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Faz um tempo que escrevi um artigo no Blog Futebol e Transcendência sobre equipes que norteavam seu jogo pela bola e perdiam “frescura decisional” em alguns jogos finais da temporada. Desse artigo foi retirado escopos para escrever essa coluna. E esse final de época europeia deixa boas reflexões para a temática. Claro que essa questão também pode acontecer em diversos períodos do ano, e não apenas em um jogo ou no final das competições.

Percebe-se que a grande maioria das equipes que ainda estão “vivas” em duas ou três competições simultaneamente com fio norteador que é a bola, algumas linhas do jogo posicional, uma alta e agressiva organização e transição defensiva, dependendo da sequência de jogos, perdem intensidade decisional, intensidade física-específica, alternando “estágios irregulares”, e apresentam pouca fluidez funcional-posicional contra adversários de nível menor.

Ao acontecer isso, o que mais se escuta é que o “excesso de jogos e que algumas lesões de jogadores importantes impedem a equipe de conseguir o resultado ou jogar melhor”. Apenas isso, separadamente, é suficiente para entender esse fenômeno? Será que também os jogos que carregam essa informação são apenas suficientes para determinar essa tendência? Ou o futebol é um processo altamente complexo que carrega desgaste desde quando inicia o primeiro treino da época e nas escolhas da comissão técnica?

As equipes que jogam um futebol ofensivo e procuram propor o jogo posicional, qualificam-se a algumas “escolhas específicas” para resolver as interações do jogo e atingir o objetivo maior que é vencer seu oponente. Nesse caso, relativamente, indicam um processamento maior de ideias de jogo e mais complexas que o adversário. Mesmo que concretizadas e articuladas de forma diferente por cada equipe, a opção por utilizar a bola como fio condutor exige um desgaste cognitivo maior “a curto, a médio e a longo prazo”. Além disso, a forma intensa que encaram o jogo, conceituando a intensidade “como estar concentrado coletivamente-individualmente durante todo o jogo elevando ao máximo o número de decisões mais próximas do ideal”, arrasta consigo repercussões maiores que se estendem por toda funcionalidade corpórea dos jogadores e automaticamente nas relações dos jogadores na construção coletiva da equipe.

Então, será que ao enfrentarem equipes que jogam menos, que possuem ideias de jogo mais simples, que estão menos desgastadas, pode-se ter certa desvantagem quando uma fadiga cognitiva acumulada se instala pelo excesso de jogos ou por treinos que não respeitam uma lógica de desempenho-recuperação?

Outro quesito é a dimensão mental. A equipe/jogador precisa manter um nível de motivação/desejo alto, já que não é a mesma coisa jogar um jogo que vale a vaga para final de uma Copa Europeia e dois dias depois enfrentar uma equipe do meio da tabela pelo campeonato local, correto? Também soa diferente para uma equipe que está na liderança com certa folga, uma equipe que está na caça ao líder, e outra distante do líder e no meio da tabela buscando uma vaga em competições europeias. Apesar de que qualquer equipe de alto nível e qualquer jogador devem enfrentar todos os jogos da mesma forma. Mas isso influencia certamente.

Outra dimensão é a fisiológica/bioenergética. Cada equipe possui seu novelo bioenergético para encarar o jogo, e também precisa no mínimo de 4 dias para voltar a ter esforços mais próximos do jogo. Isso não tem nada a ver com a dimensão física em correr mais ou menos que o adversário, simplesmente no desgaste global do organismo e no pouco tempo de recuperação/treino. Saber correr com intencionalidade ou correr menos, também demanda de descanso e uma correta gestão do processo de treino.

E esse dilema todo vem a tona o termo rotatividade. Fazer com que todos os jogadores se sintam importantes não é uma tarefa tão fácil em plantéis numerosos, até certo ponto com disparidade de qualidade. Mas é uma das missões da comissão técnica fazer com que todos se sintam motivados jogando mais ou menos. Agora como essa rotatividade é planejada? Apenas nos momentos de maior densidade competitiva? Em jogos mais fáceis? Em jogos em casa? Em competições diferentes? Ou já no inicio da época na pré-temporada?

