Tenho defendido aqui nesse espaço, o entendimento do jogo de futebol sob o ponto de vista da complexidade; e da mesma forma, a preparação desportiva do futebolista.
Isso quer dizer, que, ao invés de buscar compreender o futebol a partir de simples relações de causa e efeito, defendo a idéia de que precisamos reconhecer que existe um emaranhado de variáveis, áreas e dimensões presentes no jogo, que se inter-relacionam e que interferem e sofrem interferência direta umas das outras (de maneira que explicar um evento (fenômeno) qualquer do jogo, requer conhecimento de cada uma dessas variáveis, áreas, dimensões, individualmente e de todas juntas (o todo) ao mesmo tempo).
Como bem disse Edgar Morin, a soma das partes de um sistema pode ser maior, menor, ou igual ao todo.
Pois bem.
A forma de treinar os jogadores está intimamente ligada a forma com que os responsáveis pela preparação desportiva dos futebolistas, enxergam o jogo.
Isso quer dizer que o modelo de treinamento de equipes e jogadores de futebol pode ser tão reducionista quanto reducionista for a forma de se conceber o futebol.
Um grande avanço na modelação do treinamento desportivo no futebol, está associado a percepção de que as manifestações físicas, técnicas, táticas e psicológicas no jogo estão integralmente ligadas, de maneira, que sua separação é apenas algo didático para a compreensão das particularidades das mesmas.
E se estão integralmente ligadas no jogo, devem estar integralmente ligadas no treino (“jogo é treino e treino é jogo”).
Queria chamar a atenção, porém, motivado principalmente por alguns debates com o professor João Paulo Medina, para algo que apresentei em minha tese de doutoramento, e que por mais que muitas vezes estivesse implícito nos argumentos em outras ocasiões, creio ser importante, nesse momento ressaltar.
Para melhor compreensão do jogo de futebol, e também modulação da preparação desportiva do futebolista, não podemos considerar as dimensões “física, tática, técnica, psicológica”, desvinculadas de uma dimensão “sócio-cultural”!
E talvez esteja aí, um dos segredos para alguns fracassos de propostas inovadoras que têm tentado permear o paradigma da complexidade, e o sucesso de outras, que mesmo engessadas em conceitos arcaicos, conseguem ter maior sensibilidade para a dimensão sócio-cultural e conseqüentemente fazer o trabalho fluir melhor.
Quando a dimensão sócio-cultural é negligenciada dentro de um processo, questões de grande importância começam a aflorar, e com elas, problemas agudos, que podem emperrar todo o desenvolvimento do trabalho.
Se a ação do treinador transcende o método, como defendeu o professor Hermes Balbino em sua tese de doutoramento, não é possível que aspectos que estão ligados a forma com que os jogadores vêem o mundo, desenhada por toda sua bagagem cultural, possam ser esquecidos ou desconsiderados por aqueles que gerem equipes. A equipe como todo, pode amplificar e reforçar visões de mundo dos jogadores que a compõe.
Mas, mesmo a ação do treinador, está subordinada a transdimensionalidade do jogo, e por conseqüência, aos aspectos sócio-culturais de jogadores e equipes. Então, a concepção do método pode também, em ambientes específicos, avançar a ação do treinador (mas isso já é outra discussão).
O que não devemos perder de vista é que sob a perspectiva da complexidade não podemos negligenciar a dimensão sócio-cultural do futebol.
Então, na preparação desportiva do futebolista, temos que conceber treinos integrados e integrais que levem em conta as dimensões “física, técnica, tática, psicológica e sócio-cultural”, o tempo todo, e ao mesmo tempo.
Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br