Os jogos do campeonato brasileiro estão cada dia mais difíceis de assistir. Não se está falando de ir ao estádio não, porque isso o torcedor brasileiro já não faz há muito tempo. A qualidade ou falta dela é cada dia maior em gramados tupiniquins, pois temos a possibilidade de ver na televisão nossos craques fazendo gols e jogadas geniais na Europa, em clubes ou países que muitos de nós nunca havíamos ouvido falar antes. No inicio do torneio até existiam algumas equipes com jogadores de um bom nível técnico, contudo depois da abertura do mercado europeu, vimos pelo segundo ano seguido o êxodo em massa de jogadores brasileiros e, conseqüentemente, a qualidade do campeonato nacional despencou.
Os clubes europeus sempre buscaram no Brasil reforços para suas equipes. Desde meados dos anos 50 as grandes equipes européias levavam algumas estrelas do futebol brasileiro. A partir da década de 80 equipes de menor porte da Europa também passaram a comprar jogadores de destaque no nosso futebol (Zico-Udinese, Socrates-Pescara). Nos anos 90 abriu-se o mercado asiático, e foram os japoneses com o objetivo de montar uma liga forte os primeiros a buscar nossos talentos. No inicio desse século foi à vez do Leste europeu descobrir o mercado brasileiro e, como não podem competir financeiramente com outros clubes europeus, levaram atletas do segundo escalão. Ou seja, os grandes clubes levam os craques, os menores, jogadores jovens com futuro promissor e os outros (Japão, Coréia e Leste Europeu) levam atletas sem muito destaque, mas de boa qualidade. Deixam para nossos clubes, jogadores com pouca qualidade, de pouca idade ou os experientes que já fizeram a vida lá fora e querem apenas encerrar a carreira no Brasil.
Se por um lado à venda dos melhores jogadores brasileiros para os maiores clubes europeus é inevitável, hoje nossas equipes vendem jogadores bons para clubes médios na Ásia ou Leste Europeu. E com toda essa receita, os clubes continuam endividados.
Assistimos à debandada de talentos para o exterior, pois os clubes brasileiros estão em geral quebrados, mantendo a mesma estrutura associativa amadora, que é incapaz de gerar recursos para manter as estrelas no país do futebol. Até quando o torcedor agüentará o mau futebol? Será que o nobre esporte bretão não corre o risco de ser globalizado?
Está cada dia mais fácil obtermos qualquer tipo de informação no mundo de hoje, esta tudo a um clique do nosso alcance. No futebol, esporte mais popular do mundo isso não é diferente. É possível saber tudo o que acontece em todos os campeonatos do mundo sem sair da frente do computador. Além do mais, no Brasil temos a possibilidade de assistirmos os melhores campeonatos europeus todos os fins-de-semana. Os jovens, que estão sempre ligados em novidades são os alvos mais fáceis dessa oferta abundante de bom futebol.
Aos poucos cria-se uma grande identificação com esses craques internacionais (em sua maioria brasileiros) e os novos fãs de futebol passam a seguir seus ídolos mais de perto (através da TV e internet) e, conseqüentemente, torcem pelo sucesso da agremiação onde eles atuam (é comum vermos garotos com as camisas de times europeus). Com grandes jogos, os ídolos em campo e um time para torcer, o jovem torcedor brasileiro acostuma-se a assistir os campeonatos europeus e esquece das terríveis partidas do campeonato brasileiro com seus jogadores medíocres. Assim sem se dar conta o torcedor brasileiro começa a torcer mais pelo clube europeu do que pelo time local (da sua cidade ou país).
As camisas e produtos oficiais também não são difíceis de serem encontradas. Toda loja de esporte que se preze vende produtos dos clubes europeus.Com isso é possível tornar-se um torcedor cada vez mais fanático daquele clube que joga tão bem com jogadores muito habilidosos, porém em um estádio distante. Afinal, ir ao estádio já não é mais um hábito do brasileiro.
A paixão pelo futebol não é tão cega como pensam nossos dirigentes. No longo prazo, nossos filhos e netos poderão nos achar tolos por nos preocuparmos com nosso time brasileiro, enquanto eles torcerão pelos times de verdade. Para quem acha que essa é uma visão pessimista ou de uma completa insanidade, basta apenas olharmos para o passado. Há alguns anos quando no Brasil, um país de dimensões continentais, os moradores das regiões Central e Nordeste acompanhavam o futebol de duas maneiras; no estádio vendo equipes locais (de baixa qualidade) ou pela televisão, onde assistiam na maioria das vezes jogos do campeonato carioca por onde desfilavam os craques de Flamengo e Vasco. Coincidentemente hoje a torcida dessas duas agremiações são esmagadora maioria nessas regiões. Dessa forma é possível entender que uma equipe com bons jogadores mesmo que vista apenas pela televisão atrai novos torcedores.
Guilherme Momensohn I. dos Santos é administrador de empresas formado pela FAAP, e profissional de Marketing Esportivo.
Caio Medauar é advogado militante, sócio do escritório Medauar Advogados, membro das Comissões de Defesa do Consumidor e de Direto Desportivo da OAB/SP e especialista em administração do esporte pela FGV-SP.
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