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Críticos de resultado

É impressionante como temos um hábito de comentar e dizer "grandes verdades" simplesmente olhando para o resultado em campo, durante 90 minutos ou a conquista de um título.

A mais recente e, por assim dizer, surpreendente, foi o título da Libertadores ganho pelo Atlético-MG, tendo lido, visto e ouvido nos últimos dias muita gente comentar sobre “planejamento que culminou com a histórica vitória”.

Primeiro de tudo, é preciso separar muito bem o entendimento sobre o termo "planejamento". O caso do Galo Mineiro foi um típico investimento pontual na área técnica, com recursos não necessariamente gerados pela entidade – OK, a atividade-fim de um clube de futebol é o futebol, com natural aporte e foco no seu departamento específico. E isso o Atlético-MG fez muitíssimo bem e de forma exemplar.

O que quero dizer, na verdade, é que o "planejamento" possui uma visão mais holística da organização. No caso de clubes de futebol, transcende o time em si, passando pelas áreas da estratégia, do mercado, da gestão, do marketing, das finanças, do relacionamento com o torcedor e por aí vai.

Portanto, para ficarmos em um único número para o caso em voga: um clube que acumulou mais de R$ 250 milhões em déficits nos últimos 10 anos, que possui uma dívida total na casa dos R$ 414 milhões (quase 2,6 vezes superior a sua receita bruta anual) não se pode dizer que realizou um bom planejamento.

Sei que o tema é complexo e envolve uma série de outras variáveis e nuances. Mas casos recentes como o do Corinthians, que estruturou o clube de maneira mais sólida e ampla, impactando, naturalmente, no futebol, é um bom exemplo do momento.

E o quanto está sendo custoso destruir um trabalho de décadas de gestão consistente e profissional do São Paulo, que vem paulatinamente desmantelando sua estrutura técnica e administrativa há pelo menos cinco anos – e está começando a colher seus frutos (no sentido negativo) somente agora (vide coluna nesta Universidade do Futebol de 26 de Janeiro de 2011).

Quero dizer com isso que temo o fato da construção do título do galo não passar de um "Castelo de Areia", como em muitos casos que assistimos de camarote dentro do futebol brasileiro, por estar centrada especificamente em uma personalidade (seu presidente) e não institucionalmente, dentro de uma evolução organizacional planejada e alimentada ano após ano por um ciclo contínuo de aprendizagem.

Saindo um pouco do tema futebol e inspirado no caso recente de Eike Batista e seu conglomerado de empresas "X": não me lembro (desde 2008 – quando começou a se tornar mais midiática a saga do ex-bilionário) de qualquer reportagem que tenha alertado para o crescimento descontrolado e "falso" destas empresas na bolsa, com anúncios de poços de petróleo sem o efetivo embasamento técnico.

Só vi elogios. Só vi horizontes positivos, em um "céu de brigadeiro", que associava, inclusive, o aparecimento de um bilionário no Brasil com a evolução do país enquanto uma nação de economia pujante.

Hoje, não há jornal ou revista especializada que não aponte inúmeras falhas – algumas, segundo as reportagens, infantis. É comum, ainda, o tratamento de forma ridicularizada o falso desenvolvimento das empresas de Batista. Novamente, os "Profetas do Passado" aparecem.

Lá, no mundo corporativo, como cá, no futebol, estamos cheios de críticos de resultados. Para os clubes, é preciso aprender lições dentro de casa e também com seus rivais com a finalidade de pensar as soluções de uma entidade não somente pelo resultado do domingo e dos "tapinhas nas costas" após uma grande goleada no clássico. É necessário pensar o clube como célula viva, independente de quem esteja liderando seus rumos.

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Imediatismo

Na última semana, o ex-jogador Tostão, sempre genial, relatou na "Folha de S.Paulo" uma tese que ele mesmo classificou como bizarra: "O Ganso atual, tão criticado, joga da mesma forma e com a mesma qualidade do Ganso do Santos, quando era endeusado. Mudaram apenas os olhares e as circunstâncias".

O excerto da coluna de Tostão é um exemplo claro de um dos maiores problemas em qualquer análise sobre esportes: a valorização excessiva dos resultados. Paulo Henrique Ganso não é necessariamente um jogador pior desde o período em que se destacou no Santos, mas é seguramente um atleta menos vitorioso.

No Santos que encantou e conquistou títulos, Ganso era genial. No São Paulo da crise e de 12 jogos consecutivos sem vencer, o meia é um problema. Ele foi barrado do time titular no último domingo, no clássico contra o Corinthians pelo Campeonato Brasileiro.

Pouco importa discutir se Ganso está realmente tão bem quanto no auge que ele viveu quando vestia a camisa do Santos. A questão aqui é outra: como o resultado influencia qualquer análise no futebol.

Para isso, Cuca também serve como exemplo. Campeão da Copa Libertadores na última quarta-feira, o técnico desabafou. Comemorou efusivamente por ter findado a pecha de azarado e por ter se livrado do rótulo de perdedor.

Cuca não se transformou em um bom treinador porque venceu a Libertadores. O Atlético-MG é um time organizado há tempos, como têm sido as equipes dirigidas pelo treinador.

