Tática: uma questão de história?

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Veni, vidi, vici” (Vim, vi, venci): palavras que foram pronunciadas pelo general romano Caios Julius Caesar (Júlio César) ao vencer mais uma batalha, avançando na guerra e contrariando ordens do Senado Romano.

Sua frase ficou eternizada na história e por vezes fora tomada emprestada pelo também Júlio César (Júlio César Chaves), boxeador mexicano, que de nunca perder cantava-a aos quatro cantos do ringue ao fim de suas lutas; até que em um dia perdeu.

 
Tenho a impressão, quase todas as vezes que vejo uma seleção brasileira de futebol profissional jogar que nossos enunciados (e não anunciados) especialistas futebolísticos (cronistas, narradores, comentaristas, torcedores, etc) esperam de nossa equipe o mesmo “vim, vi, venci” (cheguei, olhei, ganhei).
 
Ao analisarmos um jogo de futebol, muitas vezes incorremos ao erro de darmos respostas simplistas e “tarimbadas” a situações complexas e improváveis. O árbitro foi tendencioso, o goleiro levou um “frango”, o zagueiro falhou feio, o lateral se abaixou para arrumar a meia bem no lance do gol, a equipe estava sem vontade, o técnico mexeu errado, o time é muito ruim… (a explicação para o perder ou para o ganhar é muitas vezes tão vazia que estou certo de que se perde e se ganha sem se saber realmente o porquê).
 
Tomemos a equipe do Chile como exemplo. O técnico da seleção chilena, antes de enfrentar pela última vez o Brasil na Copa América 2007, apontou para a dificuldade de se planejar as estratégias para enfrentar a seleção brasileira. Sua reflexão fora de que quando jogou aberto, perdeu; quando se fechou com cautela, perdeu; quando se tentou buscar o resultado, perdeu (perdeu também ao fazer concentração e com a festança de alguns jogadores). A questão é: “Por que perdeu“? (e nesse jogo, também “planejado”, Brasil 6 x 1 Chile!!!)
 
Não, não vamos cair no abismo comum do que qualquer pessoa pode dizer: “os jogadores brasileiros são melhores” (os brasileiros do futsal também “são os melhores”, mas nos últimos campeonatos de expressão mundial não conseguiram passar pela Espanha).
 
Ganha o jogo quem faz mais gols que o adversário. O gol é resultado de uma finalização, que é produto da recuperação da posse de bola, que pode ocorrer de diversas formas (desarme, interceptação, arremesso lateral, tiro de canto, tiro de meta, etc). Minha pergunta é: qual a melhor forma para se recuperar a posse de bola. Existe essa melhor forma?
 
Os mais experientes dirão que tanto faz, desde que ela seja recuperada, mas é fato que existem diferenças estatísticas significantes entre a forma de recuperação da posse da bola e as jogadas que levam a finalizações e a gols.
 
Outra pergunta: em qual região do campo é mais vantajosa a recuperação da posse de bola?
 
Ou ainda: após a recuperação da posse da bola, quão rápido uma equipe deve buscar chegar ao gol adversário?
 
Existem equipes que buscam a forte marcação na saída de bola, tentando desarmar o adversário o mais próximo possível de sua própria meta, tendo então a possibilidade de se buscar rapidamente, com poucos passes, o gol. Existem equipes que mantêm seus 11 jogadores atrás da linha do meio-campo, fechados, esperando o adversário para fazer a retomada da posse de bola.
 
Certamente, muitos de nós acreditamos que o perfil dos nossos jogadores é que nos direcionará a melhor estratégia de jogo (marcação, recuperação da posse de bola), e isso não está errado. O fato é que existem variáveis táticas que compõem a lógica do jogo e que podem ser aprendidas e compreendidas por todos nós (técnicos, jogadores, especialistas) e que podem tornar a dinâmica e leitura do jogo mais científica e menos empírica.
 
Isso me faz defender a tese de que ao compreender a lógica do jogo, o jogador pode ser mais eficiente, eficaz e criativo taticamente-tecnicamente-fisicamente, o que permitiria a uma equipe não só ter melhor desempenho, mas também entender por que se ganha e porque se perde (e daí poder melhorar).
 
Ao olharmos para um jogo de futebol e analisarmos o que está acontecendo, como está acontecendo, onde está acontecendo, quando está acontecendo, quem está fazendo acontecer, fica mais fácil compreender os porquês de cada acontecimento, e de forma contextualizada, o porquê da vitória e o porquê da derrota.
 
Então, quando vejo nossos “especialistas” comentando um jogo da seleção brasileira questionando como é possível a equipe não conseguir chegar ao gol adversário (Que adversário? Do jeito que falam, é como se não existisse adversário, “o Brasil é incapaz de superar o vento”), fico pensando onde estão os méritos do adversário, que se estruturou para se defender e atacar também?
 
Interessante ver os mesmos “especialistas” comentando um jogo da Argentina. Quando está difícil é porque o adversário está bem armado, fechado e retrancado.
Não, não estou aqui defendendo “Dungaus Julius Caesar” e nem dizendo que nosso selecionado vai bem. Mas vou bater nessa tecla mais uma vez: se diagnosticarmos problemas de forma equivocada, buscaremos soluções equivocadas!
 
Um dia fomos imbatíveis no futsal. Um dia o técnico espanhol da modalidade disse que seus jogadores eram mais inteligentes que os brasileiros e que compreendiam melhor o jogo; nunca mais os vencemos em grandes competições.
 
Hoje acreditamos que nossos jogadores do futebol de campo são imbatíveis.
 
“Temos de ganhar. O adversário não tem méritos. Nós é que somos competentes ou incompetentes”.
 
Essa burrice (confundida com prepotência ou soberba) pode ter decretado a primeira pequena alteração caótica que tem nos levado a grandes dificuldades, a ponto de tomarmos como verdade que a equipe do México encontrou a tática, a estratégia, a fórmula mágica para vencer a seleção brasileira.
 
Então, em vez de os nossos “especialistas” e “analistas táticos” se preocuparem em “ir, ver, comemorar”, seria mais produtivo, na exigência de soluções e na formação da boa opinião, entender “o quê, o como, o onde, o quando, o porquê”, para quem sabe descrever pontualmente as estratégias, variáveis e variações táticas de um jogo.
 
Cuidado, senhores! Não sejamos o Senado romano (o do contra), e nem incorporemos a “síndrome de Julius” – ou então o melhor é nos apressarmos para saber logo quem é o Brutus (até tu Brutus – tu quoques Brutus).
 
Lição de Casa: explique taticamente por que o Brasil empatou com o Uruguai por 2 a 2 na semifinal da Copa América 2007. Se você tiver tempo, procure os porquês na decisão Brasil x Argentina…

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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