O conceito de periodização aplicado ao jogo de futebol, cada vez mais, tem sido adaptado à nova forma de interpretação da realidade (visão sistêmica) e também a característica competitiva da modalidade, que inviabiliza uma preparação que tenha como objetivo isolados picos de forma ao longo de uma temporada.
Posto isso, modelos de periodização com ênfase na vertente física, amplamente aplicados em equipes de futebol (em todos os níveis) podem ser considerados obsoletos.
Como exemplo, a periodização convencional em bloco, proposta por Verkoshansky:
MODELO GERAL DE TREINAMENTO DE VERKHOSHANSKI
Como características gerais deste modelo geral de treinamento, podem ser apontadas:
• Evolução em relação à periodização clássica de Matveev (que dividia a temporada em três grandes períodos)
• Defende a individualidade da carga de treinamento
• Possibilita o desenvolvimento consecutivo de capacidades, utilizando o efeito residual de cargas já trabalhadas;
• Dá ênfase ao trabalho no regime motor específico;
• É também conhecida como preparação em Blocos A, ou de preparação de base (voltado para o aumento da força especial), B, ou de preparação especial (voltado para o aumento da velocidade de execução no exercício da competição e na capacidade técnica e C, ou de competições mais importantes (voltado para o máximo nível de potência no regime motor específico), que variam em função do tempo de preparação para a competição;
• Possibilita o alcance de vários picos de forma a serem atingidos ao longo da temporada (em várias competições).
Grandes estudiosos perceberam que esta forma de distribuir os objetivos e conteúdos de treino não atendiam as demandas do futebol e então apresentaram novas propostas de preparação para o jogo.
Surge em Portugal, com o intuito de periodizar o Modelo de Jogo, a Periodização Tática, criada por Vítor Frade e que tem o pensamento complexo como referencial teórico.
MORFOCICLO PADRÃO DA PERIODIZAÇÃO TÁTICA
Dentre as características desta periodização, destacam-se:
• A componente tática surge como núcleo central da preparação;
• Estabelece um modelo de jogo adotado com coordenação própria e com as dimensões físicas, técnicas e psicológicas subjugadas à tática;
• Centra-se no desenvolvimento do modelo de jogo da equipe a partir das ideias de jogo do treinador, fundamentadas na desmontagem e hierarquização dos princípios de jogo (em sub-princípios e sub-subprincípios);
• Forma desportiva coletiva qualitativa que tem como referência básica o ato de jogar melhor o jogo de futebol.
• A PT destaca três pressupostos metodológicos básicos: Progressão Complexa que implica em progredir complexamente o jogar da equipe a partir de exercícios que considerem o nível de jogo atual e o pretendido; Alternância Horizontal em Especificidade que envolve a operacionalização do Morfociclo Padrão, caracterizado pelo jogo, dias recuperativos e dias aquisitivos; e Princípio de Propensão que cria exercícios que tornam propensas ocorrências de determinados comportamento que, repetidos sistematicamente, poderão tornar-se hábitos.
• O pico de forma deve ser semanal.
O treinador Rodrigo Leitão também desenvolveu um Modelo de Periodização, denominada como Periodização Complexa de Jogo e que seu microciclo assim se apresenta:
MICROCICLO DA PERIODIZAÇÃO COMPLEXA DE JOGO
O Jogo, em sua essência, é o núcleo central da preparação, que apresenta como principais elementos:
• As dimensões do jogo (física, técnica, tática, psicológica, sociocultural, etc.) estão subordinadas a lógica do jogo;
• O modelo de jogo não tem fim em si mesmo (ele é um dos meios para o cumprimento da lógica do jogo);
• Visa desenvolver a inteligência circunstancial individual e coletiva de jogo;
• Forma coletiva em constante progressão, avaliada de maneira qualitativa e quantitativa, tendo como referência o jogar melhor o jogo de futebol – circunstancialmente.
É muito difícil ser preciso sobre a forma como estes conhecimentos tem chegado às universidades e aos clubes de futebol brasileiros. Em diversos e-mails que recebo, de alunos de graduação ávidos por conhecimento, é mencionada a limitada oferta de conhecimento proposta pelas disciplinas relacionadas ao futebol. Somam-se a este fato, o constante ingresso de novos profissionais na modalidade sem a devida preparação teórica, a não atualização dos profissionais atuantes e as ainda embrionárias iniciativas de capacitação profissional em nosso país.
Os efeitos sistêmicos de todo este cenário são inúmeros. Apenas um deles é a constatação (divulgada por um companheiro de profissão nas redes sociais) de que o país do futebol (???) tem predominância de zagueiros e laterais na Champions League 14/15. Dos 80 brasileiros na competição, 39 (48,75%) são jogadores da linha de defesa. Um dado relevante se comparado aos somente 11 jogadores de ataque (13,75%) num país que é (e sempre será???) mundialmente conhecido pelo poder ofensivo.
Para concluir, os poucos parágrafos supracitados não são suficientes para aprofundar o conhecimento sobre os atuais modelos de periodização. Muita leitura, revisões, discussões e prática são fundamentais para que o nosso “espiral de conhecimento circunscrito” se desenvolva. Caso alguém tenha interesse, posso compartilhar alguns materiais de estudo.
Ah: outro efeito sistêmico foi o 7 a 1. Ou vocês acreditaram que foi um apagão?