O mesmo vale para o Corinthians. Tite tornou-se um técnico mais badalado depois de um ciclo vitorioso no time do Parque São Jorge, mas não virou um treinador melhor por causa disso. No futebol, o reconhecimento depende intrinsecamente da quantidade de láureas.

Esse é um dos aspectos mais cruéis do esporte, aliás. Não são poucos os casos de atletas fantásticos, com desempenhos expressivos, que convivem com famas ruins só porque carecem de resultados.

Em modalidades individuais, contudo, é fácil medir quanto um atleta evolui e qual é a distância que ele ainda precisa percorrer até o topo. Esportes coletivos convivem mais com questões intangíveis.

O time que vence um campeonato, sobretudo em casos de formatos com jogos eliminatórios, não é necessariamente o melhor. O dono da taça é necessariamente o mais bem preparado para aquele formato e para aquele momento.

É o que o comentarista Paulo Calçade, dos canais "ESPN", costuma dizer sobre a Copa do Mundo: trata-se apenas de um retrato de um mês. Há casos em que o melhor time conquista a competição, mas existem vencedores que eram apenas os mais prontos no período em que o certame foi disputado.

A dificuldade de analisar esportes coletivos é transformar aspectos abstratos em elementos tangíveis. Os títulos e as vitórias são maneiras de dar parâmetros ao desempenho.

A discussão é: são parâmetros corretos? Listar conquistas e dizer quais foram os pontos finais de um trabalho são elementos suficientemente completos para embasar análises?

Ouvi de um jogador certa vez que um técnico da primeira divisão brasileira era extremamente mal preparado. Segundo o atleta, o comandante conhecia pouco de aspectos táticos e técnicos, mas sempre havia contado com bons auxiliares.

Além disso, de acordo com o jogador, o técnico era um motivador sensacional. Ele podia não montar bons treinos e podia não ter domínio sobre as ações táticas de um jogo, mas conseguia fazer com que todo o elenco corresse mais.

Em um esporte de alto rendimento, é impossível isolar componentes. Um time não ganha apenas porque corre mais ou porque está mais bem postado. Qualquer resultado é um reflexo de uma interação entre um número enorme de componentes de preparação e de tomada de decisão.

Em 2000, Oswaldo de Oliveira era o técnico do Vasco. Contudo, ele teve um desentendimento com Eurico Miranda, que presidia o clube, e deixou a equipe. Joel Santana nas retas finais da Copa Mercosul e da Copa João Havelange, e o time carioca venceu as ambas.

Oswaldo de Oliveira montou todo aquele time, criou um padrão e estabeleceu uma série de atributos. Joel Santana foi o comandante campeão. Ainda que o sucessor tenha mudado aspectos decisivos ou que tenha feito alterações contundentes na formação do time, é inegável que o técnico anterior havia deixado bons frutos.

Um trabalho no futebol tem de ser assim, gradual, com diferentes etapas de desenvolvimento e objetivos bem definidos. Só assim é que os resultados podem passar a ser vistos apenas como detalhes.

 

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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A gestão de projetos e os grandes eventos esportivos no Brasil

O país acabou de organizar a Copa das Confederações e se prepara para organizar dois dos maiores eventos do planeta: a Copa do Mundo Fifa 2014 e os Jogos Olímpicos de Verão 2016.

O esporte tornou-se um grande negócio capaz de mobilizar multidões e de movimentar bilhões de dólares e como toda empreitada, a capacitação é indispensável para o sucesso e a rentabilidade.

O peso do setor de eventos no Brasil acentuou-se nos últimos anos, cujo papel significativo é comprovado pela 7ª. posiçáo no ranking da ICCA (International Congress and Convention Assiciation) como o país que mais recebe eventos internacionais no mundo.

Neste esteio, o gerenciamento de projetos desponta como propulsor desta demanda, especialmente no que tange ao cumprimentos de todos os encargos e prazos estabelecidos pela Fifa e pelo COI.

Gerencimento de projetos corresponde à aplicação de conhecimento, habilidades, ferramentas e técnicas às atividades do projeto a fim de atender às suas demandas, sendo realizado por meio da integração dos processos de iniciação, planejamento, execução, monitoramento e controle, e encerramento, conforme dispõe o Project Management Institute (PMI, 2008).

A aplicação de conhecimento, habilidades, ferramentas e técnicas para atingir o objetivo do projeto é reallizado por uma pessoa responsável: o gerente do projeto que deve:

– Identificar as necessidades do projeto;
– Estabelecer objetivos claros e palpáveis;
– Atender Às expectativas de todas as partes interessadas;
– Promover o devido estabelecimento entre qualidade, escopo, tempo e custo.

Esta última atribuição constitui a necessidade de se balancear três fatores conflitantes (tempo, custo e escopo ou qualidade) sendo o fator restante, a consequência do balanceamento. Portanto, se houver tempo, custo e escopo, a consequência será a qualidade do projeto. De outro giro, se houver tempo, custo e qualidade, a consequência será o escopo do projeto.

Dessa maneira, o gerenciamento de projetos inclui o balanceamento das restrições conflitantes do projeto que incluem, dentre outros: escopo, qualidade, cronograma, orçamento, recursos e risco.

A relação entre esses fatores faz com que se algum deles mudar, pelo menos um dos outros provavelmente será alterado, no que se denomina Teoria da tripla restrição (Newell, 2002).

