mais específico que se pode ter se for bem orientado. Ganhar com um modelo que não condiz com seus treinamentos pode ocorrer ocasionalmente, mas treinar como se pretende jogar levando a vitória em consideração é fundamental para a manutenção do rendimento dos atletas e da equipe.

Principalmente na base, quando a formação deve ser tanto no treino como no jogo! Ganhar no chutão na base não se justifica e prejudica o sonho de muitos pequenos atletas. Então, cuidado!

Para finalizar, cito nossa seleção que jogou contra a Alemanha nesta semana. Durante todo o jogo, a equipe alemã teve uma maior posse de bola, criou as melhores chances e apresentou um futebol mais vistoso (até algum tempo eles eram os ditos “táticos”, “duros”, que só jogavam na “força” e no “lançamento”), enquanto a seleção brasileira esperou a equipe adversária e jogou no contra-ataque.

A partir do jogo tive as seguintes dúvidas que compartilho com vocês: será que nossa forma de jogar foi modificada para enfrentar a Alemanha? Será que essa mudança faz parte do processo? Será que temos uma cultura de jogo? Será que os treinos foram de uma forma e o jogo foi de outra?

Inúmeras perguntas surgiram mas não cheguei a nenhuma afirmação concreta, pois não acompanho o dia-a-dia de treino de nossa seleção. Se alguém tiver essas respostas, me avise.

Até a próxima!

Para interagir com o autor: bruno@universidadedofutebol.com.br  

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