Lições e alertas do skate olímpico

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A disputa do skate nos jogos olímpicos chamou atenção do público pela pouca idade de muitos dos atletas. Entre eles, o destaque foi Rayssa Leal, brasileira medalhista de prata que cativou o mundo com seu carisma, sorriso e leveza. Aos 13 anos e 204 dias completados ela se tornou uma das medalhistas olímpicas mais jovens de todos os jogos e também uma das grandes histórias da atual edição.

Rayssa é conhecida como a fadinha do skate, por ter viralizado nas redes ao aparecer com sete anos em um vídeo fantasiada de fada acertando manobras e desde então foi crescendo no esporte até alcançar a conquista na última semana. A alegria que esbanjou ao longo da competição foi um forte sinal de como a experiência dos jogos para ela, e aparentemente, para a maioria dos seus colegas, foi divertida e positiva. Entretanto a “invasão de menores” que o skate proporcionou pode ter algumas consequências negativas no longo prazo que merecem ser discutidas.

O resultado de Rayssa e de tantos e tantas jovens atletas pode se explicar muito menos pela pouca idade do que pelo estágio de desenvolvimento da modalidade, ainda estreante no programa olímpico e pelas próprias características do esporte, que não exige tanto das aptidões físicas, a potência, velocidade e força, demandando mais da habilidade dos competidores. Entretanto, a mensagem que pode ficar para o público é a de que quanto antes começarem os treinamentos, melhores os resultados esportivos. É aí que mora o perigo.

Isso não é verdade nem para o desempenho nos esportes e muito menos para a vida desses jovens.

O treinamento especializado, quando acontece antes do momento adequado, é classificado por pesquisadores como especialização precoce, e é altamente prejudicial para o desenvolvimento das crianças, inclusive em relação ao desempenho esportivo. De modo geral, a especialização precoce acontece quando o esporte passa a ser uma obrigação para a criança, os resultados viram a prioridade e existe uma sobrecarga física e mental sobre ela.

Nessas situações a prática esportiva pode ser entendida como um trabalho. As consequência desse tipo de relação com o esporte observadas com maior frequência são a extenuação mental e o abandono da prática, ou seja, muitos talentos acabam sendo desperdiçados. Para o desenvolvimento dessas crianças outros prejuízos podem ser listados, como o distanciamento escolar, por exemplo.

Isso quer dizer que crianças não podem praticar esportes? Absolutamente não, podem e devem!

Quando observamos a relação dos e das skatistas nesses jogos olímpicos com o esporte, o que se pôde perceber é que muitos deles pareciam estar aproveitando o momento, se divertindo, inclusive com a performance dos rivais – que são mais colegas do que rivais! Ou seja, o grande ponto não é quando começar um esporte, mas sim como. Se a prática é prazerosa, sem obrigações, ela é benéfica para o desenvolvimento e potencializa o talento, como Rayssa demonstrou tão bem. Crianças devem brincar, não trabalhar.

O limite de idade

Para diminuir a precocidade dos seus participantes nos jogos olímpicos, a Federação Internacional de Ginástica (FIG) estipulou o limite para 15 anos e em 1997, subiu a idade para 16 anos. Temos aqui a ponderação de que a medida cerceia, de certa maneira, o direito de atletas talentosos a colocar suas habilidades à prova quando estiverem à altura da competição. Por outro lado, a medida ajuda a prevenir a especialização precoce e seus impactos negativos na vida dos jovens atletas. Quanto mais cedo for permitido que crianças disputem competições adultas e alcancem resultados excepcionais, mais cedo adultos irão buscar extrair o máximo delas, o que costuma ser trágico para seu desenvolvimento. Sob a ótica da garantia dos direitos das crianças, o limite mínimo de idade nas competições adultas acaba sendo, em geral, positiva.

E aqui, vale lembrar que estamos nos pautando pela priorização dos direitos das crianças. Se pensarmos exclusivamente no resultado de uma competição, talvez especializar possa até fazer sentido em alguns momentos… É possível ganhar de diversas formas, mas muitas vezes, algumas simplesmente não valem a pena.

Que Rayssa, e que todas e todos que venham depois dela continuem por aí voando, felizes. Vencedores ou não.

Colaborou com o desenvolvimento dessa coluna Marcelo Massa, doutor em Iniciação esportiva, Treinamento a longo prazo e Talento esportivo pela Universidade de São Paulo – USP.

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