Projetos de sucesso são aqueles que entregam o produto ou serviço especificado dentro do escopo, prazo, orçamento e com qualidades e é justamente isto que se espera dos comitês organizadores da Copa do Mundo de 2014 e das Olímpiadas de 2016.

O profissional de gerenciamento de projetos é indispensável para fazer a coisa certa (eficácia) da forma certa (eficiência) buscando a efetividade por meio de um planejamento estratégico,ou seja, por um processo de mobilização para atingir o sucesso mediante um comportamento proativo, considerando o ambiente atual e o futuro objetivando:

– Produzir todas as entregas planejadas;
– Completar dentro do cronograma planejado;
– Executar dentro do orçamento aprovado;
– Entregar de acorco com todas as especificações funcionais, de performance e de qualidade;
– Alcançar todas as metas, objetivos e propósitos;
– Atingir todas as expectativas das partes interessadas.

Portanto, para o pleno sucesso das competições que o país irá organizar, é imprescindível a presença de um gerente de projetos eis que estouros de orçamento, atraso na entrega de obras, produtos e/ou serviços correspondem a um projeto mal sucedido. O fato é que a cada dia há menos espaço para amadores na organização desportiva e neste momento o profissional qualificado torna-se uma necessidade.

Referências bibliográficas

SOUZA, Gustavo Lopes Pires de. “Estatuto do Torcedor: A evolução dos direitos do consumidor do esporte”. Alfstudio. Belo Horizonte: 2010

VERGARA, Sylvia Constant, Itamar Moreira, (coord). André Bittencourt Do Valle, Carlos Alberto Pereira Soares, José Finocchio Junior, Lincoln De Souza Firmino Da Silva. Fundamentos do gerenciamento de projetos. Editora FGV. Rio de Janeiro:2010

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A Missa e a Massa do Galo: Nós Acreditamos! Atlético Mineiro 2 (4) x 0 (3) Olimpia

Casal conversa em um quarto de uma casa em Belo Horizonte…

– Dario, pode dormir, querido.

– Não, meu amor. Vai que tudo isso é sonho. Vai que o Galo perde a Libertadores quando eu acordar.

– Você me chamou de “amor”, Dadá?

– Foi sem querer, mulher. Você sabe que você é meu “bem”, benhê. “Amor” é o Galo. Só o Atlético.

– Sabia… já estou acostumada… Mas é bom você dormir, Dario. Você vai acabar morrendo disso.

– Eu vivo pelo Galo, bem. Jamais vou morrer por ele. Só não posso é fechar os olhos. Só tenho medo de tudo que eu vi no Mineirão não ser verdade. Tudo que eu senti na Libertadores e no Horto se perder se eu fechar os olhos. Medo de que não poderia olhar diferente para aquelas mesmas traves malditas dos pênaltis do Brasileirão de 1977! As traves que agora viram a bola do título estourar em uma delas.

– Vai por mim, Dadá. O Jô vai fazer um gol deitado de pé direito. O Leo Silva vai fazer um gol de cabeça contra o grande goleiro Martín Silva. A bola vai bater um milhão de vezes na trave. Vai ter um pênalti não marcado para nós. O Alecsandro vai perder um gol no final. O Victor vai defender um pênalti com o pé esquerdo de novo. Vai adiantar desta vez se adiantar. O Cuca vai comer grama no último pênalti. A torcida vai gritar que acredita até quando ninguém mais acredita. Eu conheço vocês, atleticanos. Eu amo um atleticano. E sei que ninguém ama como um atleticano.

– Você não entende, benhê. São muitos anos em que eu fechei os olhos por não acreditar no que fizeram com meu Galo. Gente de fora, gente boa, gente ruim, gente de dentro. Todo mundo depenava meu time. Muitas vezes dormi campeão e acordei sem nada. Só com o Galo.

– Mas ele é tudo para você, Dario. Não precisa de título, meu amor.

– É. Mas faltava sempre alguma coisa. Não para eu ser mais atleticano, que isso é impossível. Mas faltava alguma coisa para os campeonatos serem mais atleticanos.

– Fecha os olhos, Dario. Você merece.

– Quem merece são os atleticanos. Todos eles. Todos nós. Já perdemos muitos títulos. Mas poucos clubes ganharam o torcedor, o respeito e o amor que nosso clube tem. Poucas Libertadores tiveram um time tão campeão quanto o nosso. Raras tiveram tanta gente torcendo por um time como o nosso.

– Mas você bem que não estava mais acreditando no time, né? Fala a verdade!

– Nunca! Eu sabia que dava para eliminar o São Paulo depois da derrota no Morumbi na fase de grupos.

– Sei…

– Eu sabia que o Victor defenderia aquele pênalti contra o Tijuana!

– A-ham…

– Eu sabia que alguém faria o gol que o Guilherme fez.

– Claaaaro…

– Eu tinha certeza que iríamos virar nos pênaltis contra o Newell´s…

– Sim, queridinho…

– Eu sabia que iríamos devolver a derrota no Paraguai! Que “cavalo paraguaio” era alguma cavalgadura do bairrismo brasileiro.

