Táticas: restringem ou potencializam as tomadas de decisão? – Parte Final

Entre para nossa lista e receba conteúdos exclusivos e com prioridade
Entre para nossa lista e receba conteúdos exclusivos e com prioridade

Créditos imagem: Lucas Figueiredo/CBF

Nesta terceira e última parte (Clique aqui para acessar a primeira parte ou aqui para a segunda parte), darei continuidade às discussões acerca da influência da tática nas tomadas de decisão, analisando uma outra possível abordagem do desenvolvimento tático na formação de um jogador, além de apresentar minhas conclusões sobre esse tema tão polêmico.

Princípios Táticos na Formação de um Jogador

Nessa parte, iremos discutir a formação do jogador de futebol através do desenvolvimento dos princípios táticos, usando como estratégias pedagógicas jogos condicionados e uma variedade de táticas individuais e de grupo.

Entenda por “princípios táticos” o resultado de décadas de estudos da pedagogia do esporte procurando compreender a lógica do jogo. Para Castelo (1994), citado por Costa et al. (2011), os princípios táticos são a tradução teórica a propósito da lógica do jogo, em que se busca operacionalizar os comportamentos técnico-táticos dos jogadores. Por isso, os jogadores precisam conhecê-los e saber como usá-los.

Diferentes princípios táticos, de acordo com o Glossário do Futebol Brasileiro (Fonte: CBF Academy, 2020).

Para que esses princípios possam ser compreendidos e desenvolvidos, uma opção de aprendizagem são os jogos condicionados, que envolvem atividades com mudanças nas regras (alterando o tamanho do campo, posicionamento e número de jogadores, gols etc.), procurando criar desafios para que os jogadores possam resolver os problemas do jogo (BALZANO, 2012).

Também é possível desenvolver princípios táticos específicos, através das táticas de grupo e individual, a partir do entendimento das mesmas como expressões do jogo, buscando soluções ótimas para desafios que se repetem em termos de lógica, dentro da variabilidade infinita do jogo. 

Dois exemplos de táticas individuais são a antecipação defensiva, no qual o defensor se antecipa ao atacante adversário a fim de interceptar a bola, e a antecipação ofensiva, que geralmente ocorre durante um cruzamento, no qual o atacante se antecipa ao defensor para tentar finalizar ao gol do oponente.

Para enriquecer o repertório e a criatividade dos jogadores, pode-se incluir no processo de ensino-aprendizagem características tanto da cultura brasileira, quanto de outras modalidades esportivas, especialmente o futsal.

Por exemplo, para fugir da marcação, pode-se ensinar uma movimentação típica do futsal conhecida como “dar o gato”, em que o jogador realiza rápidas mudanças de direção para criar espaço para receber a bola.

Ao pensar em táticas de grupo e combinações tradicionais como o “toca e vai” (também conhecida como “um, dois” ou “passe de parede”), pode-se adicionar variações a partir dos conceitos por trás de jogadas típicas do futsal, como os da paralela e da diagonal, para ajudar a desenvolver a capacidade de percepção das ações e as possibilidades da tomada de decisão dos jogadores (Antonelli, 2018).

Figura 2. Dentro de um modelo tático, os jogadores podem se utilizar da sua capacidade de leitura de jogo e realizar diferentes combinações para ludibriar a marcação adversária. Fonte (Antonelli, 2018).

Cada tática de grupo exigirá dos jogadores uma série de táticas individuais para serem aplicadas com eficiência. Por exemplo, durante as combinações descritas acima, o jogador poderá também decidir individualmente se faz uma corrida mais longa quando o marcador for ultrapassado ou curta com parada brusca quando o marcador se afastar (Balzano, 2020), proporcionando assim outras formas de realizar a conexão.

Para Santana (2019), as táticas individuais são uma forma de expressão da autonomia dos jogadores e representam um recurso importante na resolução dos problemas do jogo.

Dentro dessa perspectiva de adicionar elementos para o processo de leitura, tomada de decisão e execução das respostas, as táticas de grupo e individuais podem ser usadas como catalizadoras da tomada de decisão, desenvolvimento cognitivo e motor, permitindo ao jogador excelência na resolução dos problemas do jogo, podendo ser aplicadas em qualquer esquema tático e, assim, ajudando a formar um jogador “criativo”. Nessa perspectiva, um jogador com uma formação rica de estímulos que permita compreender a lógica do jogo será capaz de executar soluções eficientes dentro do universo “micro” do mesmo. E em momentos posteriores da sua formação, quando as capacidades cognitivas estiverem mais desenvolvidas, será possível aprender com maiores detalhes os esquemas táticos e as funções que irá desempenhar dentro dos modelos de jogo modernos.

Conclusões

Afinal, as táticas restringem ou ampliam as tomadas de decisão? As táticas podem tanto restringir quanto ampliar as capacidades de decisão dos jogadores. A questão não é buscar uma visão dualista e considerá-las como “boas” ou “ruins”, mas compreender o universo tático e as implicações de diferentes abordagens (didáticas-metodológicas), seja na formação de um jogador ou no aprimoramento do atleta em idade adulta.  A forma como o treinador entende, desenvolve e possivelmente exige a aplicação de cada tática pode torná-la mais restritiva ou abrangente.   

É preciso tomar cuidado para não as usar de forma a restringir o desenvolvimento de jogadores durante a sua formação, através de uma especialização precoce de “posição e função”, ou ao exigir que certas táticas (sejam elas individuais, de grupo ou coletivas) sejam utilizadas sem a compreensão das mesmas, o que pode acarretar em uma utilização fora do contexto mais apropriado.  Por outro lado, uma abordagem tática intencional e organizada, que considere os diferentes estágios de desenvolvimento, pode ajudar a desenvolver jogadores que sejam capazes de compreender e seguir esquemas e desempenhar funções específicas, e também de serem criativos e efetivos dentro dos campos, podendo ter capacidade autônoma de responder aos inúmeros problemas que emergem durante o jogo.

Referências

Antonelli 2021: O Futebol Potencializado pelo Futsal. Disponível em: https://www.soccerpoweredbyfutsal.com/livros

Balzano 2012: Metodologia dos Jogos Condicionados para o Futsal e Educação Física Escolar. 1 ed. Várzea Paulista, SP.

Balzano 2020: Dois Um Brasil: Um Método Genuinamente Brasileiro. Fontoura.

Beuker, M. (2021). Thinking differently at AZ Alkmaar. Disponível em: https://trainingground.guru/articles/marijn-beuker-thinking-differently-with-az-alkmaar

Da Costa, I. T., da Silva, J. M. G., Greco, P. J., & Mesquita, I. (2009). Princípios táticos do jogo de futebol: conceitos e aplicação. Motriz. Journal of Physical Education. UNESP, 657-668.

Santana, W. (2019). Qual o maior legado para o futebol do jogador formado no futsal? Clique aqui para acessar.

Compartilhe

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on email
Share on pinterest

Deixe o seu comentário

Deixe uma resposta

Mais conteúdo valioso