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Os erros dos árbitros e os erros dos outros…

Tendo passado a noite a orar, no Monte das Oliveiras, Jesus desceu à cidade, nas primeiras horas da manhã e dirigiu-se para o Templo. Mal clareava o dia e as cerimônias religiosas só algumas horas depois começariam. No entanto, os peregrinos, em cavaqueiras intermináveis, já caminhavam, também em direção ao Templo e em número crescente. Alguns deles, vendo Jesus e os seus discípulos, próximos da Porta Dourada, sentaram-se junto d’Ele, na esperança de escutar algumas das suas prédicas.

De súbito, como torrente que galga o penedio das margens, uma centena de homens aos gritos aproximou-se. À frente da turba, numerosos escribas e fariseus empurravam uma despenteada e assustada mulher que era vítima de toda a sorte de impropérios. Ao chegar o cortejo bem perto de Jesus, a turba formou um círculo. A mulher ficou no meio, sacudindo-se em intermináveis soluços. Um dos escribas levantou a voz: Mestre, sabemos que és justo e sábio. Aconselha-nos, por isso. “Mas o que se passa?” inquiriu o Mestre.

O escriba deitou-se a um pomposo discurso, cheio de citações do Antigo Testamento. Distraído, Jesus agachou-se e começou a desenhar na areia. Findo o exórdio, o escriba concluiu, julgando irrefutáveis as suas palavras: Logo, porque esta mulher é casada e foi apanhada a fornicar com outro homem que não é o seu, esta mulher, segundo a lei de Moisés, deve ser imediatamente delapidada. Qual é a tua opinião, a este respeito? Jesus, sem dar a mínima atenção ao palavreado do orador, continuava a riscar a areia. Exasperado, um fariseu rugiu: Não dizes nada? E outro, já de voz embargada: Diz alguma coisa. Caso contrário, matamos já a mulher…

Quando ouviu a palavra “matar”, Jesus estremeceu e levantou-se. E olhando fixamente os escribas e os fariseus afirmou em voz pausada: “De todos vós quem estiver aqui, sem pecado, atire contra esta mulher a primeira pedra”. E voltou a acabar os desenhos que iniciara.

No entanto, como por milagre, nos riscos que Jesus fizera na areia, surgiram as palavras ladrão, assassino, perjuro, adúltero, burlão: afinal os crimes daqueles hipócritas juízes, embora argumentadores sagazes e argutos, os quais, para Jesus, tinham pecados bem piores, do que os daquela pobre mulher. Lentamente, os acusadores, transtornados os seus planos, desapareceram e ficaram Jesus e a mulher, olhando um para o outro. Jesus adiantou-se: “Mulher, onde estão aqueles que te acusavam? Ninguém te condenou?”. E ela, ainda de voz embargada: Não, senhor, ninguém me condenou. “Nem eu também te condeno. Vai e não voltes a pecar”.

Grande exemplo o de Jesus! Ele condenou, de facto, os que vêem o arqueiro no olho do seu semelhante e não vêem a trave no seu próprio olho. Lembrei-me deste trecho, extraído do Evangelho, ao ler e ao escutar as críticas (que se confundem, tantas vezes, com verdadeiras ofensas morais) que pessoas responsáveis lançam sobre os árbitros de futebol. Quero eu dizer que os árbitros não erram, ou que a crítica não os deve julgar? É evidente que os árbitros erram – mas, permitam-me acrescentar, muitíssimas menos vezes do que os jogadores, os treinadores e os dirigentes. E, no que à crítica diz respeito e se bem me lembro da teoria crítica da Escola de Frankfurt, ela representa a razão na sua função de contestação e desmistificação.

Portanto, porque seres humanos, todos os árbitros erram e a sua conduta, as suas atuações deverão avaliar-se com uma crítica certeira e incisiva. Mas a criação de uma atmosfera de suspeita; a sofística de comentadores, hábeis em dilacerar e enlamear a reputação alheia; um pardo nevoeiro de desconfiança – tudo isto permite que não se dissequem os erros, os malogros gritantes dos demais “agentes do futebol” e ainda que circulem invenções de uma gravidade acusadora e apreensiva, a respeito dos árbitros.

E, assim, rodeados de mentiras desonestamente propaladas, são os árbitros, para o cidadão vulgar, a “causa das causas” dos resultados dos jogos de futebol. Demais, para muita gente que governa o futebol, os sócios e simpatizantes dos seus clubes são sempre tratados como analfabetos e de menor idade. De fato, não é por causa dos árbitros que as principais equipas atravessam épocas de menor rendimento, embora um saber massificado assim o diga.