– Dario, pode fechar os olhos. Juro que fecho os ouvidos para o que você está inventando…

– Eu sabia que com o papa no Brasil estava no papo! Eu sabia que a Missa do Galo começa sempre no dia 24 e faz a festa divina por todo o dia 25! A missa e a massa do Galo são eternas!

– Menos, Dario, menos…

– Bem, você não entende de futebol. Menos ainda de Galo.

– Dario, amando um atleticano eu comecei a amar um pouco mais o futebol. Comecei a entender que a gente não entende nada de futebol.

– Mas, benhê, você entende mais que os maldosos que acham que todas as derrotas são eternas. São nada! Eternas são as vitórias! Eterno é meu amor que não precisava ser campeão da América. Não precisa ser campeão do Brasil. Não precisa ser campeão mineiro. Não precisa ser campeão de Belo Horizonte. Nem do Horto e nem de Lourdes. Eterno é ter no coração o Galo.

– Dario, e agora? Como vai chamar nosso primeiro filho: ainda bem que não é menina, por que Kafunga ou Mussula seriam dose… Então… Que tal Reinaldo Victor?

– Eu quero mesmo um nome de santo.

– Ou Reinaldo Ronaldo?

– Eu quero um nome de craque.

– Reinaldo Bernard?

– Eu quero um menino bom de tudo.

– Reinaldo Leo?

– Eu quero um filho que use bem a cabeça.

– Reinaldo Réver?

– Eu quero um cara que defenda tão bem a nossa família.

– Reinaldo Guilherme?

– Eu quero um filho predestinado.

– Reinaldo Jô?

– Eu quero um menino bem posicionado.

– Reinaldo Diego?

– Eu quero um moleque que acredite em todas.

– Reinaldo Pierre?

– Eu quero um garoto que se mate por nós.

– Reinaldo Leandro Donizete?

– Eu quero um garoto que faça tudo certo com discrição.

– Reinaldo Richarlyson?

– Eu quero um filho que faça tudo em vários lugares.

– Reinaldo Marcos?

– Eu quero um moleque que ataque o tempo todo.

– Reinaldo Rosinei?

– Eu quero um cara para virar o jogo.

– Reinaldo Gilberto?

– Eu quero um grande atleticano campeão do mundo e da América.

– Reinaldo Josué?

– Eu quero um campeão de tudo.

– Reinaldo Alexis?

– Eu quero alguém que seja ótimo, e responda pela bola, e não pela boca, com muita Cuca e muita alma.

– Reinaldo o que mais, Dario?

– Podia ser Reinaldo Telê. Atleticano campeão em 1971. Atleticano que também um dia foi chamado de pé-frio…

– Bem, eu quero que ele seja Reinaldo, sim. Como eu quero sempre a felicidade que você tem todo dia não por ser campeão, Dario. Mas por ser Galo a vida toda.

– Mais que tudo, benhê, eu quero que quando nascer o nosso primeiro filho, que está nessa barriguinha desde fevereiro, eu possa pegá-lo no colo como o nosso time pegou a taça de campeão de América, e embalá-lo com a mesma emoção e paixão. Para poder falar no ouvidinho dele:

– “Você é campeão, filho”.

– Não, benhê. Só vou dizer uma frase…

– “Você é atleticano, filho”.

– Isso, mulher! Você é meu amor!

– Você é atleticano, Dario.

– Nós somos agora o que sempre fomos. Campeões. Eu, você, e o Reinaldo Libertador.

(P.S.: Eu, Leonardo Bertozzi e Mario Marra lançaremos em semanas “Nós Acreditamos”. Pela BB Editora. Um livro de dois atleticanos jornalistas, um palmeirense jornalista. Uma obra que sairia mesmo se não desse Atlético. Por que o que valeu foi a jornada. Campeã de tudo.)

 

Para interagir com o autor: maurobeting@universidadedofutebol.com.br

*Texto publicado originalmente no blog do Mauro Beting, no portal Lancenet.

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As reações individuais e a coletividade no futebol

Os grandes investimentos, os patrocínios que sustentam as grandes equipes de futebol no mundo, todo esse esforço pode ser jogado por terra por uma distração ou perda de foco por parte de algum atleta em momento de competição, na prática da alta performance.

No futebol, essa perda de foco, atenção ou concentração pode ser fatal na disputa de uma partida importante para o clube ou para uma seleção. Imaginem o impacto que uma distração ou perda temporária de foco pode causar em plena final de copa do mundo?!

Uma reação agressiva de um atleta, totalmente desfocada da prática esportiva, pode espelhar nos demais atletas o comportamento semelhante dentro de campo, inclusive culminando com expulsões prematuras e fatais para uma equipe.

No futebol atual, não deve haver mais espaço para uma atitude de baixa responsabilidade por parte do atleta, pelo simples fato de perder o foco durante uma partida, pois ele deve lembrar-se que a sua atuação deve ser consoante com um resultado coletivo da equipe em que atua.

Por ser o futebol uma modalidade de esporte coletivo, o atleta de futebol está impelido a ter uma nova postura, condizente com o nível de sua carreira e com a expectativa que se cria ao seu redor. Atitudes impensadas e explosivas com ocorrências repetidas, devem ser alvo de acompanhamento específico para que se equacione este comportamento em benefício do coletivo e do próprio atleta.

