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No dia 4 de julho de 2023 a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) anunciou a contratação de Fernando Diniz e sua comissão técnica para comandar interinamente a seleção brasileira masculina principal de futebol. Escolha dupla, podemos dizer, porque também Fernando Diniz escolheu ser o técnico da seleção brasileira, considerando que ele tinha escolhas, uma vez que era, e continuou a ser, técnico do Fluminense F.C. Para nós, foi uma escolha acertada; não é segredo, para quem nos acompanha lendo nossos textos ou assistindo nossas aulas e palestras, nossa admiração pelo trabalho de Diniz. Recentemente publicamos “Quando o novo incomoda” e “O futebol como prática educativa”. Em ambos os artigos sugerimos que Fernando Diniz é um educador e representa o novo, a mudança.   

Diniz vai além da definição de esquemas táticos. Sua percepção de futebol não se limita a esquemas regidos por setas e cálculos matemáticos. Sua análise do futebol agrega ao racional uma profunda percepção emocional e social. Seus jogadores também são seus alunos e pessoas que existem fora do futebol. Sua equipe é um grupo social que tem vida própria enquanto grupo. É com essa perspectiva que o novo treinador da seleção brasileira de futebol ajudará seus jogadores e resolverem conflitos pessoais e profissionais, dentro e fora do campo. 

Diniz não esconde que muito de sua educação, no futebol e fora dele, foi realizado na rua. Foi nela que aprendeu o valor da criatividade. Ser criança jogando no asfalto, nos campinhos, na terra ou na lama ensina, a uns mais, a outros menos, a criatividade que os padrões rígidos das chuteiras e rotinas de exercícios de muitas escolas e equipes de base não permitem. O novo treinador da seleção brasileira conhece profundamente a rua e seus ensinamentos e sabe perfeitamente levar para suas equipes as virtudes dessa rua e a evitar seus vícios. 

Por sua vez, ao caracterizarmos Fernando Diniz como um agente de mudança, nutrimos nossa esperança de que o futebol brasileiro volte a ser encantador, alegre e criativo.  Muito se fala, há anos, da necessidade de retomarmos em nossa seleção o estilo de jogar tipicamente brasileiro. Aquele que nos dá identidade esportiva. Aquele que nos fez sermos reconhecidos mundialmente como o “país do futebol”. Se este está entre os motivos que balizaram a contratação de Fernando Diniz, a CBF acertou em cheio! Não há no Brasil, e provavelmente no restante do mundo, melhor treinador para alavancar a retomada de nossa identidade futebolística. 

Vale lembrar que, por exemplo, em 1958 fomos campeões mundiais de futebol com jogadores que aprenderam a jogar futebol na rua. Esse é um dos motivos de vermos equipes comandadas por Diniz enchendo nossos olhos com um futebol alegre e criativo. Isso não significa que as equipes desse competente técnico vencerão sempre, pois que futebol é um jogo, e um jogo é marcado, acima de tudo, pela imprevisibilidade. Há treinadores, e não são poucos, que jogam para não perder. Colocam o medo de perder como tema orientador de seus trabalhos. O resultado é um jogo tedioso, triste e feio. Diniz, por sua vez, não recusa o risco, sabe que ele faz parte do jogo, mesmo que o preço, por vezes, seja a derrota. 

Com um futebol parecido com os jogos de bola que tantos de nós praticamos nas ruas, nos campinhos de terra, nas quadras de cimento, o Brasil foi a grande estrela do futebol mundial, de 1958 a 2002. Nunca um país teve tal domínio no esporte mais popular do planeta. Um futebol que, trazido da Europa para os clubes da elite econômica das grandes capitais brasileiras, foi reinventado pela população mais pobre do Brasil. Essa população, encantada pela nova modalidade esportiva, que podia ser jogada com qualquer coisa que rolasse no chão sob o controle dos pés, foi a inventora de um novo jogo jeito de jogar futebol, um jeito tipicamente brasileiro. De 2002 para cá, fomos “perdendo o pé”, perdendo o nosso jeito de fazer diferente no futebol e nos tornando cada vez mais parecidos com europeus. E descobrimos que os europeus são melhores europeus que nós, embora alguns ainda não consigam perceber isso. 

Entretanto, não basta querer retomar nossa identidade. Para isso precisamos ter no comando alguém plenamente identificado com isso. Em nossa opinião, Fernando Diniz é esse alguém. Diniz incentiva o drible, propõe o risco, estimula a criatividade e, quando seu jogador erra, faz com que ele tente de novo e de novo, para que a coragem de tentar supere o medo de errar. Nos times de Diniz, todos constroem, todos criam, pois que Diniz reconhece que seus jogadores não são menos inteligentes que ele. Enquanto boa parte dos treinadores preocupa-se, permanentemente, em controlar todas as variáveis do jogo, Diniz reconhece o caráter coletivo, caótico e imprevisível do futebol. Mais que procurar domesticar o jogo, ele procura lidar com sua imprevisibilidade. 

Para pessoas tão abertas ao risco e ao novo como Fernando Diniz e seu jovem auxiliar técnico Eduardo Barros, há, ainda, muito espaço para crescimento e amadurecimento. Sabemos que eles reconhecem isso e, juntos, seguirão evoluindo.

Texto por: Rafael Castellani e João Batista Freire

*Este é um conteúdo independente e não reflete, necessariamente, a opinião da Universidade do Futebol.

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