Um momento de liberdade: o jogo

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Dando continuidade ao texto publicado em 24 de setembro 2020 sobre coisas que aprendi na rua Pernambuco, tenho me questionado sobre a infância, sobre o brincar e o jogar nessa época da vida. Aqui vou utilizar o termo brincar com referência ao momento lúdico e livre vivido pelas crianças, e quando me refiro ao jogo, quero tratar das atividades que tem regras como premissa para a prática. Comecei uma breve pesquisa no campo dos estudos culturais e percebi que pode ser possível fazer uma aproximação dessa base teórica com o que tem sido debatido sobre a pedagogia da rua, o brincar e o jogar na infância.

As relações de poder que perpassam a sociedade cooptaram a educação, utilizando a pedagogia como ferramenta na conformação do sujeito idealizado. “A pedagogia vai corresponder ao conjunto de saberes e práticas postas em funcionamento para produzir determinadas formas de sujeito” (CAMOZZATO; COSTA, 2013, p. 26). A educação contaminada por essa lógica está presente nos mais diversos âmbitos da vida, desde a família, até à mídia.

A relação de domínio se dá na disputa de interesses diversos que atravessam o âmbito social. Buscando dar essa ou aquela direção às pessoas, esse jogo de poder opera por meio de uma determinada pedagogia, em especial, a institucionalizada. Nesse sentido, o que Camozzato e Costa (2013) buscam, é revelar que existe uma “vontade de pedagogia”, ou seja, o motor de uma pedagogia que atravessa, entre outros espaços, as instituições educativas, ainda com objetivo de manter a relação de domínio. Nas palavras das autoras conceito que se torna “dizível” se considerarmos que as condições culturais contemporâneas erigem constantemente pedagogias que cruzam a esfera social e acionam um conjunto de forças para intensificar e refinar, por via das pedagogias, as aprendizagens necessárias a tornar-nos governáveis. (CAMOZZATO; COSTA, 2013, p. 23).

Nesse sentido, seria a pedagogia da rua uma possibilidade de resistir a essa “vontade de pedagogia” que perpassa as relações sociais? Uma tentativa de resposta ao questionamento surge da observação de que quando uma criança brinca com outras, relações e aprendizagens se estabelecem ali, de forma pouco ou nada controlada e com a mínima ou nenhuma interferência externa (de adultos).

Entrar nesse estado de jogo pode abrir espaço para a construção de mecanismos de problematização do modelo de controle fomentado pela “vontade de pedagogia”. É que a lógica interna de algumas modalidades como o futebol, por si, são fonte de desafio e prazer, o que parece ser fator determinante para motivar uma criança a participar daquele momento e adentrar nesse mundo outro, como uma espécie de realidade paralela que acontece naquele instante e ao longo da disputa do jogo.

Esses portais que levam a “realidades paralelas”, simbolizam passagens da criança por momentos únicos na vida, em que cada brincadeira e cada jogo possibilita esse tempo outro, deixando marcas que se manifestarão ao longo da trajetória individual, como as estratégias de negociação de regras e de punições em caso de seu descumprimento. Em especial, a disponibilidade de entrar em relação com o outro em benefício do prazer da brincadeira e/ou do jogo.

O fomento a esse(s) espaço(s) do brincar nos proporciona pensar que é necessária a preservação da infância, em especial daquela que tem o brincar como elemento central, e que os(as) adultos(as) possam proteger e também usufruir desse(s) espaço(s), buscando refúgio nesse mundo outro, onde prevalece a possibilidade de construção coletiva em prol do desejo comum.

Assim, o esporte como fenômeno social, principalmente na pedagogia da rua e pela prática lúdica na infância, assume uma condição de potencial fomento de sociabilidade e construção subjetiva que não se pauta pelo modelo de controle da “vontade de pedagogia”, mas, pelo contrário, promove e incentiva a prática esportiva livre de objetivos docilizantes.

Referência

CAMOZZATO, Viviane Castro; COSTA, Marisa Vorraber. Vontade de pedagogia: pluralização das pedagogias e condução de sujeitos. Cadernos de Educação. UFPel. n.44, jan-ab. 2013. Disponível em http://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/caduc/article/view/2737. Acesso em: 18 jan. 2021.

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