Mas, precisamos estar atentos, pois a culpa destes comportamentos pode não estar necessariamente depositada totalmente no próprio atleta, membros de uma comissão técnica devem estar alinhados com os recursos disponíveis atualmente para ajustar toda e qualquer situação de problema no elenco.

É necessário compreendermos que todos os atletas devem aprender, em algum momento de sua carreira, como manter o foco, quando e com que intensidade, ou seja, como manter essa atenção necessária ao rendimento de alta performance por um tempo prolongado.

Compartilho, por exemplo, uma abordagem através do estudo de Weinberg & Goud (1999), no qual podemos utilizar algumas diretrizes para melhorar a capacidade de concentração dos atletas.

1. Simular condições de competição no treinamento: produzir barulho de torcedores, realizar jogo treino contra um time agressivo ou provocador, realizar jogo sob pressão de tempo, treinamento técnico em presença de estímulos perturbadores.

2. Usar palavras-chave: durante uma competição, atletas vencedores utilizam palavras como "força", "luta", "preste atenção no jogo", etc, com a finalidade de manter um bom nível de atenção ou de concentrar-se de novo quando perder a concentração.

3. Estabelecer rotinas de comportamento: estas podem ser aplicadas antes e durante a competição, a fim de reduzir o nível de ansiedade, eliminar fatores que podem distrair o atleta e aumentar o nível concentração.

4. Praticar o controle visual: nos esportes com bola, o atleta necessita da capacidade visual de focalizar a atenção em estímulos visuais relevantes (na bola por exemplo) e evitar distrações (como as reações de torcedores, por exemplo).

5. Permanecer concentrado em situações presentes: o atleta deve evitar pensar em situações passadas ou futuras durante a partida e ficar totalmente concentrado na tarefa a realizar no momento atual, na situação presente.

Aqui deixo a reflexão de que apenas aquela famosa "conversa" que geralmente é citada por vários técnicos brasileiros, que parece mais como um conhecido "puxão de orelhas" pode não ser mais suficiente para equacionar problemas de concentração ou emocionais dos atletas.

Cabe então a todos os envolvidos no esporte promoverem o endereçamento adequado para cada caso e só através do fomento pelo conhecimento amplo e multidisciplinar dos profissionais que atuam nas organizações esportivas, isso será possível.

E você, será que tem se mantido atento ao seu trabalho ou também passar por distrações na sua rotina diária!? Então, é melhor termos cuidado com as "expulsões" despercebidas que por ventura estejam acontecendo conosco em nossa vida pessoal e profissional.

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Djalma Santos 8.0… Nós jogamos com ele!

Há algumas semanas, fomos agraciados com uma série de reportagens alusivas aos 80 anos de Djalma Santos…
 
Para os mais moços que não o viram jogar, talvez o episódio tenha passado despercebido, mas tanto para aqueles que tiveram essa felicidade, como para os outros atentos à história do futebol brasileiro, o fato foi daqueles de brindar a vida!… Afinal, não é todo o dia em que temos notícia de um octogenário jogando sua peladinha todo domingo, seguido de um bom papo – às vezes regado a uma cervejinha, por que não? – com os amigos… E mais ainda quando se trata de alguém que aprendeu com a vida o que é de fato vivê-la…
 
Vejam o que disse ele em certo momento: "Não se para de jogar bola porque se é velho, mas sim nos tornamos velhos porque paramos de jogar bola"!
 
E pensar que ainda tem em nossa meio quem se reporte à saúde enfocando-a exclusivamente em sua dimensão bio-fisiológica!
 
Bem… Mas todo esse preâmbulo foi escrito para que pudesse dizer que tive o privilégio de jogar com Djalma Santos!
 
Pois é… Estávamos no ano de 1976 em São Luis do Maranhão… Nós – um grupo de professores de Educação Física repleto de utopias – e ele, então contratado como técnico do Sampaio Corrêa Futebol Clube, um dos grandes do futebol maranhense, ao lado do Moto clube e do MAC (Maranhão Atlético Clube).
 
Boa parte de nosso grupo trabalhava vinculado ao Departamento de Esporte do governo daquele Estado, basicamente envolvido com os afazeres de duas modalidades esportivas, o handebol e o voleibol.
 
O contrato de trabalho era de 40 horas… Não deu outra: montamos um time de futebol e demos a ele o nome de… Handvô-40, homenagem ao handebol, ao voleibol e às 40 horas de trabalho – qualquer semelhança com outra expressão…
 
Pois foi nesse time que Djalma Santos foi convidado a jogar e… Jogou! Se nossas conversas o assustavam às vezes (chegamos perto de comprar uma ilha, embalados pelas idéias de A.S. Neill, fundador da escola de Summerhill), a de participar do time foi recebida com o mesmo sorriso que ele estampa hoje em seu rosto…
 
Duvidam? Pois aí vai a prova! O primeiro da fila é o diretor – presidente do CEV, Centro Esportivo Virtual… O último, este ponta-esquerda que vos escreve! No meio dela, Djalma Santos, junto com Viché, Sidney (ambos professores da UFMA) Gil, "Zé Pipa", Marcão – o "véio" – e outros cuja lembrança surge enevoada em minha cabeça…
 
Não sei dizer se Djalma Santos tem recordação desses tempos… Penso que sim, pois foram dias que não se repetem todos os dias…

*Publicada originalmente no dia 26 de março de 2009

Leia mais:
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O espetáculo (e o lucro) está no estádio

As minhas últimas 3 colunas na "Universidade do Futebol" versaram sobre a relação dos ingressos com os novos estádios de futebol no Brasil: a "Ocupação nos Estádios" (https://universidadedofutebol.com.br/Coluna/12215/Tudo-novo-Parte-1-3); o "Valor do Ticket Médio" (https://universidadedofutebol.com.br/Coluna/12221/Tudo-novo-Parte-2-3) e o "Season Ticket" (https://universidadedofutebol.com.br/Coluna/12226/Tudo-novo-Parte-3-3).