A uma leitura objetiva do que se passa, o futebol do Sporting C.P. (ainda vi jogar os “cinco violinos” – que saudade!) não está a libertar-se dos malefícios de um período incompatível com o seu passado, porque os árbitros o distinguem (hoje, ao contrário de ontem) com atuações favoráveis, mas porque o seu atual presidente, o Augusto Inácio, o Leonardo Jardim implantaram um novo espírito e novas práticas na direção e gestão do clube de Alvalade, que os jogadores aceitaram e querem corporizar. O Sporting é outro, porque é outra a política que o governa, porque renasceu a alma que eu, há muitos anos, senti em Jorge Vieira, durante um Sporting-Belenenses. Relembro uma frase do velho “leão”: já não sei viver sem o Sporting…

São portugueses alguns dos melhores árbitros do mundo! A nossa arbitragem não deve nada, em honestidade e competência, ao que se passa, nesta área, no estrangeiro! Os erros dos árbitros são de bem menor importância que os erros dos outros “agentes do futebol”. Já cansa tanta mentira institucionalizada. É verdade que a mentira sempre existiu. Mas, desta vez, a situação é mais grave: tornou-se moeda corrente e impõe-se à escala do futebol, como um todo.

A urgência de nos colocarmos ao nível do horizonte do nosso tempo pede dos “agentes do futebol” fidelidade a mais conhecimento e a melhor ética. No futebol, há muita gente que pode fazer suas as palavras do Diário de Kafka: “Cada vez sou mais incapaz de pensar, de observar, de falar, de compartir uma experiência: estou a tornar-me de pedra”. E basta pensar um pouco; basta um pouco mais de autocrítica – para concluir-se que os erros dos árbitros são de bem pouca importância, no cotejo com os erros dos outros…

*Manuel Sérgio é antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF)e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia.

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O direito de greve dos jogadores de futebol

Greve corresponde à cessação coletiva e voluntária do trabalho com o propósito de obter benefícios, como aumento de salário, melhoria de condições de trabalho ou para evitar a perda de benefícios.

O direito de greve é constitucionalmente assegurado a todos os trabalhadores brasileiros.

O contrato do atleta profissional é um contrato especial regulado pela Lei Pelé, aplicando-se a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) apenas de forma subsidiária, ou seja, somente naqueles pontos que a Lei especial não trate.

Por se tratar de um direito constitucional, os jogadores de futebol podem fazer greve desde que cumpram os requisitos legais.

O direito de greve é regulamentado pela Lei 7783/89 que em seu artigo 2º a define como a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial de prestação pessoal de serviços.

Esta Lei estabelece os requisitos para a validade do movimento grevista e que devem ser observados, também, aos jogadores de futebol.

Nessa linha, o primeiro requisito é a ocorrência de real tentativa de negociação, antes de se deflagrar o movimento grevista: desde que frustrada a negociação coletiva ou verificada a impossibilidade de recurso à via arbitral, abre-se o caminho ao movimento de paralisação coletiva.

O segundo requisito é a aprovação da respectiva assembleia de trabalhadores. Aqui, a lei respeita os critérios e formalidades de convocação e quórum fixados no correspondente estatuto sindical.

Por fim, o terceiro requisito é o aviso prévio aos empregadores envolvidos ou seu respectivo sindicato com antecedência mínima de 48 horas da paralisação.

Assim, eventual movimento grevista por parte dos jogadores de futebol é legítimo e tem respaldo legal, desde que cumpra os requisitos estabelecidos.

Atualmente, muito se comenta da possibilidade de greve dos jogadores com o objetivo de se buscar melhora em sua condição de trabalho, especialmente no que concerne ao calendário.

Portanto, caso os atletas consigam se organizar o risco de greve é real e os clubes e CBF acabarão sendo obrigados a negociar soluções para o calendário brasileiro e excesso de jogos.

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O impacto do sequestro emocional

A inteligência emocional, obra científica de Daniel Goleman defende a ideia de que as emoções são fundamentais para nos tornarmos capazes de melhorarmos habilidades ligadas à família e vida profissional. Na sua teoria, Goleman acredita que as emoções saudáveis nos possibilitam desenvolver relações tão saudáveis com aqueles à nossa volta, que o sucesso torna-se algo mais real para quem assim se desenvolve, do que para quem tem um Q. I elevado, por exemplo. É importante lembrar também que o Q.I não pode ser alterado durante a vida, mas a inteligência emocional pode ser desenvolvida e ampliada.

