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A Pandemia impactou o mundo, transformou o modo de pensar a vida e hábitos da grande maioria de sua população. Também mudou os cenários corriqueiros em momentos de dúvidas e tensão, e o “normal” já não era mais o mesmo, criou-se a instabilidade dos fatos, nos deixando frente à fragilidade humana. O caos se instalou.

Hoje, estamos tendenciosos a ter uma visão mais atenta para o todo. Já ao o próximo, temos uma empatia traduzida que ao cuidar de mim, influencio diretamente o cuidado com o outro. Entretanto, até parece que esse aprendizado é uma competência comportamental básica demorada para assimilar. Agora, novos gatilhos emocionais foram acionados, dessa forma seguimos aprendendo e nos adaptando.

No futebol não foi diferente, o caos chegou, e pela primeira vez na história, tudo parou! Sim, estamos diante de um “novo normal”, que exige um poder de adaptação e reação nunca visto antes, trazendo para dentro nós traduções de novas referências mentais e novos sentimentos, que até então, não faziam parte das nossas lembranças.

Diante do protocolo obrigatório de segurança por conta da pandemia, os estádios estão vazios, os treinos iniciaram de forma individual e em casa, os vestiários e áreas internas dos clubes foram fechados, os colaboradores dos centros de treinamentos reduzidos para menor circulação de pessoas, os atletas e comissão têm uso obrigatório de máscaras protetoras e estão fazendo exames semanais do COVID. Junto com quem precisa sair para trabalhar, muitas vezes, vem o medo, medo de se expor ao vírus, medo de expor a família e de transmitir para algum ente querido sem se quer saber da sua própria contaminação.

Inseguranças e probabilidades obscuras são sentimentos que passaram a fazer parte do dia a dia dos atletas – que são antes de tudo seres humanos. Sim, seres humanos!!!

 Pode-se pensar que para a grande maioria da população mundial, apaixonada por futebol e que espera o grande espetáculo, dia de jogo do seu time, esta “visão de que o atleta é um ser humano comum a todos”, pode não ser tão facilmente absorvida, afinal, ele está lá se apresentando, “fazendo sua obrigação profissional” e esta é a parte da vida do atleta (quando ele está em jogo) que muitas vezes é facilmente julgada, pela grande maioria.

 Pois bem, talvez hoje o atleta possa ser percebido mais facilmente como um ser humano, que também sente medos, inseguranças, dores e dificuldades.  O jogo mudou fora e dentro dos gramados também, o cenário está diferente. As arquibancadas estão vazias, quem habitualmente frequentava os estádios, não está mais lá, desde o torcedor mais crítico até o maior incentivador. Algo mudou, e agora: o quanto isso interfere no desempenho de todos aqueles que estão dentro de campo?

 O jogo se transformou em um ambiente mais silencioso. Neste novo ambiente, ainda desconhecido e cercado de dúvidas para muitos esportistas, contrapõem-se o estado de jogo e o estado de treino.   O primeiro, o “estado de jogo”, é tomado como um contexto externo mais desafiador, diante do adversário que mobiliza sentimentos de ameaça, competitividade, ansiedade positiva e uma série de fatores internos que são influenciados também pelo estímulo da presença da torcida. Estas condições tendem a gerar respostas mais imediatas sobre a tomada de decisão com base emocional.  Talvez esse tal estado de jogo esteja tão silencioso quanto o “estado de treino”, entendido como um ambiente mais seguro, rotineiro, amigável, sem a interferência do adversário e da torcida, que tende a gerar respostas construídas por estímulo de repetição diante de um estado interno de maior conforto e segurança.

A motivação extrínseca, aquela força “da camisa 12”, evidencia-se com a presença da torcida, que empurra o time para o ataque e o segura na defesa, que se mostra através das sensações provocadas pela adrenalina imposta por este típico ambiente. Aqui estão os canais sensoriais captando estímulos externos (informações do ambiente) e influenciando o jogador e seu próprio corpo. Tais estímulos funcionam como pequenos impulsos elétricos que atingem o sistema nervoso central do indivíduo, casos da visão (do estádio cheio) e da audição (da torcida gritando), que potencializam a ação de garra pelo resultado positivo. Mas e agora, com o silêncio e a arquibancada vazia, de onde virá a motivação?

Os jogadores em campo, não tem mais o estímulo visual e auditivo que a torcida traz, uma variável importante a ser considerada na influência mental, emocional e comportamental dos seres humanos em atuação. O jogo mudou, o cenário está diferente.

Exige-se, assim, mais da motivação intrínseca, aquela força impulsionadora que é caracterizada por cada indivíduo como sua capacidade interna de mover-se para a ação. Exige-se mais do foco e concentração no jogo, exalta-se a prontidão de cada atleta em “empurrar seu próprio time” para o gol adversário. Tal motivação pode também ser comparada ao sentimento primário que acompanha a maioria dos atletas do futebol na sua infância, ou categorias de base, onde não há também tantos estímulos externos, e o jogo se faz principalmente pelo amor, diversão, criatividade, alegria, e “desejo de bola” daqueles meninos que estão em campo.

Bryant Cratty, reconhecido autor da Psicologia do Esporte, destaca que “somos todos cercados por uma constelação de valores que pode, a um dado momento, nos levar à ação ou nos reduzir à imobilidade” (1984, p. 36).   

Portanto, olhando de frente para o que este novo contexto nos mostra, destacam-se sinais de que quanto mais os clubes inovarem nas ações para potencializar ambas as motivações de seus atletas (interna e externamente), mais competitivos, competentes e assertivos serão os indivíduos atuando pelo resultado.

Referência bibliográfica:

CRATTY, Bryant J. Psicologia no Esporte. Rio de Janeiro, Prentice Hall do Brasil, 1984.

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