Por uma excelente coincidência, nesta semana, Ferran Soriano, ex-dirigente do Barcelona (considerado o profissional que revolucionou o pensamento do clube catalão para uma visão mais ampla de negócios), deu entrevista à Revista Veja, corroborando com alguns destes argumentos: http://veja.abril.com.br/noticia/esporte/ferran-soriano-os-torcedores-sao-os-donos-do-espetaculo?utm_source=redesabril_veja&utm_medium=twitter&utm_campaign=redesabril_veja&utm_content=feed&.

Mesmo no Brasil, não são poucos os especialistas que tem reiterado a necessidade de se administrar melhor esta unidade de negócio – os ingressos, suas entregas e o seu sistema de precificação – pelos clubes daqui.

O grande fator é o do entretenimento, em que o cenário e a atmosfera criada dentro de arenas lotadas é que faz com que o espetáculo seja mais disputado (em termos de consumo) e a satisfação de todos os presentes seja plenamente atendida.

Na TV, tal e qual Soriano lembra, é fundamental apresentar um estádio cheio e vibrante, para que a transmissão se torne mais rica. Precisamos, mais do que nunca, avançar a passos largos no processo de aprendizagem e entrega dos jogos como uma experiência única, a preços condizentes (de mercado) e que ofereça bons serviços sob a perspectiva de cada tipo de cliente.

 

Para interagir com o autor: geraldo@universidadedofutebol.com.br

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No ventilador

Quando feito de forma correta, o processo da comunicação é extremamente simples: é um jogo em que dois personagens trocam mensagens enquanto alternam as funções de emissor e receptor.

O problema é que nem sempre esse processo é tão direto. Há vários fatores que podem colocar em risco a total compreensão do conteúdo transmitido em uma conversa. Com isso, o que parece natural pode se transformar em armadilha.

Pense na brincadeira infantil do telefone sem fio, por exemplo. O jogo consiste em uma mensagem que parte de uma pessoa e vai passando para outras, de ouvido a ouvido, até que o último da fila tenha de relatar o que ouviu. O que chega raramente é fiel à versão original.

A lógica da brincadeira infantil serve também para outros segmentos. Serve, por exemplo, para nortear os processos de comunicação em empresas, instituições e até clubes de futebol.

Reduzir a crise do São Paulo a um problema de comunicação seria um reducionismo extremamente infeliz. O clube vive um problema institucional, e esse cenário é agravado pela sequência de resultados negativos em campo.

Contudo, é impossível ignorar os deslizes de comunicação cometidos pelo São Paulo durante o momento ruim. O time tricolor não vence há dez jogos (sete vitórias e três empates), mas, esse período também foi suficiente para acumular uma incontável série de exemplos negativos.

O maior deles foi a discussão pública entre o goleiro e capitão Rogério Ceni, um dos principais ídolos da história do clube, e o diretor de futebol da equipe paulista, Adalberto Baptista.

A celeuma começou quando o goleiro foi questionado sobre o atual momento do São Paulo. Passional e competitivo, o camisa 01 foi taxativo: "O clube parou no tempo".

A afirmação de Ceni foi especialmente dolorosa para Baptista, diretor que conduz o futebol do clube. Ele escancarou todo o incômodo ao usar o mesmo expediente do goleiro, aproveitar uma entrevista coletiva e fazer críticas técnicas ao capitão da equipe.

No depoimento, Baptista disse que Ceni tinha uma lesão no pé e que isso estava comprometendo o desempenho do goleiro, inclusive em aspectos técnicos. Ele citou especificamente a reposição de bola como forma de exemplificar.

A tréplica de Ceni também foi pública. O goleiro disse que não sente mais dores no pé e negou conviver com limitações físicas decorrentes da lesão. Ele também fez uma crítica velada a Baptista, que deixou de acompanhar o São Paulo em uma viagem para a Bolívia neste ano, em jogo da primeira fase da Copa Bridgestone Libertadores, porque tinha uma corrida da Porsche Cup.

A troca de acusações entre Ceni e Baptista é um exemplo do que não fazer em qualquer processo de gestão de crise. Sobretudo porque os dois discutiram publicamente, agravando a percepção pública de que o São Paulo vive um momento ruim.

Em horas assim vale a máxima: roupa suja se lava em casa. Entre todas as acusações e críticas públicas trocadas por Ceni e Baptista, o mais grave foi uma frase do goleiro na última sexta-feira. "Eu não falei com o Adalberto depois da entrevista dele", disse o capitão tricolor.

