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Casal conversa em um quarto de uma casa em Belo Horizonte…

– Dario, pode dormir, querido.

– Não, meu amor. Vai que tudo isso é sonho. Vai que o Galo perde a Libertadores quando eu acordar.

– Você me chamou de “amor”, Dadá?

– Foi sem querer, mulher. Você sabe que você é meu “bem”, benhê. “Amor” é o Galo. Só o Atlético.

– Sabia… já estou acostumada… Mas é bom você dormir, Dario. Você vai acabar morrendo disso.

– Eu vivo pelo Galo, bem. Jamais vou morrer por ele. Só não posso é fechar os olhos. Só tenho medo de tudo que eu vi no Mineirão não ser verdade. Tudo que eu senti na Libertadores e no Horto se perder se eu fechar os olhos. Medo de que não poderia olhar diferente para aquelas mesmas traves malditas dos pênaltis do Brasileirão de 1977! As traves que agora viram a bola do título estourar em uma delas.

– Vai por mim, Dadá. O Jô vai fazer um gol deitado de pé direito. O Leo Silva vai fazer um gol de cabeça contra o grande goleiro Martín Silva. A bola vai bater um milhão de vezes na trave. Vai ter um pênalti não marcado para nós. O Alecsandro vai perder um gol no final. O Victor vai defender um pênalti com o pé esquerdo de novo. Vai adiantar desta vez se adiantar. O Cuca vai comer grama no último pênalti. A torcida vai gritar que acredita até quando ninguém mais acredita. Eu conheço vocês, atleticanos. Eu amo um atleticano. E sei que ninguém ama como um atleticano.

– Você não entende, benhê. São muitos anos em que eu fechei os olhos por não acreditar no que fizeram com meu Galo. Gente de fora, gente boa, gente ruim, gente de dentro. Todo mundo depenava meu time. Muitas vezes dormi campeão e acordei sem nada. Só com o Galo.

– Mas ele é tudo para você, Dario. Não precisa de título, meu amor.

– É. Mas faltava sempre alguma coisa. Não para eu ser mais atleticano, que isso é impossível. Mas faltava alguma coisa para os campeonatos serem mais atleticanos.

– Fecha os olhos, Dario. Você merece.

– Quem merece são os atleticanos. Todos eles. Todos nós. Já perdemos muitos títulos. Mas poucos clubes ganharam o torcedor, o respeito e o amor que nosso clube tem. Poucas Libertadores tiveram um time tão campeão quanto o nosso. Raras tiveram tanta gente torcendo por um time como o nosso.

– Mas você bem que não estava mais acreditando no time, né? Fala a verdade!

– Nunca! Eu sabia que dava para eliminar o São Paulo depois da derrota no Morumbi na fase de grupos.

– Sei…

– Eu sabia que o Victor defenderia aquele pênalti contra o Tijuana!

– A-ham…

– Eu sabia que alguém faria o gol que o Guilherme fez.

– Claaaaro…

– Eu tinha certeza que iríamos virar nos pênaltis contra o Newell´s…

– Sim, queridinho…

– Eu sabia que iríamos devolver a derrota no Paraguai! Que “cavalo paraguaio” era alguma cavalgadura do bairrismo brasileiro.

– Dario, pode fechar os olhos. Juro que fecho os ouvidos para o que você está inventando…

– Eu sabia que com o papa no Brasil estava no papo! Eu sabia que a Missa do Galo começa sempre no dia 24 e faz a festa divina por todo o dia 25! A missa e a massa do Galo são eternas!

– Menos, Dario, menos…

– Bem, você não entende de futebol. Menos ainda de Galo.

– Dario, amando um atleticano eu comecei a amar um pouco mais o futebol. Comecei a entender que a gente não entende nada de futebol.

– Mas, benhê, você entende mais que os maldosos que acham que todas as derrotas são eternas. São nada! Eternas são as vitórias! Eterno é meu amor que não precisava ser campeão da América. Não precisa ser campeão do Brasil. Não precisa ser campeão mineiro. Não precisa ser campeão de Belo Horizonte. Nem do Horto e nem de Lourdes. Eterno é ter no coração o Galo.

– Dario, e agora? Como vai chamar nosso primeiro filho: ainda bem que não é menina, por que Kafunga ou Mussula seriam dose… Então… Que tal Reinaldo Victor?

– Eu quero mesmo um nome de santo.

– Ou Reinaldo Ronaldo?

– Eu quero um nome de craque.

– Reinaldo Bernard?

– Eu quero um menino bom de tudo.

– Reinaldo Leo?

– Eu quero um filho que use bem a cabeça.

– Reinaldo Réver?

– Eu quero um cara que defenda tão bem a nossa família.

– Reinaldo Guilherme?

– Eu quero um filho predestinado.

– Reinaldo Jô?

– Eu quero um menino bem posicionado.

– Reinaldo Diego?

– Eu quero um moleque que acredite em todas.

– Reinaldo Pierre?

– Eu quero um garoto que se mate por nós.

– Reinaldo Leandro Donizete?

– Eu quero um garoto que faça tudo certo com discrição.

– Reinaldo Richarlyson?

– Eu quero um filho que faça tudo em vários lugares.

– Reinaldo Marcos?

– Eu quero um moleque que ataque o tempo todo.

– Reinaldo Rosinei?

– Eu quero um cara para virar o jogo.

– Reinaldo Gilberto?

– Eu quero um grande atleticano campeão do mundo e da América.

– Reinaldo Josué?

– Eu quero um campeão de tudo.

– Reinaldo Alexis?

– Eu quero alguém que seja ótimo, e responda pela bola, e não pela boca, com muita Cuca e muita alma.

– Reinaldo o que mais, Dario?

– Podia ser Reinaldo Telê. Atleticano campeão em 1971. Atleticano que também um dia foi chamado de pé-frio…

– Bem, eu quero que ele seja Reinaldo, sim. Como eu quero sempre a felicidade que você tem todo dia não por ser campeão, Dario. Mas por ser Galo a vida toda.

– Mais que tudo, benhê, eu quero que quando nascer o nosso primeiro filho, que está nessa barriguinha desde fevereiro, eu possa pegá-lo no colo como o nosso time pegou a taça de campeão de América, e embalá-lo com a mesma emoção e paixão. Para poder falar no ouvidinho dele:

– “Você é campeão, filho”.

– Não, benhê. Só vou dizer uma frase…

– “Você é atleticano, filho”.

– Isso, mulher! Você é meu amor!

– Você é atleticano, Dario.

– Nós somos agora o que sempre fomos. Campeões. Eu, você, e o Reinaldo Libertador.

(P.S.: Eu, Leonardo Bertozzi e Mario Marra lançaremos em semanas “Nós Acreditamos”. Pela BB Editora. Um livro de dois atleticanos jornalistas, um palmeirense jornalista. Uma obra que sairia mesmo se não desse Atlético. Por que o que valeu foi a jornada. Campeã de tudo.)

 

Para interagir com o autor: maurobeting@universidadedofutebol.com.br

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet.

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