A formação, o futsal e a especificidade

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Dia após dia, a discussão sobre a formação de atletas no Brasil vem ganhando força. Do viés administrativo, relacionado à necessidade de investimentos de infraestrutura e aperfeiçoamento gerencial, ao técnico, correspondente à qualificação do corpo técnico e consequente evolução dos métodos de treino, é nítida a movimentação de pessoas, clubes e instituições que buscam e aplicam novos processos no futebol de base.

Diante deste cenário (que não será modificado mesmo com exemplos recentes de incompetência), dentre os inúmeros temas, um sempre gera calorosas discussões: a importância do futsal na formação de atletas.

A corrente de profissionais que defende a prática deste esporte nas idades iniciais da formação, entre 11 e 15 anos, é vasta. Como argumentos a favor da modalidade, referem-se à grande quantidade de ações com bola devido ao menor número de jogadores que o futebol de campo, a necessidade da tomada de decisão mais rápida e o ambiente propício ao surgimento de jogadores habilidosos em função das resoluções de problemas em espaços reduzidos.

Os argumentos utilizados seriam inquestionáveis se não estabelecessem comparativos com o futebol de campo. Ou seja, praticar futsal pode proporcionar um bom número de ações com bola, melhorar a tomada de decisão e favorecer o aparecimento de jogadores habilidosos, porém, comparar o efeito da prática desta modalidade com o futebol significa desconsiderar o princípio básico do treinamento esportivo: a especificidade.

As competências exigidas para jogar bem futsal são distintas das exigidas para jogar bem futebol de campo. Para exemplificar, a frequente pisada na bola para recepcionar um passe e a ausência da regra do impedimento são dois dos elementos que diferenciam, significativamente, um jogo do outro.

Sabemos que um dos objetivos das categorias de base é aumentar o nível de inteligência de jogo dos praticantes de acordo com as tendências do futebol moderno, para que, concluído o período formativo, o atleta esteja apto a jogar em alto nível no futebol profissional. Se, durante o referido período de formação um atleta concorre à aprendizagem do futebol de campo com a prática do futsal, horas preciosas para a expertise serão perdidas.

Então, se o futsal é prejudicial (ou menos benéfico) na formação de atletas, qual é a solução?

A solução consiste em adaptar o futebol formal (alterando regras, número de jogadores, espaço, forma de pontuar, etc) criando jogos que favoreçam a aquisição de competências específicas do futebol. E isso é bem diferente de jogar futsal…

Dos 11 aos 15 anos, os atletas devem aprender sobre o funcionamento da unidade complexa (equipe) progressivamente, se aproximando do 11×11. Sendo assim, quanto melhor a compreensão do jogo coletivo, melhor a manifestação das competências essenciais (relação com a bola, estruturação do espaço e comunicação na ação). E tal manifestação deve compreender elementos incomuns no futsal; eis alguns deles: reposição do goleiro com os pés; sair jogando com goleiro, linha de defesa e volantes; circular a bola com volantes, meias e atacantes; defender e atacar em bolas paradas; variação das plataformas de jogo com três linhas de jogadores, além do goleiro; realização de ações táticas de ultrapassagem, penetração e tabelas; organização ofensiva e defensiva em cruzamentos; cumprimento de uma posição no campo de jogo (que não é fixo, ala ou pivô).

O processo de ensino-aprendizagem-treinamento é maximizado se os atletas são submetidos a estímulos adequados. A aplicação destes estímulos exige um profundo conhecimento teórico-prático de quem assume o compromisso pedagógico de, como afirma João Batista Freire, ensinar bem futebol a todos.

Para os críticos que defendem que o surgimento de inúmeros craques brasileiros advém do futsal, não esqueçam que durante a iniciação esportiva (até os 10 anos de idade), todo e qualquer ambiente que seja possível brincar de bola com os pés é enriquecedor para o aprendizado do futuro esportista e, passada esta faixa etária, na transição da iniciação para a especialização, para formarmos grandes jogadores de futebol, precisamos de praticantes de futebol. Se muitos craques vieram do futsal, imaginem quantos mais não teríamos na atualidade se ensinássemos melhor o próprio futebol de campo?

A mínima fração de tempo que envolve a precisa tomada de decisão do craque aliada à capacidade de resolver problemas imprevisíveis circunstancialmente deve ser muito estimulada. No futsal, os estímulos são de outro jogo, que exige outras competências e, acima de tudo, tem outra lógica! Que façamos como muitos clubes, pessoas e instituições e não desperdicemos o precioso tempo da formação!

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br

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