Além de terem exposto uma divergência que devia ser interna, o goleiro e o diretor mostraram que não há diálogo entre eles. Quando o principal dirigente e a maior estrela da equipe entram em uma colisão tão contundente, a crise é muito maior do que os dez jogos sem vencer.

Outro exemplo negativo de comunicação do São Paulo durante a crise foi dado pelo presidente Juvenal Juvêncio. Ele tentou tomar as atenções na apresentação do técnico Paulo Autuori, contratado após a demissão de Ney Franco. Para isso, fez um discurso enfático, cheio de frases fortes.

O show de Juvêncio foi baseado em estratégia. No entanto, o resultado foi triste. Quando apelou ao estilo folclórico e até a comparações com rivais para chamar atenção, o presidente do São Paulo escancarou o quanto está descolado da atual realidade do clube.

Pode até parecer paradoxal, mas gestão de crise começa quando não há crise. Nesses momentos é que a comunicação deve se preparar para abafar problemas e construir discursos que sejam condizentes com os objetivos da instituição.

No São Paulo, a crise mostrou que não havia soluções prontas. Não havia sequer diálogo entre diferentes esferas do clube.

Se a comunicação não estiver pronta, o trabalho de contenção de uma crise é muito mais complicado. Ainda assim, é fundamental que ele seja feito sem omissão. O São Paulo não podia assistir a um confronto público entre um diretor e o capitão do time.

O mesmo vale para o embate político que tem crescido em espaço na mídia. Há notícias pululando constantemente, sejam elas contra a situação ou contra a oposição. E o processo eleitoral do clube, lembremos, será realizado apenas em abril do próximo ano.

Enquanto diferentes esferas se digladiam, o São Paulo não planeja. A comunicação não seria a solução para nenhuma crise, mas ao menos teria um potencial enorme para diminuir o impacto do mau momento.

O exemplo Guardiola

No Brasil, é comum que treinadores façam mistério sobre estratégias ou questões táticas de suas equipes. O debate costuma ser vazio, raso, e muito disso é consequência da falta de cultura de discussão sobre a questão técnica.

Mas essa característica não é exclusividade do Brasil. Contratado para comandar o Bayern de Munique a partir da temporada 2013/2014, o espanhol Pep Guardiola chamou atenção ao conversar com um jornalista da rede Sat.1.

O técnico viu um papel em que o jornalista havia desenhado a formação do Bayern de Munique em um amistoso contra o Hamburgo. Guardiola analisou e corrigiu uma série de aspectos, como o posicionamento do meio-campista Tony Kroos.

"Ele mostrou que eu não tenho ideia", disse Holger Pfandt ao jornal alemão "Bild".

Muitos classificaram a atitude de Guardiola como arrogante, mas o treinador estava fazendo gestão de crise. Ele foi prevenido, explicando questões sobre o posicionamento para evitar que o jornalista fizesse críticas infundadas no futuro.

Guardiola é um dos técnicos mais eficientes na história recente do futebol. Os exemplos do São Paulo e da Alemanha mostram, porém, que o espanhol também podia dar aulas em outras áreas.

 

Para interagir com o autor: guilherme.costa@universidadedofutebol.com.br

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Aquecer pra jogar e jogar pra aquecer

Criar um ambiente de treino propício à melhoria de desempenho e às exigências do futebol moderno requer o envolvimento da comissão técnica em todos os elementos relacionados à sessão de treinamento que podem alterar o rendimento individual e/ou coletivo.

Desta forma, atentar-se inclusive aos pormenores pode contribuir sistemicamente no produto final da equipe (nível de jogo apresentado) e na busca constante do todo maior que a soma das partes.

Um dos elementos que compreende a sessão de treino e pode ser facilmente negligenciado é o aquecimento. O tempo para este tipo de procedimento varia de 5 a 20 minutos e costumeiramente é feito de diferentes maneiras/combinações: trotes, coordenativos de corrida, bobinhos, “dois sem coxa”, gestos técnicos, acelerações, campos reduzidos, brincadeiras, core, estafetas, saltos, etc.

Como a preparação para o componente principal do treino é uma atividade cotidiana e, de certa forma, semelhante, muitas vezes os jogadores (talvez entediados por esta necessidade que se repete dia após dia em toda a carreira) não se concentram o suficiente para sua realização. Ao invés de se prepararem fisiológica e mentalmente da maneira mais adequada possível, muitos optam por colocar a “resenha” em dia, com conversas totalmente descontextualizadas ao trabalho e “economizar” energia, poupando ou roubando nos movimentos determinados (ou não) pela comissão.

Uma vez que a parte principal de uma sessão de treino de quem utiliza o jogo como essência da periodização serão os fractais, em maior ou menor escala, do jogar pretendido, uma boa alternativa para aumentar o nível de concentração do aquecimento e, consequentemente, ficar melhor preparado, é estimular as competências essenciais do jogo (Relação com a Bola, Comunicação na Ação e Leitura de Jogo) em pequenos grupos (no máximo até 3 jogadores).

Após uma pré-ativação sem bola, em jogos com ou sem alvos, restrição ou não de toques na bola, utilização obrigatória da perna não dominante, ou quaisquer outras variações/adaptações nas regras do futebol, é possível criar desde o aquecimento um ambiente de “estado de jogo” indispensável para o jogar plenamente, como menciona o Dr. Alcides Scaglia. Em comissões técnicas bem planejadas, as regras do aquecimento servem até para direcionar os atletas aos macro-objetivos do treino.