Está claro, quando se mantém uma equipe com poucas trocas, cria-se conexões exclusivas, pois os jogadores adquirem um nível de entrosamento. Ao alterar drasticamente vários jogadores, tirando 2 ou 3 que “são os pilares do jogar”, ou usar toda hora inconvenientemente a rotatividade interferindo na coesão da equipe, pode-se gerar alguns problemas, por que a implicação de novos jogadores revela novas interações por suas características únicas e novas características que podem não desvirtuar a forma de jogar da equipe, mas deixá-la sem a fluidez necessária.

Então, “o fio da navalha” é ter uma rotatividade constante, rodar poucos jogadores, ter equipes diferentes para uma situação como essa, manter o máximo que puder a mesma equipe ou trocar os jogadores mais cansados dentro do próprio jogo? Aumentar o número de substituições para cinco ajudaria ou dificultaria? Consegue-se treinar tudo isso ou escolhas devem ser feitas? E os problemas são apenas dessas equipes que apresentaram desgaste cognitivo no final de semana pela forma de jogar? Ninguém sabe. Sabe-se que rotatividade deve ser processada de certa maneira, mas cada equipe fabrica a sua maneira.

E é essa maneira que entra o processo de treino que deve gabaritar os jogadores e a equipe para chegarem nas melhores condições para o próximo jogo. Apesar dos jogadores menos utilizados também serem tops, eles precisam de uma pré-disposição organizacional-funcional-entrosada mais próximo do ideal toda semana. Então, a rotatividade deve também entrar durante a semana no processo de treino, mas no meio dessas semanas será que sobra mais tempo para treinar ou para recuperar? De que forma é treinada e que é recuperada a equipe? Será que um misto de recuperar-treinar não otimizaria a funcionalidade individual e da equipe? Nesse recuperar-treinar é possível gerar padrões e relações específicas para ter uma rotatividade necessária no plantel sem descaracterizar a equipe? O que fazer com os jogadores que menos jogam para tentar manter a identidade já que estão menos desgastados? E os que mais jogam assiduamente? Como nivelar esse viés?

O treinamento num padrão semanal, com um jogo ou com dois jogos, permite ser operacionalizado corretamente, manter a funcionalidade específica da equipe buscando interações para cada situação concreta de cada partida. Consegue-se gerir alimentando todos os jogadores corretamente sem deixar uns demasiadamente gordos e outros demasiadamente magros de conteúdo. Agora, também pode-se disponibilizar demasiada comida para todos e o jogo virar uma grande congestão. Eis a importância das refeições-sessões equilibradas para todos, especialmente quando se joga muito.

Mas não adianta, por mais treinada a equipe e estruturada para planejar algo em função do adversário, o erro sempre vai existir. Mas haverá sempre uma opção de flexibilidade durante a partida que é voltar com alguns jogadores principais, fazer alternâncias estratégicas sem perda da identidade ou aceitar que naquele determinado jogo o adversário foi melhor e que a equipe poderia ter feito escolhas diferentes na prévia do encontro quanto a rotatividade.

E isso tudo não se faz com apenas um simples argumento único e correto, algumas de suas condições realmente está no erro. A sensibilidade e a paixão para descobrir esse erro e outros erros podem aproximar cada vez mais a equipe dos acertos e da regularidade tanto esperada em todos os jogos mantendo a rotatividade como uma aliada, já que propor o jogo é muito mais desgastante globalmente e uma regularidade constante requer uma apurada sensibilidade de todos integrantes do processo da modelação do jogar da equipe. Enfim, entender que o processo de treino-competição se sucede de erros e acertos dentro de um espiral chamado “complexidade”, esse é o caminho da rotatividade.

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