A seleção brasileira não é mais o time que Dunga comandava até meados deste ano. Em três jogos com o técnico Tite, o time nacional mudou de estilo, reencontrou as vitórias e subiu na classificação das Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo de 2018 – até outro dia, a possibilidade de o país ficar fora do torneio pela primeira vez na história era extremamente factível. No entanto, o grande feito do novo treinador foi findar o divórcio que havia se estabelecido com o público: a reação da equipe canarinho também é um caso espetacular de comunicação.
Como jogador, Dunga simbolizou a geração que fracassou na Copa do Mundo de 1990. Foi massacrado durante anos e conseguiu redenção pessoal ao ser o capitão campeão de 1994, nos Estados Unidos. Aquela vitória ficou marcada essencialmente por dois aspectos: o pragmatismo da seleção brasileira e os palavrões que o volante proferiu ao erguer a taça.
A conquista era um projeto pessoal de Dunga em 1994. Parece bobo dizer isso num ambiente como o esporte, que se guia por vitórias e derrotas, mas o pragmatismo e a reação violenta são exemplos de quanto o capitão colocou o resultado acima do processo.
A consequência é que a geração de 1994 ficou muito subvalorizada. Até hoje, aquele elenco é conhecido como a seleção que “venceu só por causa do Romário” e como “o pior Brasil campeão”. O time que conquistou a taça é menos badalado em âmbito nacional, por exemplo, do que a geração que encantou e não foi campeã em 1982.
Dunga nunca escondeu incômodo sobre esse assunto. Nunca escondeu que as feridas de 1990 não se fecharam em 1994 e que a reação do público à conquista apenas intensificou o trauma. E isso permeou também as duas passagens dele como técnico da seleção brasileira.
Na trajetória até 2010, ainda que tenha colecionado mais resultados positivos do que negativos, a seleção de Dunga foi pragmática e em momento algum se preocupou com o que o público queria ver na equipe nacional. Foi isso também que o treinador tentou fazer para aplacar o fracasso do 7 a 1 de 2014, mas o discurso puído de orgulho nacional acima de tudo não colou na geração mais nova – nem entre os jogadores, nem com a torcida.
Aí entrou Tite, um treinador que apresentou de cara uma cartilha com tudo que o discurso de Dunga renegava. A começar pelo apoio: o técnico já passou por times grandes do país e tinha apoio de torcedores antes de ser contratado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) – Dunga, ao contrário, começou pela seleção brasileira.
Além disso, Tite não renegou. Não fala mal sequer do time de 1994. Em entrevista ao site “Globoesporte.com”, o treinador citou o time comandado por Carlos Alberto Parreira como um exemplo de organização e modelo de jogo. O discurso do treinador é sempre inclusivo, e isso faz enorme diferença.
O bom momento coletivo e o futebol que se aproxima mais do que o torcedor quer ver são importantes, é claro. Contudo, não são os únicos alicerces da reestruturação promovida por Tite. Depois de gestões da seleção em que a relação com o público era marcada por tensão e belicismo, como os períodos de Dunga, Felipão e até Mano Menezes, o novo comandante tem como marca um comportamento ameno, quase professoral.
A seleção brasileira de Tite pode não vencer todos os jogos. Pode não conquistar a Copa do Mundo de 2018. Com estratégias simples de comunicação, porém, o treinador criou um ambiente em que o resultado não é a única variável que importa. O público não se comporta apenas de acordo com “ganhou” ou “perdeu” se estiver diante de um caminho positivo e de um discurso claro, inclusivo e positivo.
As marcas de Tite já são evidentes nos primeiros jogos. É possível enxergar conceitos do treinador em aspectos como o posicionamento da seleção brasileira e até o comportamento de alguns jogadores. Mas se há algo em que ele se destaca e se mostra superior a qualquer outro brasileiro do segmento, esse quesito é a comunicação.