No passado, nosso centro emocional localizado na região da amígdala, era responsável direto pela nossa sobrevivência e nossas decisões. É nela que ainda são gravadas nossas memórias emocionais, como felicidade, tristezas, através da conexão entre tálamo/amígdala, que nos faz lembrar-se de determinadas situações carregadas ou não desta memória emocional. Nesta região do cérebro nascem nossas emoções mais básicas como medo, raiva e amor.

O sequestro emocional, um tema muito pertinente ao esporte no contexto da Inteligência Emocional, acontece quando esta região do cérebro, onde a conexão neuronal entre tálamo/amígdala nos informa sobre um perigo iminente ou a situação emocional carregada de emoções passadas nos fazem agir tomando decisões impróprias ou incoerentes com aquele momento. Ah, aqui então começamos a entender quando atletas ou qualquer pessoa tem um momento que chamamos de “perder a cabeça” e realiza algo totalmente impensável para os que conhecem o comportamento desta pessoa. Já foram inúmeros jogos de futebol em que presenciamos esses momentos, não é mesmo?

Do ponto de vista neurológico o sucesso da inteligência emocional depende do controle executivo realizado pela região pré-frontal do cérebro sobre a amígdala. Quando este controle neuronal falha é que acontece o sequestro de amígdala, que desencadeia um processo em que somos totalmente controlados pelas nossas emoções.

As habilidades da inteligência emocional destacados por Goleman, que são capazes de nos fazer controlar nossas emoções são: Autossuficiência, Autocontrole (controlar nossos impulsos), Motivação, Empatia (lidar com as emoções dos outros) e Habilidades Sociais (relacionamento).

Nossas emoções estão ligadas ao nosso sistema imunológico, por exemplo, destacando como pessoas mais irritadas, depressivas, aflitas, pessimistas tem o dobro do risco de adoecer. Então ser inteligente emocionalmente também é uma questão de saúde, além de ser uma ótima prevenção às lesões para os atletas de futebol.

O stress, comumente presente na vida dos atletas atualmente devido à pressão por vitórias e títulos, é talvez uma das situações mais difíceis de serem vencidas, porém com a inteligência emocional, através das cinco habilidades citadas anteriormente e somadas a outras ações como otimismo somos capaz de superá-lo.

As mudanças nas situações que causam o stress, a mudança no modo como o atleta percebe as situações que o causam e alterar o modo como o seu corpo e sua mente reagem a essas situações são ações que podem contribuir para o atleta profissional vencer o stress.

Mas na prática como podemos aprender a controlar nossa mente, para não sermos “sequestrados” pela amígdala?

Para que um atleta possa evitar as possíveis consequências negativas de um sequestro, é fundamental que exercite respostas que o possibilite ter o controle emocional. Quando o atleta sofre o “sequestro”, seu cérebro fica repleto com eletroquímicas e ao se conseguir controlar esta situação, as químicas não mais persistirão e se dissiparão de três a seis segundos.

Um controle adequado para este momento necessita de uma tarefa cognitiva um pouco mais complexa do que apenas o famoso “contar até dez” e deve ter a duração de aproximadamente seis segundos. Com isso se promove uma pausa em que se usa a parte analítica do seu cérebro, porém devemos estar atentos de que caso esse “botão de pausa” se torne um hábito, se faz necessário para um novo “botão”.

Compartilho alguns exemplos de ação para que o atleta possa exercitar a com isso controlar o seu estado emocional:

• Lembrar-se de seis amigos que possui no futebol
• Lembrar-se de seis clubes adversários que já enfrentou
• Visualize seis detalhes de um estádio que gosta de atuar
• Lembrar-se de quaisquer seis capitais do país
• Contar até seis em outro idioma que está aprendendo
• Conjugue verbos em um novo idioma que está aprendendo

O fato de fazer uma pausa nestes momentos não significa que o problema ou gatilho de sua emoção está eliminado; porém o atleta conseguirá restabelecer a comunicação adequada entre as partes do cérebro, que o permita pensar com todos os seus recursos, para que ele tome as melhores decisões e ações.

Até a próxima!

