Uma invasão, diferentes versões

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Afinal, o que aconteceu com Paolo Guerrero no dia 1º de fevereiro deste ano? O centroavante do Corinthians foi esganado por torcedores que invadiram o centro de treinamento do clube, apenas conversou com o grupo ou chegou a tentar intimidar o grupo? A versão sobre esse episódio mudou várias vezes desde o incidente. Entre os erros de gestão cometidos por todas as partes no caso, talvez o principal tenha sido a comunicação.

Recapitulando: no dia 1º de fevereiro, um sábado, um grupo de torcedores do Corinthians invadiu o centro de treinamento do clube para protestar por causa de maus resultados da equipe alvinegra no Campeonato Paulista.

Quando os torcedores invadiram, a maioria do elenco ainda estava nos vestiários – apenas os goleiros trabalhavam no campo. Segundo relatos de funcionários do Corinthians, houve uma correria generalizada. Atletas ficaram trancados por horas em uma sala, sem acesso a comida ou bebida. Guerrero, que estava no corredor e foi o último a entrar no local, foi interpelado diretamente pelo grupo.

O presidente do Corinthians, Mario Gobbi, disse que “Guerrero foi esganado por torcedores”. O clube incluiu essa agressão no relato feito ao Ministério Público e ao Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), órgão ligado à Polícia Civil. No último domingo, o peruano negou que isso tenha acontecido e relatou apenas uma conversa com o grupo de adeptos. Romarinho, companheiro dele no ataque alvinegro, foi questionado sobre as duas versões. Saiu-se com uma terceira, sobre Guerrero ter levantado o tom de voz para os torcedores.

Além disso, há relatos de que três celulares teriam sido roubados no dia da invasão. Um deles, o rádio do meio-campista peruano Luis Ramírez, com uma agenda repleta de contatos do departamento de futebol da equipe paulista. Isso teria desencadeado uma série de ameaças a jogadores e até a parentes deles. O Corinthians nega.

O problema de comunicação do Corinthians no episódio, na verdade, começou no dia da invasão. A polícia foi chamada, mas os funcionários do clube não descreveram todo o cenário. Por causa disso, nenhum torcedor foi preso em flagrante.

Depois, começaram a circular diferentes versões sobre o caso. As incoerências pululam em falas de jogadores, dirigentes, funcionários e torcedores. Sobretudo porque apenas duas das 22 câmeras de segurança do CT estavam funcionando normalmente no momento da invasão – e elas só mostram imagens do grupo de adeptos entrando no local.

No dia posterior à invasão, o técnico do Corinthians, Mano Menezes, foi questionado sobre o que havia acontecido. Respondeu apenas que as imagens eram claras e que dariam uma noção exata do episódio.

Jogadores e funcionários do Corinthians têm repetido que a invasão foi muito pior do que se sabe e que podia ter tido um desfecho trágico. Torcedores, por outro lado, dizem que o incidente foi muito mais leve do que se tem notícia.

Em situações assim, o primeiro passo para um clube é obrigatoriamente a criação de um plano de gerenciamento de crise. E qualquer gerenciamento de crise depende de um controle sobre as informações.

O Corinthians precisava ter reunido uma equipe ainda no CT, no dia da invasão, para decidir o que seria comunicado a cada esfera. O time devia ter montado planos específicos para mídias, polícia e para a própria cúpula.

Esse plano devia ter sido feito de forma estratégica. Por exemplo: era relevante a imprensa saber tudo que aconteceu ali? E qual era a melhor abordagem para relatar o caso aos dirigentes do clube?

A partir de um plano do que seria dito, o Corinthians devia ter adotado uma preocupação gigantesca com o que não podia ser dito. A blindagem é um tópico nevrálgico em qualquer estratégia para gerenciar crises.

Por último, o Corinthians devia ter pensado em que tipo de efeito o clube imaginava que a invasão precisava ter para as relações institucionais. Ao dizer que torcedores esganaram o centroavante titular da equipe, por exemplo, Gobbi criou (mais) animosidade entre o time se os torcedores.

A invasão de um local de trabalho é um ato condenável, e isso precisa estar claro. A partir disso, é precipitado fazer qualquer análise sobre o que aconteceu no dia 1º de fevereiro. A ausência de provas e a total inexistência de um plano de gerenciamento de crises impedem isso.

O tamanho do estrago que esses problemas causam é mais do que claro. Ao entregar uma versão cheia de furos e com pouca sustentação às autoridades, o Corinthians não conseguirá nenhuma punição severa aos invasores. O clube ainda não conseguiu sequer determinar se isso seria necessário, aliás.

Discutimos constantemente por aqui o quanto a gestão do futebol brasileiro precisa evoluir e o quanto a comunicação faz parte desse diapasão. O episódio do dia 1º de fevereiro é uma demonstração perfeita disso.

Sem uma estratégia clara, o Corinthians não consegue nem precisar o que acontecerá com o clube a partir da invasão. A relação com torcedores será abalada? Os jogadores ficaram com medo de defender a equipe? Alguém facilitou a invasão? Um dos adeptos disse à polícia que entrou pela porta da frente.

Os torcedores do Corinthians cometeram um erro gigantesco ao invadir o CT do clube. As maiores falhas da história, contudo, foram da própria equipe. O ponto agora é tentar descobrir por quê.

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