O processo de formação de jogadores de futebol, no Brasil, ao longo de sua história, foi muito mais intuitivo do que planejado estratégica, cientificamente e pedagogicamente.
Com efeito, a origem multifacetada dos garotos que ascendem das categorias de base dos clubes dificulta a construção de uma metodologia consolidada e condizente com sua história e perfil sociocultural, bem como, econômico.
Dificulta, mas não deveria impedir.
Não são poucos os clubes brasileiros com um belo histórico de formação de grandes jogadores. São Paulo, Santos, Cruzeiro, Grêmio e Internacional, atualmente, são os maiores expoentes. E têm faturado muito dinheiro com transferências internacionais de jogadores a partir da década de 1990, quando se deu a explosão deste fenômeno.
O Internacional acaba de fechar um acordo de colaboração com o Tottenham (da Inglaterra). O que querem os ingleses? Saber quais são os segredos do clube na formação em série de ótimos jogadores.
Fora deste eixo, Vitória, Paraná Clube e, até mesmo, o América-MG, para citar exemplos, tornaram-se referência na revelação de talentos. Os dois primeiros até figuraram em competições regionais e nacionais com competência.
Entretanto, com a velocidade ditada pela globalização mundial – e o futebol é o fenômeno que melhor lhe representa e dela faz bom uso – a grande maioria dos clubes no Brasil negligenciou suas receitas caseiras de formação de jogadores e ficaram condicionados à linha de produção em larga escala, exigida pelos mercados compradores.
O grande problema reside no fato de que não conseguiram valorizar justamente aquilo que sempre diferenciou nosso país e o tornou sinônimo de bom futebol: ter um padrão mínimo de qualidade nessa metodologia de formação.
O resultado é que se confunde formação com revelação. Temos revelado, ainda, bons jogadores. Mas em número cada vez menor, apesar do volume de transferências ao exterior ter crescido.
O grande sintoma da falta de sustentabilidade desse modelo é que, também, o número de repatriados aumenta a cada ano. Por um lado, bom para que nossas competições se fortaleçam com melhor nível técnico. Por outro, o perigo de que se comece a perceber que jogador brasileiro “é tudo igual”, mas pelo lado ruim…
Robinho ilustra boa parte dessa história.
Não há um verdadeiro método de formação de jogadores consolidado no Brasil. Não conseguimos capturar nossa essência e transformá-la numa linha de produção de nível internacional.
O renomado professor João Paulo Medina defende que o futebol brasileiro é forjado em três cenários: a praia, a rua e o futsal. O conjunto deles é que faz imprimir a marca do futebol brasileiro nos jogadores.
Acrescento, modestamente, a necessidade de um componente pedagógico na formação. Isso mesmo, ensinar regras, tática, comportamento, disciplina, aprendizado humano mais amplo, além da própria educação formal nos colégios. Esquece-se da valorização do ser humano, fundamental para formar, e não apenas revelar.
Em recente conversa com um treinador italiano, dizia-me que, em sua época de jogador sub-20 do Genoa, todo mês os boletins escolares eram avaliados pelos dirigentes, como em muitos clubes italianos.
Numa dessas, mesmo ele sendo capitão da equipe, por estar com notas baixas, treinou a semana inteira, mas não jogou no fim de semana.
Não é exagero, portanto, o que se escuta sobre o nível de exigência profissional dos clubes europeus.
Devemos repensar a receita do nosso pão caseiro. Não esquecer a sua essência. Ao contrário, aproveitar-se dela com sabedoria e organização.
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