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A venda do artista continua sendo a solução

Mesmo com a tão propalada evolução do mercado do futebol no Brasil, em que os clubes vem conseguindo, paulatinamente, aumentar suas receitas, apesar do igual aumento de seu endividamento, tem-se como solução final para salvar as contas a comercialização do artista, que é, na prática, aquele que tem a capacidade de gerar ainda mais recursos quando pensamos em um ciclo virtuoso de gestão.

Esse é o indicador tangível de que continuamos “colocando a carroça na frente dos bois”. A necessidade de tomar decisões pelo imediatismo ou para resolver problemas pontuais é o sinal claro de que o planejamento de controle do endividamento e de processos para o trabalho a ser realizado ao longo de uma temporada ainda é pouco eficiente.

As saídas recentes de Paulo André (este, talvez, por razões um pouco mais complexas e ligadas a política do futebol brasileiro) e de Hernane (um dos principais jogadores do Flamengo no último Brasileirão e então candidato a vaga no ataque da seleção brasileira) para a China, apenas para ficar em exemplos deste mês, mostram que o cuidado em preservar ídolos passa à margem de um debate mais estratégico.

Talvez a impressão de quem está olhando de fora, com base apenas no noticiário esportivo, seja um tanto quanto vaga. Mas, pelas atitudes e pela forma, tudo indica que ainda procuramos o caminho mais fácil e rápido para gerar os recursos.

O trabalho de base, os projetos de marketing e o desenvolvimento de um plano consistente e coerente, de acordo com as características de cada clube, ainda parece, em muitos casos, um pouco distante da nossa realidade.

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Brasileiro Sócrates

 Fala, Magrão.

Aqui na terra estão jogando futebol. Tem muito pagode, funk ostentação, ostentação e pouco rock and roll. Tem um rol de coisas para lavar. Alguns para levar. Mas até o Chico Buarque não rima mais como antigamente. Caetano canta pouco e fala muito – se a ex-mulher deixar. Tem ação penal de tudo quanto é partido, ops, sigla. Dá pena. Mensalão petralha. Mensalão privateiro. Tem uns termos da turma de lá e de cá de dar medo na medula. Virou Fla-Flu a política. Mas Fla de Peralta. Mas Flu de Itaberá. Sheherazade das 1001 noites retrógradas, Reinaldo dos 1001 posts azedumes, Zé dos 10001 tuítes partidários. Radicais livres demais. Tudo pessoal, piçol, pizzolatos, lobões e carneirinhos patrulheiros do pensamento alheio. Tem para tudo – sem desconto e com dízimo. Dizimando o debate na base do @ mas faz. Disputa para saber quem mensalou menos. Gre-Nal para definir o que é a Venezuela: uma Paris administrada por suecos ou um Haiti governado por Cabul.

Sei que você me explicaria melhor. Ainda que eu não concordasse, ou mesmo entendesse, você daria uns três exemplos, tomaria uns 13 gorós, e estaria tudo melhor. Ao menos na sua visão utópica. Típica. Prática. Ideológica. Visão clínica. Filosófica. Socrática. Democrata.

Fidelíssimo a Fidel. Impregnado de um saudosismo muitas vezes saudável, outras vezes pueril. Quantas vezes discutível ao extremo que tolerava extremismos. Mas sempre tão passional quanto Racional. Tão defensável quanto detestável. Tudo ao mesmo tempo agora.

Justo agora que você precisava estar por aqui. Condenando o condenável ao limite do intragável. Elogiando o elogiável além do limite do Bom Senso F.C. que sempre você teve. Com a coragem que você transbordou, pintou, bordou, bebeu, amou.

O seu braço erguido de luta por aqui foi desvirtuado. Por quem foi preso, pelos que mandam prender e arrebentar. O seu brado retumbante precisava gritar contra os maracanazos anunciados. As arenazas que super fraturam os orçamentos. Os puxadazos dos aeroapertos. Os atrasazos na imobilidade urbana. Os buzinazos nas manifestações pacíficas. Os badernazos dos encapuzados sem vergonha.

Você era umas vozes para pontuar a Copa das Copas, para capar os capos dos capos de suas tribunas ditas de honra. Nos seus arroubos, doutor, você colocaria a língua nas feridas dos que roubam, suturaria os insuportáveis dedos e digitais de pessoas jurídicas de tão fictícias, de pessoas físicas de tão químicas. Nos seus delírios deliciosos você veria coisas que não existem. Mas enxergaria o que está à nossa frente e não temos coragem para ver. E viver.