A composição de uma atividade com poucos elementos e num espaço significativamente menor que o campo de futebol proporciona uma elevada densidade de ações técnicas que, se corretamente orientadas e conduzidas, influenciarão positivamente o desempenho global de cada atleta no jogo formal.

Além disso, por envolver a capacidade de decisão, a velocidade complexa de jogo (termo utilizado pelo treinador Rodrigo Leitão) é estimulada em especificidade.

Nossos atletas continuarão aquecendo seja com as atividades tradicionais, seja com os jogos que estimulem as Competências Essenciais. Porém, nos últimos 15 anos de envolvimento diário com futebol, incontáveis aquecimentos realizados, orientados ou observados e com o óculos que enxergo o futebol atualmente, tendo a afirmar que a segunda opção é mais eficaz.

Afinal, se vamos aquecer pra jogar talvez devamos jogar pra aquecer!

Abraços e até a próxima semana.

Para interagir com o autor: eduardo@universidadedofutebol.com.br
 

 

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Proibição de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol: ilegalidade

A empresa Parlamento Restaurante Ltda propôs ação contra a CBF sob o fundamento de que teria firmado contrato com a FBF (Federação Brasiliense de Futebol) para fornecer bebidas e comidas no estádio Mané Garrincha em qualquer evento realizado pela entidade.

Como a CBF proíbe a venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol, requereu a antecipação de tutela para que fosse permitida a venda de cerveja no Mané Garrincha, em alguns “Jogos teste”. O pedido antecipatório de tutela foi deferido.

Em razão desta decisão, o Ministério Público apresentou recurso contra a decisão, sob o fundamento de que a permissão seria temporária é só valia para os eventos organizados pela Fifa, por isso, os demais jogos deveriam seguir o Estatuto do Torcedor.

Segundo a juíza Grace Correia Pereira "a abrangência da antecipação de tutela deferida diz respeito somente aos "jogos teste", e atualmente não há qualquer evento futebolístico a ser realizado no Estádio Nacional de Brasília desta categoria".

Destarte, ao contrário do que afirmou a Magistrada, o Estatuto do Torcedor não proíbe a venda de bebidas alcoólicas. Destarte, art. 13-A do referido Estatuto estabelece como condição de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência.

Ora, não há qualquer vedação expressa à venda de bebidas alcoólicas e eventual proibição incorre em grave violação ao inciso II da Constituição Brasileira ao dispor que ninguém poderá fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de Lei.

Vale destacar que odocumento que originou a proibição de venda/consumo de bebidas alcoólicas é foi Termo assinado entre Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e CBF.

O MP defende que as bebidas alcoólicas são causa da violência e apresenta citações, porém não há qualquer fonte ou documento que comprove cientificamente a redução na violência nos estádios de futebol a partir da proibição da venda e do consumo de bebidas alcoólicas.

Doutro giro, estudo publicado na Inglaterra por Geoff Pearson e Arianna Sale em 2011 ( PEARSON & SALE "’On the Lash’: revisiting the effectiveness of alcohol controls at football matches” in: Policing & Society, Vol. 21, No. 2, June 2011.) aponta que a política de restrição à bebida alcoólica nos estádios não é fator determinante para a redução dos índices de violência.

Segundo o estudo, devem-se buscar outros métodos para reduzir a violência no futebol e apresenta resultados de um estudo etnográfico de quinze anos nas torcidas inglesas e entrevistas com autoridades policiais do Reino Unido e da Itália.

A conclusão é de que, além de não impedir a violência nos estádios de futebol, a proibição da venda de bebidas alcoólicas podem aumentá-la pela seguinte razão:

1) Os torcedores aumentam a quantidade ingerida de bebida antes de entrar no estádio e passam a ingerir bebidas mais fortes;

2) Entram no estádio em cima da hora do jogo, dificultando o esquema de segurança e gerando tumulto;

3) Os torcedores se concentram nos bares dos arredores, aumentando a chance de encontro entre torcedores rivais, em espaços sem esquemas de segurança.

Ademais, a referida proibição gera uma série de problemas:

1) Concentra a entrada do público em cima da hora do jogo, gerando: Aumento de filas; Aumento de catracas utilizadas; Aumento de custos; Aumento de tumulto e violência no acesso ao Estádio;

2) Estádio perde receita (restaurantes, lojas, eventos antes do jogo…);

3) Torcedor consome ainda mais bebida, com maior velocidade, inclusive bebidas quentes, sabendo que a bebida é proibida dentro do estádio;

4) Pessoas circulando na rua, dificultando o tráfego e o acesso ao estádio

O fato é que o poder público na ânsia de dar uma reposta à sociedade e apontar soluções para a crescente violência nos estádios de futebol, escolheu a bebida alcoólica como vilã.

Tal indicação sem fundamentos torna-se ainda mais cristalina ao se buscar as reais causas da violência nos estádios de futebol e, sobretudo, quando constata-se que o Brasil possui índices de violência nos estádios de futebol largamente superiores aos de países como Inglaterra que permite a venda de bebidas alcoólicas.

 

Para interagir com o autor: gustavo@universidadedofutebol.com.br