A chegada da geração Y ao mercado já nem é mais tão nova assim. O grupo abarca indivíduos nascidos entre 1979 e o início da década de 1990, crescidos numa época de convergência de tecnologias e de informação, e a ascensão desses profissionais é um dos reflexos mais evidentes do quanto o mundo mudou nos últimos anos. Contudo, a mídia esportiva, conservadora por essência, ainda sofre para assimilar tudo isso.
É como disse o historiador inglês Eric Hobsbawm, em análise publicada em 2009: “Nós ainda não aprendemos a viver no século 21. Ou pelo menos a pensar de uma forma que se ajuste a ele”.
A lógica era baseada em conceitos de economia e na recessão que os países desenvolvidos encaravam, mas ainda se encaixa perfeitamente à realidade da comunicação.
O advento de novas tecnologias modificou e criou plataformas de comunicação, por exemplo. E a mídia ainda tenta entender como se relacionar com isso. Há um caso emblemático na edição da última segunda-feira da “Folha de S.Paulo”, jornal de maior circulação do Brasil.
A última página do caderno de esportes tem relatos sobre uma luta de UFC e uma corrida de Fórmula 1, a despeito de ambas terem ocorrido na madrugada de sábado para domingo (horário de Brasília).
A página remete à estrutura de veículos brasileiros do início do século anterior, época em que o jornal do dia seguinte era o único meio de alguém se informar sobre um evento esportivo.
Atualmente, é quase inimaginável um fã de UFC que tenha chegado à segunda-feira sem ver vídeos da vitória de Anderson Silva no Rio de Janeiro. Ou um torcedor da Fórmula 1 que não tenha lido, ouvido e até produzido análises sobre o triunfo de Sebastian Vettel na Coreia do Sul.
A velocidade e a perenidade das informações nem são as questões essenciais aqui. O cerne da discussão é que a informação deixou de ser um diferencial. Informação virou commodity, e isso é algo que todo profissional precisa entender. Qualquer um pode produzir conteúdo – basta pensar na quantidade de blogs que se tornaram referência.
Há outro aspecto que deve ser considerado: as redes sociais dilaceraram o modelo de produção vigente no jornalismo brasileiro até então.
Se qualquer um tem acesso a informações e pode criar conteúdo, a exclusividade da informação praticamente some. E se qualquer um está a 140 caracteres da publicação, o conceito de agilidade muda drasticamente.
O torcedor ávido por informações, que outrora esperava a chegada do jornal ou da revista, agora pode acessar um infindável número de fontes em blogs, em sites ou em redes sociais.
E pode trocar o papel de simples consumidor da informação por uma função mais ativa: interagir, repassar ou até produzir reportagens, análises e opiniões.
E o jornalismo, como fica? A pergunta, evidentemente, não é exclusividade do esporte. E a resposta, evidentemente, não é nada simples. O mundo ainda passeia por diferentes modelos de abordagem, construção e interação com o público que vive nesse novo contexto.
Se a informação não tem mais dono e a fidelidade praticamente inexiste, há dois alicerces básicos para a marca de qualquer veículo jornalístico: credibilidade e boas histórias. Porque fazer jornalismo é, antes de qualquer coisa, contar boas histórias.
Esse é o cenário que se apresenta atualmente aos jornalistas neófitos. Estudantes, apaixonados ou apenas interessados, os iniciantes na cobertura de esportes têm uma missão ainda mais dura: assimilar de uma só vez a necessidade de encontrar boas histórias, a importância de fazer isso sem debelar a credibilidade (de uma forma ampla, válida tanto para o veículo quanto para o profissional) e a dificuldade de encaixar esses desafios em um mundo que muda constantemente.
Por isso, a formação e o aprendizado necessários para a construção de um jornalista são ainda mais abrangentes do que eram anteriormente. Não basta saber que o público existe e qual é o perfil das pessoas que consomem a informação que você produz. É fundamental saber como atingir essa fatia da população e como criar uma interação sincera.
Também é importante a abordagem sistêmica. Por essência, a geração Y não admite mais abordagens puramente técnicas, que não contextualizem e não relacionem a informação com o mundo. Mas também tem pouca (ou nenhuma) paciência com opiniões rasas.
O consumidor da informação não quer ouvir, ler ou ver coisas que ele considere irrelevantes – afinal, numa época em que informações pululam, é necessário elencar o que é realmente interessante.
Tento dizer tudo isso para todo mundo que me pergunta como é começar no jornalismo esportivo. Tento dizer que analisar um jogo pode parecer simples, mas apresenta um desafio enorme: você precisa falar com diferentes tipos de público, mas não pode ser generalista a ponto de o público achar que sabe mais do que você. Mesmo se isso for verdade.
Tento dizer que a formação ideal para um jornalista esportivo é bem mais abrangente do que um diploma universitário ou uma vida de dedicação ao esporte. Conhecer os meandros do segmento pode ajudar a descobrir histórias, mas certamente não vai ajudar a contá-las.
Por isso, o que eu mais recomendo a todos que me perguntam sobre jornalismo esportivo é que tenham tara por aprender. Nisso, aliás, o novo cenário da comunicação é especialmente didático. Se todos têm acesso a informações e podem produzir, ganha pontos aquele que conseguir acessar mais fontes. E aprender mais, é claro.
Atualmente, humildade para aprender e vontade são duas das características que eu mais valorizo em candidatos de emprego. Num mundo em que todo mundo sabe tudo, é reconfortante ver que ainda há pessoas que não se contentam com o que já sabem.
PS: Aproveito o texto sobre mercado e formação para saudar todos os professores. Os da sala de aula, os das redações e os da vida. Os que se dedicam a ensinar e os que ensinam sem saber. Obrigado!
Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br