Há 60 anos você é um artista, como bem definiu o Cachaça, claro, seu amigo. Artista por ser craque que só jogava de costas. Artista por ser médico que nem uma galinha operou. Artista por ser cantor que… bem, não preciso falar, muito menos ouvir.

Artista por ter vivido a vida além da conta. E ter deixado tanta vida para contar. Tanta conta para pagar. E ainda assim ser a voz que nos falta. A voz que precisava falar para colocar as coisas no lugar. Como aquela bola que você jogou no ângulo dos soviéticos – justo você, camarada! Como aquele gol em que você deixou de bumbum no gramado o Zoff do império italiano. Como tantas coisas que a gente viu e não acreditava. Como tantas coisas que você acreditava no Brasil e ainda não vimos.

Vê aí em cima, Magrão, se ainda dá para a gente ver uma Copa do Brasil mais que do mundo. Vê aí de cima se dá para pendurar essa conta também. Estamos precisando.

 

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet

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Uma invasão, diferentes versões

Afinal, o que aconteceu com Paolo Guerrero no dia 1º de fevereiro deste ano? O centroavante do Corinthians foi esganado por torcedores que invadiram o centro de treinamento do clube, apenas conversou com o grupo ou chegou a tentar intimidar o grupo? A versão sobre esse episódio mudou várias vezes desde o incidente. Entre os erros de gestão cometidos por todas as partes no caso, talvez o principal tenha sido a comunicação.

Recapitulando: no dia 1º de fevereiro, um sábado, um grupo de torcedores do Corinthians invadiu o centro de treinamento do clube para protestar por causa de maus resultados da equipe alvinegra no Campeonato Paulista.

Quando os torcedores invadiram, a maioria do elenco ainda estava nos vestiários – apenas os goleiros trabalhavam no campo. Segundo relatos de funcionários do Corinthians, houve uma correria generalizada. Atletas ficaram trancados por horas em uma sala, sem acesso a comida ou bebida. Guerrero, que estava no corredor e foi o último a entrar no local, foi interpelado diretamente pelo grupo.

O presidente do Corinthians, Mario Gobbi, disse que “Guerrero foi esganado por torcedores”. O clube incluiu essa agressão no relato feito ao Ministério Público e ao Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), órgão ligado à Polícia Civil. No último domingo, o peruano negou que isso tenha acontecido e relatou apenas uma conversa com o grupo de adeptos. Romarinho, companheiro dele no ataque alvinegro, foi questionado sobre as duas versões. Saiu-se com uma terceira, sobre Guerrero ter levantado o tom de voz para os torcedores.

Além disso, há relatos de que três celulares teriam sido roubados no dia da invasão. Um deles, o rádio do meio-campista peruano Luis Ramírez, com uma agenda repleta de contatos do departamento de futebol da equipe paulista. Isso teria desencadeado uma série de ameaças a jogadores e até a parentes deles. O Corinthians nega.

O problema de comunicação do Corinthians no episódio, na verdade, começou no dia da invasão. A polícia foi chamada, mas os funcionários do clube não descreveram todo o cenário. Por causa disso, nenhum torcedor foi preso em flagrante.

Depois, começaram a circular diferentes versões sobre o caso. As incoerências pululam em falas de jogadores, dirigentes, funcionários e torcedores. Sobretudo porque apenas duas das 22 câmeras de segurança do CT estavam funcionando normalmente no momento da invasão – e elas só mostram imagens do grupo de adeptos entrando no local.

No dia posterior à invasão, o técnico do Corinthians, Mano Menezes, foi questionado sobre o que havia acontecido. Respondeu apenas que as imagens eram claras e que dariam uma noção exata do episódio.

Jogadores e funcionários do Corinthians têm repetido que a invasão foi muito pior do que se sabe e que podia ter tido um desfecho trágico. Torcedores, por outro lado, dizem que o incidente foi muito mais leve do que se tem notícia.

Em situações assim, o primeiro passo para um clube é obrigatoriamente a criação de um plano de gerenciamento de crise. E qualquer gerenciamento de crise depende de um controle sobre as informações.

O Corinthians precisava ter reunido uma equipe ainda no CT, no dia da invasão, para decidir o que seria comunicado a cada esfera. O time devia ter montado planos específicos para mídias, polícia e para a própria cúpula.

Esse plano devia ter sido feito de forma estratégica. Por exemplo: era relevante a imprensa saber tudo que aconteceu ali? E qual era a melhor abordagem para relatar o caso aos dirigentes do clube?

