Estão em andamento as reuniões entre integrantes dos clubes da série A e da série B do Brasil para implementar, a partir de 2020, as regras para um “fair-play” financeiro. Em outras palavras e sem estrangeirismos, um jogo limpo financeiro, uma normatização para boas condutas no uso dos recursos dos clubes de futebol. Para que não gastem mais do que arrecadam. Os que descumprirem com as regras, serão punidos.
É o que acontece no futebol europeu: o Barcelona já foi punido por conta disso e o Milan está excluído de torneios intercontinentais por infringir as normativas de lá. Na França existe já esta regra há muito tempo: os clubes não podem terminar o ano “no vermelho”. Era inclusive uma explicação do porquê o futebol francês não ser tão badalado quanto o dos vizinhos Espanha, Alemanha e Inglaterra. Isso mudou com a entrada de investidores estrangeiros, por exemplo, árabes no Paris e russos no Mônaco.
Ingênuo pensar que boa conduta financeira é apenas não gastar mais do que se arrecada e apenas isso. Vai além. O “fair-play” financeiro, a prazo, fará com que os clubes otimizem os seus gastos e priorizem alguns setores, não apenas para os resultados dentro de campo, mas sim resultados organizacionais que proporcionem um alicerce sustentável para a existência do clube futuramente. Favorecerá o desenvolvimento dos seus colaboradores e os seus recursos internos. Com o tempo e com as restrições de orçamento, estabelecerá identidade e cultura de trabalho na instituição, que passará a recorrer mais às categorias formativas. Com o passar dos anos, estes jogadores da base subirão ao plantel principal com esta filosofia e com esta identidade de trabalho. Um bom futebol: sem constantes trocas de treinadores e contratos de poucos meses com futebolistas.
Nessa linha de pensamento, o profissionalismo será valorizado, o cumprimento de metas, a gestão em torno do ambiente do mercado, o trabalho com vistas ao seu público-alvo (sua torcida) e não para grupos de influência internos, que valorizam quem põe mais dinheiro uma vez que as contas não fecham, já que são necessários os resultados esportivos. Custe o que custar. Essa lógica equivocada do “custe o que custar” compromete obviamente as finanças dos clubes e geram mais desavenças organizacionais que afastam quaisquer lampejos de profissionalismo. Exemplos dessa falta de gestão no futebol do Brasil são vários e afetam grandes instituições.
Há quem possa dizer: “meu time não é banco. O meu clube não é banco para fechar ‘no azul’”. Ora, exemplos não faltam de péssimas gestões que arruinaram clubes. O torcedor que diz isso quer ver a existência do clube comprometida? Não. Quer ver a gestão do clube do coração nas mãos de um “cartola” que, à moda antiga, investe recursos sem fim em troca de favorecimento político e que, aos poucos, “manda” neste clube? Com o tempo este torcedor acaba se afastando. Certamente não quer isso.
Assim sendo, o “fair-play” financeiro é mais do que boas práticas na lida com os recursos dos clubes. É um ponto muito a favor para a governança, profissionalismo, comunicação e transparência das entidades esportivas. Especialmente as do futebol, a fim de valorizar o produto (o esporte), atrair e cativar mais torcedores e investidores.
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No passado mês de agosto completei 2 anos como colunista neste espaço. Quero agradecer à Universidade do Futebol pela confiança e a todos os leitores pela paciência e “audiência” na leitura desta partilha de ideias e reflexões. Obrigado pelo carinho!
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Em tempo mais uma citação que se relaciona com o tema da coluna:
“Esforce-se não para ser um sucesso, mas sim para ser de valor”.
Albert Einstein