A partir de um plano do que seria dito, o Corinthians devia ter adotado uma preocupação gigantesca com o que não podia ser dito. A blindagem é um tópico nevrálgico em qualquer estratégia para gerenciar crises.

Por último, o Corinthians devia ter pensado em que tipo de efeito o clube imaginava que a invasão precisava ter para as relações institucionais. Ao dizer que torcedores esganaram o centroavante titular da equipe, por exemplo, Gobbi criou (mais) animosidade entre o time se os torcedores.

A invasão de um local de trabalho é um ato condenável, e isso precisa estar claro. A partir disso, é precipitado fazer qualquer análise sobre o que aconteceu no dia 1º de fevereiro. A ausência de provas e a total inexistência de um plano de gerenciamento de crises impedem isso.

O tamanho do estrago que esses problemas causam é mais do que claro. Ao entregar uma versão cheia de furos e com pouca sustentação às autoridades, o Corinthians não conseguirá nenhuma punição severa aos invasores. O clube ainda não conseguiu sequer determinar se isso seria necessário, aliás.

Discutimos constantemente por aqui o quanto a gestão do futebol brasileiro precisa evoluir e o quanto a comunicação faz parte desse diapasão. O episódio do dia 1º de fevereiro é uma demonstração perfeita disso.

Sem uma estratégia clara, o Corinthians não consegue nem precisar o que acontecerá com o clube a partir da invasão. A relação com torcedores será abalada? Os jogadores ficaram com medo de defender a equipe? Alguém facilitou a invasão? Um dos adeptos disse à polícia que entrou pela porta da frente.

Os torcedores do Corinthians cometeram um erro gigantesco ao invadir o CT do clube. As maiores falhas da história, contudo, foram da própria equipe. O ponto agora é tentar descobrir por quê.

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Futebol, o talento e a equipe: o todo maior do que a soma das partes ou as partes potencializadas pelo todo?

A última coluna que publiquei aqui, recebeu um bom número de comentários (https://universidadedofutebol.com.br/Coluna/12419/Marcacao-no-futebol-a-gestao-do-espaco-defensivo-na-relacao-%E2%80%9Ceu-adversario%E2%80%9D). Por isso, nas próximas semanas, vou escrever um ou mais textos, seguindo as sugestões e respondendo as dúvidas encaminhadas pelos leitores, que por email ou facebook enviaram suas mensagens.

Na coluna de hoje, o que pretendo, é debater um pouco, algumas ideias que envolvem um outro tema – também mencionado no último texto.

Tentarei então explorar um pouco o conceito de inteligência de jogo dentro da ideia de um “pensamento sistêmico”.

Já está bem estabelecido na literatura científica e é consenso em boa parte do ambiente futebolístico, que na formação de uma equipe de futebol, organizada para jogar em alto desempenho, o treinador deve conseguir fazer com que a “performance” coletiva do time seja superior a “simples soma” dos talentos individuais que o compõe.

Em outras palavras, e parafraseando/adaptando Edgar Morin, o “todo” (o todo é a unidade complexa = equipe) deve ser maior do que a soma de suas “partes constituintes”.

Pois bem.

Por menos pretenciosa que essa ideia (da relação entre o “todo” e as “partes”) possa parecer, ela tem contribuído, Brasil à fora, para a reformulação do pensamento a respeito do olhar sobre o jogo, e assim também, sobre a preparação do futebolista para o jogar.

E ainda que os benefícios dessa reformulação fiquem mais claros apenas no médio prazo, é fato que hoje, a discussão sobre o futebol como fenômeno complexo está bem mais adiantada do que dez anos atrás.

Não há dúvidas porém, que o fato de estar mais adiantada não exclui a realidade de que há ainda muito para evoluir. Estamos no início do caminho (uma pena). Mas ao menos a caminhada foi iniciada, e quem sabe, em breve, não se transforme em uma corrida.

Mas quero chamar a atenção para algo que, por vezes, em nome de uma visão pseudosistêmica acaba por “cartesianar” (licença poética: tornar cartesiano) a unidade complexa (o todo, a equipe), tornando-a exclusivamente mais importante do que suas partes constituintes (os jogadores).

Ora, pensar na constituição de um “todo” que seja maior do que as “partes” que o compõe, não exclui a ideia de potencializar a ação e a interferência dessas partes sobre ele (o todo).

Em outras palavras, isso quer dizer, que é necessário que as potencialidades das partes, devam ser desenvolvidas ao máximo dentro das relações que elas estabelecem com as outras partes (os outros jogadores) e com a equipe.

Então ao invés de uma ideia geral de que a força do “todo”, superior à soma das “partes”, deva se estabelecer em detrimento das potencialidades dos indivíduos (das partes propriamente ditas), poderíamos pensar em algo como a maximização do indivíduo e do “todo” (a equipe) ao mesmo tempo!

Por isso, se a operacionalização das ações organizadas de uma equipe são a expressão de uma inteligência coletiva de jogo, e na solução dos problemas emergentes durante as partidas, essa inteligência é fruto das interações entre os jogadores que compõe essa equipe, é evidente que o “todo” é resultado final da composição dessa inteligência e dessas interações.

Ao mesmo tempo, se as ações coletivas se manifestam guiadas por referências que dão identidade ao todo coletivo, são e serão sempre resultado de leituras individuais que os jogadores fazem circunstancialmente ao longo do jogo.

E essas leituras individuais, por mais que sigam orientações coletivas, jamais perderão a particularidade e subjetividade, e deixarão de representar as habilidades e capacidades ímpares ao indivíduo/jogador.

Portanto não é a ideia de que o “todo” (equipe) precisa ser maior do que a soma de suas “partes” constituintes (jogadores), que deveria servir de referência para nossos olhares sobre o jogo, ou sobre a operacionalização dos treinos que vamos propor.

A ideia que deveria nos referenciar é a de que a unidade complexa (a equipe/o todo) deve maximizar as potencialidades das partes e ser ao máximo, maior do que a soma simples de cada uma delas.

Parece simples? Trivial? Ou polêmico?

Façamos uma reflexão a respeito disso… E vejamos se mesmo quando colocamos à frente premissas que envolvem o pensamento sistêmico, por vezes não acabamos por nos afastar dele…

Por hoje, é isso…

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A sobrevivência dos treinadores do futebol paulista em 2014

Duas semanas antes do início do Paulistão, da Série A2 e da série A3 fiz uma busca dos treinadores que estariam à frente de cada uma das 60 equipes que disputam as três competições. A pesquisa foi facilitada pela publicação previamente divulgada pelo site Futebol Interior e os resultados podem ser observados logo abaixo:


Semanas depois, com nove rodadas concluídas do Paulistão, oito da Série A2 e seis da Série A3, a classificação atual das equipes (com uma simulação de um grupo único na série A1) é a seguinte:

Das 60 equipes, 22 já mudaram de treinador. Algumas das mudanças aconteceram dias antes da estreia. Na sequência, destacadas em vermelho, as equipes que já trocaram de comando e o respectivo treinador atual:

Já foi divulgado neste portal, pelo ex-colunista Cavinato, que a troca de comando durante a competição, estatisticamente, não está relacionada com a melhoria de performance da equipe. Como isto já é sabido, o objetivo da coluna é propor outras reflexões aos treinadores de futebol.

Como você se vê neste cenário? Das 60 equipes, 36,6% passaram por mudanças no comando em cerca de 50 dias de trabalho.

Você está preparado para trabalhar num mercado em que a instabilidade e a pressão são constantes?

Você está disposto a trabalhar num ambiente e a tentar transformá-lo para o crescimento da modalidade ou você é favorável ao contexto atual?

Esta semana, Ricardo Drubscky, ex-técnico do Criciúma, deu um excelente exemplo sobre como podemos nos posicionar em relação a uma atitude empírica, muitas vezes mal planejada e que contribui para o atraso do nosso futebol.

Porém, se um dia almejamos a mudança deste cenário, é necessário que compreendamos a realidade e que nos adaptemos para nos mantermos no mercado.

Pois, como disse um grande treinador de futebol, só poderemos mudar o cenário se estivermos inseridos nele. Para isso, hoje e sempre, precisaremos de vitórias. Contamos com você!
 

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Endividamento dos clubes de futebol: o fantasma a ser combatido

Entra ano e sai ano os noticiários esportivos são invadidos com estudos e pareceres apontando o ranking das dívidas dos clubes. Além disso, invariavelmente, clubes tem rendas ou outros créditos bloqueados pela Justiça.

As razões deste descontrole financeiro são muitas, desde administrações amadoras, passando pelos riscos de qualquer negócio e desembocando no excesso de tributos no Brasil.

Independente do passado dos clubes, é imprescindível olhar para a frente criando gestões profissionais que relacionem tecnicamente questões financeiras e busca por resultado desportivo.

Na década de 90, Espanha e Portugal, por meio de lei, criaram as SADs (Sociedades Anônimas Desportivas) de forma que o passivo anterior fosse reestruturado e os clubes recomeçassem do zero.

A ideia seria “apagar” os erros do período pré profissional e permitir que os clubes fossem geridos como verdadeiras empresas sujeitas, inclusive à falência ou à proibição de disputar competições em virtude das dívidas.

Entretanto, cerca de vinte anos depois, muitos dos clubes voltaram a atrasar salários e se endividar e as entidades esportivas e Governo voltaram a debater soluções.

Tratar os clubes de futebol como meras empresas em um país como o Brasil, que respira futebol, não seria adequado, eis que envolve muita paixão.

Imagine as repercussões da falência de equipes como Flamengo, Corinthians, São Paulo, Atlético Mineiro, Palmeiras ou Vasco da Gama.

Dessa forma, Poder Público, clubes e CBF devem estabelecer um programa de recuperação financeira dos clubes priorizando os débitos trabalhistas e a pontualidade dos pagamentos futuros condicionando-se a participação nas competições ao adimplemento das obrigações.

Não há mais espaço para amadorismo no futebol e da forma que as dívidas caminham a insustentabilidade está próxima, o que pode trazer prejuízos inimagináveis, eis que o esporte é a força motriz para a geração de milhares de empregos diretos e indiretos, fora a sua função social e recreativa.

A tarefa de combater o “fantasma do endividamento” não é fácil, tanto é que Espanha e Portugal não tiveram o sucesso almejado.

Diante de tudo, medidas devem ser tomadas com celeridade antes que seja tarde.

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Racismo no futebol, discriminação racial ou social?

Nesta semana, minha coluna não falará sobre coaching, gestão ou desenvolvimento humano especificamente. Um dia quando Martin Luter King Jr discursou em Washington, disse a celebre frase “Eu tenho um sonho”, que acabou tornando-se um marco na luta contra o racismo no mundo.

Infelizmente, apesar da distância do ano de 1963, ano do citado discurso acima, presenciamos diversas manifestações de racismo no mundo, tanto no ano passado como recentemente ocorrido com o atleta profissional Tinga.

É vergonhoso nos depararmos com seres humanos que ainda demonstram tal atitude preconceituosa e desrespeitosa para com outro ser humano apenas pela cor de sua pele.

Mas amigo leitor, quero aproveitar o momento deste fato triste para falar de Brasil e do futebol, me permitindo ir um pouco mais além da questão racial.

Somos um país de culturas e raças misturadas, numa fórmula mágica que por sua essência nos daria uma base humana diferenciada para melhor, pois não somos humanos formados exclusivamente pela genética indígena, ou asiática, ou africana, ou americana, ou europeia, somos formados por todas elas juntas e muito bem entrelaçadas. Então, com estes episódios de racismo uma questão vem à minha mente: em nosso país e no esporte mais popular que temos há uma ponta de discriminação racial ou na verdade sofremos uma grande discriminação social?

Penso que esta questão no mínimo nos traz uma reflexão, como o futebol e as demais modalidades esportivas praticadas no Brasil poderiam ser uma forma de proporcionar mais igualdade social aos que aqui nascem e vivem?

Se não possuímos políticas públicas adequadas para o desenvolvimento social do nosso país, desenvolvimento verdadeiro eu digo aquele que se sustenta a longo prazo, talvez caiba ao esporte tentar algo mais em benefício dos socialmente excluídos.

No meu ponto de vista, o esporte como política de inclusão social, promoção da saúde e qualidade de vida deveria ser alvo de mais fomento e seriedade no seu trato. Não podemos pensar apenas em desenvolver atletas para Copas do Mundo e Olimpíadas, mas sim para desenvolver pessoas de bem na sociedade, igualmente capazes de tornarem-se produtivas economicamente e ativas socialmente, tornando-se partes de uma engrenagem na qual pudéssemos contribuir para que o Brasil fosse uma nação de respeito humano, livre de corrupção e impunidade.

Então, amigo leitor, e que também acredito ser apaixonado pelo futebol e o esporte de maneira geral, eu digo: Eu também tenho um sonho! O sonho de ver o esporte no Brasil como alavanca para o surgimento de uma nova nação, consciente e socialmente respeitosa pelo direito alheio e pela igualdade de direitos, independente de nossa cor, raça ou credo.

E você, também gostaria de sonhar?

Até a próxima e #FechadoComOTinga.